A 13 de maio de 1888,
finalmente, foi promulgada a lei que aboliu a escravatura no Brasil. A Lei
Aurea foi um marco importante na história do Brasil, de tal modo que o dia de
hoje foi feriado nacional até 1930, altura em que Getúlio Vargas, qual déspota iluminado,
a retirou do calendário oficial.
A questão que me
assaltou de imediato quando reparei na data da lei foi: por que demorou tanto o
Brasil a abolir a escravatura? Não é admissível que só seis décadas depois do
grito de Ipiranga os brasileiros tenham libertado o seu amado país de uma das
mais ignominiosas “leis” que regeram povos e mais povos ao longo dos séculos.
Afinal, a escravatura
não era apenas um pecado original dos povos colonizadores. A escravatura foi (e
nalguns pontos do globo ainda continua a ser) um vírus que se instalou na alma
de muitos homens e mulheres que não assimilaram corretamente o que significa “dignidade”
e como este valor é indissociável do de “humanidade”.
O Brasil demorou tempo,
mas conseguiu chegar a um tempo em que se pôde olhar ao espelho sem sentir
vergonha e isso é uma vitória civilizacional que deve ser assinalada.
Esta libertação da
escravidão foi um processo gradual, o que foi uma pena. Primeiro, proibiu-se o
tráfico, depois libertou-se os filhos dos escravos e, finalmente, arranjou-se
coragem, que faltou durante séculos, para devolver a plena condição de pessoas
a 720 mil escravos que seres sem qualificação usavam como objetos.
Nessa altura, os
escravos representavam 5% da população brasileira, mas umas décadas atrás eram
o dobro, e os políticos brasileiros não tiveram a coragem nem a força para
afrontar os ricos e poderosos fazendeiros do país. Os mesmos que construíram a
sua riqueza e poder à custa do trabalho e do esforço dos escravos.
Quando esta lei entrou
em vigor, estes “senhores” ainda tiveram a distinta lata de pedir uma
indemnização por lhes retirarem mão-de-obra que trabalhava gratuitamente. Na
verdade, o correto seria eles pagarem àqueles homens e mulheres tudo o que lhes
ficaram a dever durante décadas e indemnizá-los pela maneira indigna como
dispuseram das suas vidas.
O que se passou no
Brasil inseriu-se num amplo movimento de libertação de escravos no continente
americano, que teve os EUA como epicentro mais mediático. No entanto, só no
final do século XX, a América ficou completamente livre da doença esclavagista.
Quando olhamos para
trás, muitos interrogam-se “Como foi possível?”, outros questionam-se somente “como
foi possível esperar tanto tempo?”, mas, talvez tenhamos de concluir que a
escravatura não é ainda um vírus erradicado, mesmo entre países que aboliram
esta monstruosidade há mais de um século. As ervas daninhas que sustentaram
este cancro civilizacional ressurgem aqui e ali, especialmente em momentos de
crise económica, em que alguns seres humanos (???) não vislumbram outra
maneira, para solucionar a sua impotência, que não seja usar o seu semelhante
como objeto. Vemos isso em algumas propostas de trabalho, vemos isso em algumas
teorias económicas, vemos isso em alguns discursos políticos.
A solução é mantermo-nos
vigilantes e dar luta a todas as tentativas dissimuladas de implementar algo
que se assemelha à escravatura.
Os homens e mulheres
verdadeiramente livres e dignos não podem permitir que a humanidade seja
escrava de ideias tão ignóbeis.
Gabriel Vilas Boas
E o meu amigo Youssef, marroquino de Ouarzazate um nadinha mais novo que eu, cresceu numa casa onde ainda existiam escravos... :(
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