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quinta-feira, 30 de agosto de 2018

NÃO QUERO CONTINUAR A MENTIR

Em direto, na rádio, sem antes avisar o presidente Macron, o ministro francês da Transição Ecológica, Nicolas Hulot, apresentou a demissão do cargo que ocupava.

«Sim, não estamos a fazer avanços no controlo dos pesticidas, na biodiversidade, na qualidade do solo.»

Decidiu fazê-lo sem avisar e em público, para que não houvesse hipóteses de novamente o dissuadir. 
"Se os tivesse avisado, iam tentar, novamente dissuadir-me!" - disse Holut.

Nicolas Holut assume, com frontalidade, a sua impotência para vencer aqueles que boicotam as urgentes reformas ambientais que a França precisa. E como o ambiente é mais importante que qualquer cargo, vaidade ou conveniência política o ministro francês decidiu sair, pois sempre pode surgir alguém que possa fazer algo de positivo, necessário e urgente.

Holut perdeu a batalha ambiental, mas manteve a dignidade pessoal, já que os seus parceiros do governo boicotaram a sua ação política.

Obviamente que as sociedades modernas não precisam de políticos que percam com dignidade e preferem as ações às demissões, no entanto quando a hipocrisia parece uma doença hereditária no meio político, é bom perceber que ainda há gente capaz de um pequeno sacrifício pessoal para que um bem coletivo maior não se perca. 
Ainda que a maioria dos políticos não se tenha dado conta, falar sempre verdade, em público, é o primeiro passo para uma ação política eficaz e produtiva.

GAVB 

quarta-feira, 29 de agosto de 2018

PROFESSORES SEM AULAS AOS 60 É UMA BOA PROPOSTA, MAS MUITO INGÉNUA


Quando os professores mais novos do sistema educativo português desesperam com a ausência de notícias sobre a sua colocação profissional para o novo ano letivo, a Associação dos Diretores Escolares propõe algo profundamente naïf: os professores com mais de sessenta anos podem optar por deixar de dar aulas, cumprindo o seu horário apenas com atividades não letivas (projetos, clubes, assessoria...).

Ninguém contesta o mérito da proposta e ela não é nova, mas as hipóteses de ser aceite são muito reduzidas. 
Então o governo do partido socialista não reconhece aos professores o direito a ter um carreira, apagando-lhes mais de nove anos de tempo de serviço, e agora ia permitir que os professores deixassem de exercer a sua principal atividade seis anos antes da idade da reforma?

A razão principal pela qual a reforma sem penalização só se atinge depois dos sessenta e seis anos é económica. 
Quando igualou a idade da reforma dos funcionários do Estado aos do setor privado, o governo tornou-se cego, surdo e mudo para as profissões de grande desgaste físico e psicológico. Na última década a situação não se alterou nem se vai alterar significativamente. 

Além da docência há outras atividades de grande desgaste físico e psicológico como é o caso dos enfermeiros ou de algumas forças de segurança e não se vê os governantes portugueses com vontade de atender à especificidade de cada profissão. Antes pelo contrário! A única exceção é a classe política, cuja pouca vergonha nas pensões e subvenções vitalícias é tão grande que acharam por bem impedir a divulgação da lista da vergonha.

A proposta dos diretores parece-me demasiado ingénua e destinada apenas a tentar restabelecer o clima de confiança entre diretores e professores, agora que a municipalização da educação está em marcha e todos os apoios conta. Lembram-se tarde que também são (ou foram) professores. 
Se queriam mostrar a sua solidariedade e coragem deviam mostrar a sua repulsa e indignação perante a falta de respeito que todos os anos o ministério da Educação manifesta com os professores, anunciando apenas nas últimas horas de Agosto a colocação profissional de milhares de professores. Além disso, ninguém ouviu a Associação de Filinto Lima ter uma palavra inequívoca sobre a justa luta dos professores pela restituição do seu tempo de serviço.
GAVB

