Há pouco mais de uma
semana, Merkel reuniu os seus parceiros europeus para lhes falar seriamente
sobre o problema dos refugiados sírios na europa. Na sala instalou-se o
silêncio dos cobardes. A chanceler queria saber quem estava disposto a receber
refugiados e quanto estavam dispostos a contribuir para tamanha empresa
humanitária. O incómodo sucedeu-se ao silêncio.
Verdadeiramente ninguém
quer receber dos sírios nem está interessado em gastar mais de um punhado de
euros para a sua salvação. Merkel deve ter pensado lá com os seus botões “O
monstro que eu criei!”. E, realmente, este monstro de insensibilidade,
arrogância e desumanidade, que se chama europa, cresce de uma forma
assustadora.
Como sempre acontece no
reino do fingimento e das conveniências, em que se tornaram as relações entre os
países desenvolvidos, há sempre uma solução clean
para qualquer problema. Os burocratas de Bruxelas já propuseram e Merkel teve
de aceitar, a maioria dos Presidentes da EU até suspirou de alívio e o
primeiro-ministro deve ter sorrido à Estaline: o problema dos migrantes
resolve-se através da Turquia. A proposta é simples: os turcos ficam com os
dois milhões de refugiados sírios nas suas fronteiras, servindo de
estado-tampão à sua entrada na europa dos pseudo ricos e em os turcos trocam
recebem três mil milhões de euros, ou seja, seis vezes mais do que aquilo que
se pensava gastar com todo este problema dos refugiados.
No entanto, o mais
interessante da proposta da União Europeia à Turquia está na vontade da UE em
acelerar o processo de integração turca na UE, passando por cima de todas as
desconfianças em relação à qualidade da democracia da Turquia e da defesa dos
direitos humanos. Para começar, a europa dará 75 mil vistos aos turcos para
estes poderem, desde já, entrar livremente no espaço europeu, quando ainda há
poucos meses isso estava fora de questão por questões de segurança.
Ao que parece os turcos
já não são perigosos, já se tornaram em verdadeiros democratas, já não
chacinaram os curdos, deixaram de ser uma ameaça islâmica e Erdogan deixou de
ser o agente duplo que Berlim e Paris tanto temiam.
A proposta que a UE fez
à Turquia é indecente, indecorosa, imoral. Humilha a europa antes de humilhar os
sírios e traduz polidamente aquela triste frase que o primeiro-ministro inglês,
David Cameron, quando comparou a vaga de emigrantes ilegais que tentavam entrar
no Reino Unido a uma praga de mosquitos que urgia afastar para bem longe.
Acredito, sinceramente,
que a Alemanha estivesse disposta a receber quase um milhão de migrantes e que
também estivesse disposta a custear grande parte das despesas, mas Merkel
sempre foi, antes de tudo, uma pragmática que privilegia a eficácia. Por isso
foi a Ancara falar com o primeiro-ministro turco e apresentar-lhe uma proposta
indecente dos valores em que a europa, em que me revejo, se fundou: democracia,
solidariedade, humanidade.
Erdogan deve aceitar,
acrescentado ainda mais uma quantas exigências para disfarçar o seu
contentamento. Depois sorrirá como Estaline o fez em Yalta, quando Churchill
sarrabiscou um esboço de uma europa dividida em dois grandes blocos políticos,
dando o pontapé de saída para uma guerra gelada de quarenta anos.
Felizmente, agora a
História demora menos tempo a acertar contas com estas figurinhas armadas em
figurões.
Gabriel Vilas Boas
Excelente post. Pena estarmos assim... :(
ResponderEliminarObrigado Anabela. Realmente é uma pena estarmos assim: sem alma, sem solidariedade, sem rumo. E Portugal não diz nada, não faz nada, mesmo no caso do nosso compatriota Luaty Beirão. Que tristeza.
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