Há dias, a fadista portuguesa Gisela João recebeu, do crítico de música
do “New York Times”, um rasgado elogio ao seu último concerto, considerando-o “luminoso”.
O jornalista referiu-se ainda ao fado em termos muito positivos, desfazendo o
mito de canção triste, comparando-o à vida, na maneira intensa e apaixonada como
deve ser vivida.
João Braga (um dos mais antigos, conhecidos e polémicos
fadistas portugueses) podia ter aproveitado a embalagem para “puxar” pelo fado,
amplificando, nas redes sociais, este concerto da jovem fadista, mas preferiu
atrair a atenção sobre si escrevendo sobre… cinema. Não para perorar sobre a
qualidade artística de um determinado filme ou demonstrar a injustiça de
determinado Óscar. Limitou-se a vomitar um insulto racista e homofóbico sobre o
filme do ano para a Academia de Hollywood, Moonlight.
João Braga está no seu pleno direito ao não gostar de Moonlight ou de o achar menor, mas a sua
frase sobre a noite dos Óscares – Basta ser preto ou gay para ganhar os Óscares
– revela que as suas opiniões são muito mais baseadas em preconceitos do que em
factos. O que revolta João Braga não é Moonlight
ter ganho, mas ter sido um negro gay a ganhar. Ora, é isso que é triste e
revoltante.
Durante anos, João Braga e o fado tiveram de lidar com o
preconceito que grande parte da sociedade portuguesa tinha contra o fado. João
Braga foi, muitas vezes, incisivo contra essa maneira vil e tonta de
amesquinhar aquilo que se conhece mal, só porque não é moderno.
Passaram anos e João Braga ainda não entendeu que a
discriminação não existe apenas quando é cometida sobre nós ou daqueles de quem
gostamos. Ao contrário do que o fadista pensa, não basta ser gay nem preto para
se ganhar Óscares, como o atestam os outros prémios que o filme Moonlight foi arrecadando. Já para deixar
de ser preconceituoso e racista é necessário ser civilizacionalmente
evoluído. Os artistas costumam sê-lo, mas João Braga parece que só sabe cantar
fado, porque de cinema percebe muito pouco.
gavb