terça-feira, 28 de agosto de 2018

A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL DESTRUIRÁ PESSOAS REAIS


Colocar um robô numa caixa de supermercado, num banco, numa repartição pública, num posto turístico ou numa sala de aulas será dos maiores erros que a humanidade cometerá contra si própria e rapidamente se tornará num monstro incontrolável.
O problema mais óbvio é não arranjarmos colocação para os milhões e milhões de pessoas que perderão o seu emprego e de imediato entrarão numa situação económica, social e psicológica degradante.
Se agora o continente mais rico e solidário do planeta não consegue absorver umas centenas de milhar de refugiados do norte de África, deixando-os morrer cruelmente no Mediterrâneo, como conseguirá atender à vaga brutal de tomada de postos de trabalho qualificados por robôs com inteligência artificial?

Obviamente este exército de robôs inteligentes e telecomandados não chegará apenas para colmatar as vagas que os humanos não podem ou não querem preencher, mas essencialmente para substituir pessoas.
Outro enorme perigo da institucionalização da inteligência artificial é ela ser dominada e manipulada por um grupo muito restrito de pessoas que a passarão a usar como uma forma de submeter e oprimir grande parte da humanidade.

É assustador pensar que grande parte da formação das gerações futuras pode ser dada por robôs com inteligência artificial, programados segundo determinados padrões de pensamento e comportamento.

Esses milhões de pessoas formados e formatados pela inteligência artificial, controlada por essa pequena elite humana, terão comportamentos muito pouco livres, pois o seu contacto com humanos imperfeitos, contraditórios e livres pensadores será muito reduzido.

A inteligência artificial acentuará a desumanidade e o egoísmo em que a maioria dos povos vive, apesar de tanta viagem turística, e tornará a vida sentimental da maioria das pessoas insípida. Já não haverá desilusão, porque a própria ilusão será uma memória longínqua.

GAVB  


quinta-feira, 16 de agosto de 2018

NUMA ECONOMIA NEOLIBERAL, A CULPA É SEMPRE DA CONCESSIONÁRIA

A Itália chora a morte de dezenas de pessoas, após a queda de uma ponte rodoviária, em Génova. Apesar do infortúnio, não se pode dizer que não fosse admissível que um desastre destes viesse a suceder, pois a ponte Morandi era a estrutura rodoviária com mais problemas estruturais, necessitando de uma manutenção especial e permanente, em todo a Itália. Alguns responsáveis políticos e técnicos chegaram mesmo a defender o seu encerramento e a construção de outra estrutura. Não foram ouvidos, mas também não foram contraditados. 
Os dirigentes políticos italianos apostaram tudo na sorte e, como era óbvio, um dia tiveram azar. 
Agora não mais havia a fazer do que assumir a culpa e não passar a culpa. Este governo italiano não tem uma particular culpa no que aconteceu, mas enquanto representante do Estado italiano tem TODA a culpa. E tem de a assumir ou pelo menos devia.  
Atirar a culpa para a concessionária de auto-estradas é própria de gente que não sabe o que é o Estado e logo aí não é digno de o representar.

Não foi a concessionária que construiu a ponte ou que decidiu mantê-la no ativo, apesar de todas as indicações contrárias. Não foi a concessionária que falhou na fiscalização, embora tenha sido ela a aceitar aquilo que devia ter recusado. 
À concessionária cabe proteger os seus interesses, sem desproteger os interesses da comunidade, já ao Estado cabe sempre proteger os interesses dos cidadãos e não jogar à roleta com eles. 
Do ministro italiano retenho duas declarações /passa culpas muito infelizes: a culpa era de Bruxelas que os obrigava a obrigações tão duras que não sobrava dinheiro nenhum para a manutenção de infraestruturas essenciais; a culpa era da concessionária
Nem uma palavra às famílias das vítimas ou a garantia de que o Estado assumir pelo menos a sua parte de responsabilidade extracontratual. Os italianos não fizeram nenhum acordo com qualquer concessionária nem negociaram um mau acordo com Bruxelas, depois de anos de péssimas políticas económicas do governo de direita do senhor Berlusconi.    
O governo xenófobo e neoliberal italiano demonstra não saber o que se espera de um estadista e de um governo de um país soberano e democrático. Provavelmente pensa que o estado italiano é alguma empresa, que, apertada pelas circunstâncias nefastas, declara estrategicamente falência.   É por isso que para estar à frente do governo de um país não serve um qualquer Trump, com muito sucesso nos negócios.
GAVB

