ainda que mal respondas;
ainda que mal te entenda,
ainda que mal repitas;
ainda que mal insista,
ainda que mal desculpes;
ainda que mal me exprima,
ainda que mal me julgues;
ainda que mal me mostre,
ainda que mal me vejas;
ainda que mal te encare,
ainda que mal te furtes;
ainda que mal te siga,
ainda que mal te voltes;
ainda que mal te ame,
ainda que mal o saibas;
ainda que mal te agarre,
ainda que mal te mates;
ainda assim te pergunto
e me queimando em teu seio,
me salvo e me dano: amor.
Carlos
Drummond de Andrade faria hoje 113 anos. Aniversário improvável, mesmo numa
época em que a longevidade humana bate recordes. Escolhi este poema para o
homenagear, em primeiro lugar porque gosto muito dele; depois porque o texto do
poeta brasileiro demonstra como a repetição consegue criar beleza, ritmo e não
menoriza o conteúdo.
Neste
poema, Drummond de Andrade trabalha a partir da repetição duma expressão longa
e nada poética – “ainda que mal” -, contudo, através dela aproxima-nos da
poesia, revelando que as minudências do quotidiano também são elegíveis para a
pena do poeta.
A
repetição cria o ritmo acelerado de um diálogo inexistente para o escritor
brasileiro revelar que a força do amor triunfa sobre um extensa lista de
pequenas grandes contrariedades. A vida sempre esteve cheia de “emboras”, de “mas”
e muitos “ainda que mal”, a questão é como reagir a eles. Com a força
do amor, tudo parece mais fácil, porque sem ele, “ainda que bem” faça quase
tudo, o resultado sabe sempre a derrota.
Há
tantas maneiras e formas de amar que, ainda que “mal nos pareça”, emperramos a
vida por culpa própria, querendo tirar os mas e os embora do caminho,
quando eles estão lá, precisamente, para tornar mais saborosa a nossa vitória.
Gabriel Vilas Boas