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terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

ÉSQUILO, O PRIMEIRO TRÁGICO DA HISTÓRIA DO TEATRO


Entre 525 a.C. e 456 a.C. viveu Ésquilo, celebérrimo poeta trágico grego que escreveu mais de sessenta tragédia, mas cuja obra só conhecemos uma ínfima parte, pois só chegaram até nós sete peças completas: As Suplicantes, Os Persas, Os Sete Contra Tebas, Prometeu Agrilhoado, Agamémnon, As Coéforas, Euménides.
De carácter bravo e destemido, Ésquilo orgulhava-se em ter combatido em batalhas tão emblemáticas como Maratona ou Salamina, mas foi o Teatro que inscreveu o seu nome na História. Os seus compatriotas admiravam-no muitíssimo e a sua fala de porta trágico extravasa as fronteiras de Atenas.
Como grande patriota que era, Ésquilo concebeu o drama como instrumento de propaganda nacional, ou seja, um meio de inculcar nos espetadores a importância do amor à pátria, da submissão à vontade dos deuses e do culto paciente da virtude.


A Ésquilo ficou a dever-se muitas inovações: passagem da peça de teatro do estado meramente lírico-narrativo ao nitidamente dramático; colocação de um segundo e terceiro atores junto ao protagonista e à frente do coro; enriquecimento do aparelho cénico; introdução da máscara, do manto e do coturno na representação.
Ésquilo escolhe sempre temas grandiosos para as suas tragédias, que tiveram, invariavelmente, um vigor e profundidade insuperáveis.
Durante mais de quatro anos este extraordinário dramaturgo dominou o teatro ateniense, vencendo treze concursos nacionais. Foi ele que limitou as partes corais, estabelecendo o verdadeiro diálogo trágico; foi ele que fixou o esquema de três dramas seguidos que viriam a ser os três atos das peças de hoje.

Como já referi, até nós apenas chegou 10% da sua obra. Em As Suplicantes, Ésquilo propõe a dramatização das lendas das cinquentas filhas de Damão; n’Os Persas são protagonistas as sombras dominadoras de Dário e Xerxes que chega derrota para dar conta da sua inépcia. A tragédia Os Sete contra Tebas fazia parte de uma trilogia cujas duas primeiras peças (Lajo; Édipo) se perderam. Esta tragédia termina com um duelo entre os irmãos Eteocles e Polimice (filhos do incesto de Jocasta e Édipo) de que resultará a morte de ambos para “lavar” o trágico incesto diante da vontade dos deuses.
Prometeu Agrilhoado também faz parte de uma trilogia entretanto perdida. Através da sua história, Ésquilo põe-nos a refletir sobre a bárbara tragédia do Destino inexorável em relação aos homens. O tema é o castigo imposto pelos deuses a Prometeu, que se introduziu no Olimpo para roubar o fogo sagrado dos deuses e dá-lo aos homens.
A única trilogia que chegou imaculada até nós foi a Oristeia (Agamémnon, As Coéforas, Euménides). A ação decorre entre o regresso dos vencedores de Troia e o perdão de Orestes (filho matricida) concedido pelo areópago ateniense.
Definitivamente, Ésquilo – um dramaturgo a reler.
GAVB

quinta-feira, 29 de outubro de 2015

AGAMÉMNON, de Ésquilo, no TNSJ


Agamémnon, tragédia escrita por Ésquilo, foi a segunda proposta que o encenador Tiago Rodrigues apresentou ao público do TNSJ, neste final de outubro maravilhoso para quem gosta de teatro clássico.
A tragédia do dramaturgo grego chama-se “Agamémnon”, mas o encenador fez de Clitemnestra o centro da ação trágica.
Esta é uma peça sobre a vingança, uma vingança sem remorsos e até com um certo prazer; uma vingança prometida dez anos antes, ou seja, no momento da partida dos gregos para Troia, quando Agamémnon decidiu sacrificar a inocente Ifigénia, sua filha e de Clitemnestra, para que os deuses enviassem os desejados ventos que pusessem os barcos a caminho de Troia.

Clitemnestra já tinha avisado em “Ifigénia” que não esqueceria a traição vergonhosa do marido e dez anos foi tempo suficiente para preparar toda uma vingança.
A peça de Agamémnon começa com um clima de falsa festa (os atores bebem champagne enquanto passeiam pelo palco), esse nevoeiro incessante, que Clitemnestra preparou para receber o grande triunfador de Troia.
Agamémnon pressente a desgraça latente e está inquieto, mas não adivinha toda a amplitude da vingança da esposa. Durante dez anos, esta traiu Agamémnon com Egisto, primo e um dos principais inimigos do rei de Argos; tratou sem amor os filhos de
Agamémnon, Electra e Orestes, e aguardou pacientemente dez anos para consumar a total vingança: enquanto Agamémnon tomava banho e se preparava para a festa, em honra da sua vitória troiana, Clitemnestra e Egisto desferem com a espada o golpe fatal em Agamémnon. Olhos nos olhos para que este morresse com a perfeita noção de que de uma vingança e humilhação se tratavam.

 Inúteis foram os avisos de Cassandra, escrava que Agamémnon trouxera de Troia, a quem Egisto lançara olhares desejosos, antes de consumar a posse do seu corpo à força e por fim lhe cortar a cabeça.
Inúteis foram os avisos de Electra, que um pai confuso não entendeu nem conseguiu enquadrar. 
Achei muito interessante o papel que Tiago Rodrigues reservou ao coro, investido de povo de Argos, que não sabia o que fazer nem o que dizer. Uma palavra os caracterizava e aproxima de nós: indecisão. Gritavam, clamavam, queriam fazer algo, mas não avisaram o seu rei da perfídia que contra ele se urdia nem impediriam que Egisto e Clitemnestra consumassem o assassínio. Achavam mal a vingança da rainha como tinham achado mal que Agamémnon tivesse sacrificado a inocente Ifigénia dez anos antes. Na indecisão, deixaram o crime acontecer. Próprio de pessoas fracas, ainda propuseram a Clitemnestra uma saída airosa: culpar Egisto. Ela recusou. Não era nenhum fantoche.

Clitemnestra assume inteiramente a felicidade que a vingança lhe traz. Não havia nada para lhe perdoar, porque ela havia decidido morrer às suas próprias mãos, morrer por Ifigénia. Como diz repetidamente ao longo da peça, ela ficara em Auris (local do sacrifício de Ifigénia), dez anos antes.
Esta peça tem de ser vista em relação direta com "Ifigénia" de Eurípides. A vingança de Clitemnestra é uma consequência natural de uma decisão pessoal, desumana, incompreensível, evitável e irracional de Agamémnon. Segue-se “Electra”, daqui a dois dias, para completar a trilogia.
Curiosa a maneira como Tiago Rodrigues decide a intervenção final do coro, que, na minha opinião, decalca a voz de muitos de nós, atualmente: “Alguém nos ouve?”
Claro que ninguém os ouviu nem nos ouve. Não fizeram (fazemos) nada! É por isso que ninguém nos ouve. Quando passarmos a fazer, passam a ouvir-nos. E a história será, certamente, diferente. Uma tragédia não é uma inevitabilidade divina!

Gabriel Vilas Boas