terça-feira, 14 de agosto de 2018

DA ARTE, DA PINTURA, DAS EXPOSIÇÕES IMPERDÍVEIS


Falo-vos hoje de uma Exposição, “Os Modernistas” Amigos e Contemporâneos de Amadeo.
Mais um Projeto Arte Partilhada, da Fundação Millenium BCP, desta vez patente no MMASC (Museu Municipal Amadeo de Souza-Cardoso), trazida para integrar a programação de excelência do evento MIMO Festival.
Concorde-se ou não com o título que lhe foi atribuído, sublinhe-se o espaço e o contexto  em que nasce esta Exposição, que coloca Arte em diálogo, que constrói e desconstrói histórias, personagens, paisagens e cenários. Estas “amizades” tocam-se em espaços pictóricos de rebeldia, amizades que se espraiam em gerações avessas aos academismos que algemam, amizades que se desenham em traços de individualismo em implosão.
António Carneiro. Amadeo de Souza-Cardoso. Eduardo Viana…tantos.
Nesta Exposição, com a excelente curadoria da Dr.ª Raquel Henriques,  patente no MMASC até 28 de outubro de 2018, apresentam-se obras de especial importância, quer do Primeiro Modernismo Português, o mais puro e genuíno, quer do modernismo marcado pelas amarras do SPN – Secretariado de Propaganda Nacional – e pelo gosto de António Ferro, em sintonia com os ideais do Estado Novo.
Esta Exposição merece de todos nós uma visita pausada e um olhar atento a todas as 85 obras expostas. No entanto, para aguçar curiosidades, deixem-me lembrar apenas três óleos que me agradaram particularmente. A uni-los, a elegância e o mistério da figura feminina.

                                                          Eduardo Viana, Duas Mulheres, óleo s/tela,1914

Desta tela brota uma beleza e uma elegância que em nada se coaduna com o traje que cobre as duas mulheres, a sugerir simples aldeãs. A estilização surpreende e lembra a figura feminina a roçar a Arte Nova, num tratamento esguio e longitudinal que não esperávamos.


                               Mário Eloy, Mulher Sentada à Janela, óleo s/ tela,c. 1927-31

Os anos vinte trouxeram-nos esta “Mulher Sentada à Janela”, de Eloy. Uma pintura geometrizada, a lembrar a decomposição cubista, enigmática pela ausência de traços marcantes do seu rosto e pela atitude de quase acomodação…a janela espreita e desvenda o horizonte. Nada disso importa à mulher, alheada e em profundo desalento…


                                   Eduardo Viana, Rapariga à Janela, óleo s/tela,1948

Viana a surpreender de novo, numa composição a lembrar Cézanne e uma natureza-morta de enfeitar,absolutamente desinteressante e que passa despercebida à figura feminina.



 Poderia ter sublinhado outros pintores, outras obras. Por exemplo, Almada, de quem sou devota; Amadeo, por quem me apaixono sempre; António Carneiro, que ainda tento decifrar…mas estes retratos ou quase retratos ficaram-me na retina, pela elegância, pelo arrojo, pelo invulgar da representação. Nestas telas, consegui ver inovação, deleite, sedução, devaneio e provocação. Um Modernismo que é um MIMO.
E tudo isto, a um pequeno passo de nós.
Visitem.
Rosa Maria Alves da Fonseca

sexta-feira, 10 de agosto de 2018

A VIAGEM MEDIEVAL 2018 LEVA-NOS AO TEMPO DE DOM PEDRO, O JUSTICEIRO CRUEL



A Viagem Medieval 2018, por Terras de Santa Maria, leva-nos ao reinado de D. Pedro. E basta olhar para a foto do programa da maioria viagem medieval portuguesa para percebermos que vamos conhecer o lado justiceiro, cruel e amargo do rei que amou Dona Inês de Castro.
O recinto é o mesmo de outras Viagens e nele podemos encontrar sempre atividade, embora os principais acontecimentos se concentrem quando o sol se retira e a noite toma conta do povoado. 

Os pequenos estarão cansados do treino dos escudeiros ou de tentar entrar para o corpo de elite dos arqueiros de D. Pedro, mas a música não pára e há sempre animação a acontecer, entre o Castelo, o povoado, o terreiro das Guimbras e o convento.
As recriações históricas comportaram quatro cortejos (Da Amada e rainha, Justiceiro Cruel, D. Pedro I, el rei de Portugal; Cortejo Real) e três episódios: a Vingança, a Coroação e o Sonho.

Todos os dias, há um espetáculo final, Sangue de Portugal, onde dezenas de atores recriam a guerra que D. Pedro moveu contra seu pai, o rei D. Afonso IV, depois deste ter mandado matar o amor de sua vida – Inês de Castro. É uma encenação grandiosa a que assiste grande parte do público que acorre à Viagem Medieval e onde dezenas de atores e figurantes estão envolvidos.

Este ano, escolhi a noite de ontem para viajar até ao século XIV e entrar no turbulento reinado de D. Pedro, o justiceiro. Além de “Sangue de Portugal”, gostei bastante de assistir no cortejo Justiceiro Cruel, onde o lado sanguinário e impiedoso de D. pedro ficou claramente retratado.

Apesar da Viagem Medieval já se realizar há duas décadas continua a atrair cerca de cinquenta mil pessoas por dia, o que atesta a solidez e a qualidade desta Feira Medieval, uma das maiores e melhores atrações turísticas do verão, no norte de Portugal.
Para quem tiver vontade de viajar no tempo, até ao reinado de D. Pedro, ainda há oportunidade de o fazer até domingo.
GAVB

quarta-feira, 8 de agosto de 2018

A CP NÃO SERVE O PORTUGUÊS NEM APROVEITA O TURISTA


Nos últimos tempos, a CP (Comboios de Portugal) tem sido alvo de várias críticas, pelo seu mau funcionamento, péssimo serviço, alterações inexplicáveis de horários a meio do verão. Além de não haver ninguém na CP que explique mudanças, assuma responsabilidades ou justifique falhas, o que mais me admira é a falta de estratégia comercial e o péssimo aproveitamento do motor da economia portuguesa – o turismo.

A CP para uso doméstico dará sempre prejuízo, mas o mesmo aconteceria com outros setores da economia portuguesa se não abrissem os olhos para a nova ordem mundial, que cada vez mais traz gente em movimento. Em Portugal, todos os dias, aterram dezenas de milhares de turistas. Muitos deles já conhecem Lisboa e Porto e têm um desejo enorme de descobrir outras cidades, como Aveiro, Braga, Guimarães, Évora, Viseu, Coimbra… E que faz a CP para colocar um turista que aterra em Lisboa rapidamente em Aveiro, Coimbra, Viseu, Évora ou Guimarães? Nada! 

Um turista que visita o nosso país já percorreu várias cidades europeias e está habituado a chegar a um grande gare de uma capital ou de uma cidade importante de um determinado país e ter comboios rápidos, com várias opções de horários, para os pontos turísticas mais importantes desse país. Isso não acontece em Portugal. 
Se estou em Lisboa, e resolvo fazer uma incursão até Guimarães chego às 15 horas e 40 minutos! O que é que lá vou fazer se duas horas depois tenho de partir? 
A CP só tinha a ganhar em estabelecer parcerias com os principais operadores turísticos de cada cidade, de maneira a colocar até às 10.30/11 horas qualquer turista que aterrasse em Lisboa, Porto, Faro nas cidades portuguesas mais visitadas pelos estrangeiros que visitam o nosso país. Comboios rápidos e sempre a circular.

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O turismo começou a salvar e a reconverter a economia nacional. As cidades que o souberam aproveitar deram um salto muito grande a nível económico e hoje atraem investimento com muito mais facilidade. 
Os Comboios de Portugal ignoraram por completo o turista e estão a perder uma  oportunidade de se tornarem sustentáveis, melhorarem a qualidade do serviço, constituírem-se com um parceiro estratégico do alavancar da economia nacional. 
Podiam ser a solução ideal da mobilidade turística num país pequeno e todo ele encostado ao litoral, mas preferem continuar a ser um problema, por falta de estratégia e ousadia comercial.
gavb


segunda-feira, 6 de agosto de 2018

BANQUETE NO VELÓRIO


Quando E O Que Servir Em Velório De Defunto
Nem por ser desordenado dia de lamentação, tristeza e choro, nem por isso se deve deixar o velório correr em brancas nuvens. Se a Dona da casa, em soluços e em desmaio, fora de si, envolta em dor, ou morta no caixão, se ela não puder, um parente ou pessoa amiga se encarrega então de atender à sentinela pois não se vai largar no alvéu, sem de comer nem de beber, os coitados noite adentro solidários; por vezes sendo inverno e frio.

Para que uma sentinela se anime e realmente honre o defunto a presidi-la e lhe faça leve a primeira e confusa noite de sua morte, é necessário atendê-la com solicitude, cuidando-lhe da moral e do apetite. 
Quando e o que oferecer?
 Pois a noite inteira, do começo ao fim - Café é indispensável e o tempo todo! café pequeno, é claro. 
Café completo, com leite, pão, manteiga, queijo, uns biscoitinhos, alguns bolos de aipim ou carimã. 
Fatias de cuscuz com ovos estrelados, isso, só de manhã e para quem atravessou ali a madrugada. 
O melhor é manter a água na chaleira para não faltar café; sempre está chegando gente. Bolachas e biscoitos acompanham o cafezinho; uma vez por outra uma bandeja com salgados, podendo ser sanduíches de queijo, presunto, mortadela, coisas simples, pois de consumição já basta e sobra com o defunto.

Se o velório, porém, for de categoria, dessas sentinelas de dinheiro a rodo, então se dê uma xícara de chocolate à meia noite, grosso e quente, ou uma canja gorda de galinha. E, para completar, bolinhos de bacalhau, frigideira, croquetes em geral, doces variados, frutas secas. Para beber, em sendo casa rica, além do café, pode haver cerveja ou vinho, um copo e tão somente para acompanhar a canja e a frigideira. Jamais champanha, não se considera de bom tom.

Seja velório rico, seja pobre, exige-se, porém, constante e necessária, a boa cachacinha; tudo pode faltar, mesmo café, só ela é indispensável; sem seu conforto não há velório que se preze. Velório sem cachaça é desconsideração ao falecido, significa indiferença e desamor.

Jorge Amado

sexta-feira, 3 de agosto de 2018

EINSTEIN INCENTIVOU ROOSEVELT A CONSTRUIR A BOMBA ATÓMICA


Quatro semanas antes do início da Segunda Guerra Mundial, quando os políticos europeus mais experimentados sabiam que era impossível parar a sede de vingança e poder de Hitler, Einstein escreveu ao presidente dos Estados Unidos, F. Roosevelt, dando-lhe conta dos extraordinários avanços no mundo da Física - "talvez seja possível desencadear uma reação nuclear em cadeia, numa grande massa de urânio, ..." - que ajudariam na construção de uma bomba poderosíssima.

Einstein é bastante explícito: "Este novo processo conduziria à construção de bombas (...). Uma única bomba, transportada num barco e feita explodir num porto, pode destruir o porto por completo e uma parte da zona circundante.

Por muito distraído que Einstein pudesse ser (que não era...), ele tinha consciência da capacidade destruidora da bomba atómica ainda por nascer. Obviamente não o podemos condenar pelos efeitos radioactivos da bomba atómica, mas a carta que ele envia a Roosevelt mostra apenas um Einstein preocupado em ganhar a corrida do nuclear aos nazis e com o modo como seria transportada a pesada bomba, mas não com as pessoas. Um porto e arredores não são apenas barcos e instalações militares; quem destrói barcos e armazéns mais rapidamente destrói pessoas. 


Faltava um mês para começar a guerra e Einstein parecia mais certo dela do que o ingénuo Chamberlain, embora os EUA não fizessem parte dos planos de ataque inicial de Hitler. 

É verdade que o lançamento da bomba atómica alterou todo o pensamento do Homem sobre o nuclear assim como definiu as novas fronteiras do Medo, do Poder e da Chantagem, até aos dias de hoje.
Einstein arrependeu-se - "Se eu soubesse, teria sido relojoeiro!". Ele não sabia tudo (Nunca ninguém sabe...), mas sabia o suficiente para não jogar com o lado perverso do desenvolvimento científico. A bomba atómica e a energia nuclear fazem chantagem com a Humanidade, porque entre ela sempre haverá loucos e maldosos, e por isso continuo a pensar que "a reação nuclear em cadeia num grande massa de urânio" foi a mais infeliz conquista científica da História.
GAVB

quarta-feira, 1 de agosto de 2018

O DIÁRIO PERDIDO DE UMA ADOLESCENTE


No dia 1 de Agosto de 1944, Anne Frank escrevia pela última vez o seu diário. 
Aquele que viria a tornar-se o diário mais famoso do século XX, pelo modo como nos deu a conhecer a visão, de uma adolescente de 15 anos, do acontecimento mais marcante do século passado - a Segunda Guerra Mundial e o Holocausto -, registava na sua última:
«O que eu digo não é o que eu sinto, e é por isso que tenho a fama de perseguir rapazes, de ser namoradeira e espertalhona e de ler romances. A Anne otimista dá uma resposta petulante, encolhe os ombros e finge que não se importa. A Anne discreta reage exatamente ao contrário.»  

A escrita de um diário, que se quer mais ou menos secreto, era uma das marcas da adolescência. Nele a rapariga ou o rapaz exprimia os seus sentimentos, medos, dúvidas, zangas, revoltas, segredos. Anos mais tarde (se não o tivesse destruído), havia de se rir daquelas tempestades emocionais, percebendo a pouca dimensão das suas tormentas, mas também revia o seu percurso, as suas razões e as dos outros. 

Hoje os adolescentes não escrevem diários. No entanto, eles têm emoções semelhantes às dos seus pais ou avós; tacteiam o mundo cheios de dúvidas e têm acontecimentos que gostariam de registar, mas mantê-los em segredos. 
Apesar disto tudo ser verdade, deixaram de escrever, de exprimir-se por palavras secretas e fechadas a cadeado. Postam fotos ou frases que viram no Instagram de um amigo ou de uma celebridade do momento. 
Há quem diga que se adaptam à modernidade e à tirania da imagem. É só uma parte da verdade. A outra é que perdem a construção da sua intimidade e da sua personalidade. 
Há um mundo de pensamentos e emoções que nenhuma foto resgistará. Além disso, atrasam o inevitável debate com as suas contradições, com as suas dúvidas, com as suas emoções, com os seus valores. Essa coisa maravilhosa que é verbalizar, através da escrita, o pensamento.

GAVB