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segunda-feira, 19 de março de 2018

AMOR É A COMBINAÇÃO PERFEITA DE SENTIMENTO, VONTADE E INTELIGÊNCIA



O renomado psiquiatra espanhol Enrique Rojas costuma afirmar que o “o grande erro do século XX foi acharmos que o amor era só um sentimento, que vai e vem, quando na realidade é um ato de vontade e inteligência”. De facto tendemos a negligenciar o papel da inteligência na construção da nossa felicidade.

É verdade que o amor não se aprende nos livros, nem há uma fórmula científica que o tenha capturado, mas quase todas as histórias de falhanços amorosos têm uma explicação bem racional.


A vontade e a inteligência têm um papel fundamental na oxigenação do sentimento amoroso. A maneira como gerimos conflitos ou como encaramos os inevitáveis problemas que as diferenças de personalidade trazem é um exercício de inteligência.
Muitos casais queixam-se da monotonia em que as suas relações caíram, achando que a culpado foi o enfraquecimento do sentimento, quando o problema esteve na ausência de vontade. É a inteligência que estimula a vontade, permitindo que os sentimentos ganhem as tonalidades de um arco-íris.
É óbvio que o sentimento pode desaparecer, invalidando todas as tentativas inteligentes que a nossa vontade possa ter, mas essa é uma resposta normalmente preguiçosa de quem faz pouco esforço.

Ter metas e objetivos a nível afetivo é um bom princípio para quem não gosta de deixar o seu futuro emocional nas mãos do acaso. 
Por exemplo, resolver um problema com o companheiro é uma meta tangível. Aprender a perdoar, não transformar problemas em drama ou deixar-se de constantes queixas e remoques podem constituir objetivos de um dos membros do casal ou até dos dois.
Trazer a inteligência para o mundo dos afetos não é mecanizar o coração nem racionalizar sentimentos, mas antes rentabilizá-los, otimizá-los e transformá-los em algo mais sólido e duradoiro.
GAVB

quarta-feira, 14 de fevereiro de 2018

DECLARAÇÕES E RECLAMAÇÕES DE AMOR


Já não estavam juntos.
Os dias, as semanas, os meses haviam arquivado recordações e emoções, mas não o Amor. Ainda se amavam, mas o lixo, que deixaram acumular pelo jardim, fizera perder o perfume e a beleza das rosas. Sobrava-lhes o silêncio, a mágoa, o ressentimento. Também o amor.
Incomodava-os aquele sentimento que teimava em sobreviver ao fim.
“O Dia Dos Namorados”
Ana não conseguia fugir com o pensamento à simbologia do dia nem à lembrança de Miguel. Não havia arrependimento da decisão tomada, mas tinha de admitir que tinha saudades. Do Miguel que fazia declarações de amor.
Onde estavam elas? Num impulso temerário foi buscar cartas, bilhetes-postais, que o ex-marido lhe mandara durante anos. Surpreendeu-se com a quantidade e com as datas!


Miguel gostava de lhe gabar o olhar misterioso e o sorriso maroto, desde o tempo em que namoravam. Deixava-a vaidosa os constantes elogios à beleza das suas formas e a satisfação que brotava dos seus olhos castanhos sempre que reparava na ousadia dos seus vestidos.
Lia com atenção um poema que lhe escrevera há cinco anos, num dia como aquele. E por entre a beleza das palavras pairou um nuvem de recordações negativas.
Já naquele tempo o Dia dos Namorados era uma ilha enganadora num mar de reclamações.
Miguel acusava-a de se concentrar apenas nas filhas, de estar sempre a reclamar com tudo e com todos, de não ter tempo para eles.




Mas que queria ele? Tinha-se tornado desleixado, desarrumado, descuidado! Deixara de ser um parceiro, passara a ser um peso. Não ajudava nas tarefas domésticas e tornara-se insuportável e egoísta.


Também Miguel acordara a pensar na ex-mulher, naquele triste Dia dos Namorados. Não tinha cartas, bilhetes ou poemas, mas uma memória cheia de declarações de amor em forma de ações.
Lembrava-se perfeitamente daquela contagiante alegria de viver que o obrigara a ser feliz. Ana era uma tempestade tropical que abanava o coração de todos o que amava. Infelizmente, isso passara a ser uma exclusividade das filhas. Irritava-se com facilidade; estava sempre a acusá-lo… de falhar, de não cumprir promessas, disto e daquilo, mas a verdade é que também ela falhava: atrasava-se constantemente; nunca se lhe ouvia um pedido de desculpas; deixara de se cuidar, de ser carinhosa e simpática.

Aquelas recordações faziam-lhe mal. Ia sempre parar aquilo que os derrotara: as constantes reclamações.
Quase já não se lembrava da última declaração que fizera a Ana. Ou melhor, recordava-se – fora mal recebida, pois a ex-mulher aproveitou para o acusar de hipocrisia e logo despejou um rol de reclamações que afundou as suas melhores intenções.

A caminho do trabalho, Miguel pensava em Ana, na simbologia daquele dia e nas razões do falhanço do casamento de ambos. Amargamente concluía que o Dia dos Namorados, dos Afetos ou do Amor não fora apenas simbólico, mas profundamente enganador e excecional. O que fora comum, regular e esmagador foram as centenas de reclamações que encheram os outros dias.

Pensou novamente em Ana. Tinha tantas saudades dela. Apetecia-lhe digitar aqueles números que os seus dedos sabiam de cor, mas resistiu.
Amanhã o seu gesto e as suas palavras teriam um valor incomensuravelmente maior.
GAVB

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

EM TEORIA O AMOR É ABSOLUTO, MAS A PRÁTICA RELATIVIZA-O



Obviamente que o amor começa eterno, apesar de ninguém durar para sempre.
Sem dúvida que não há nada mais importante que o Amor, embora as reuniões de trabalho sejam inadiáveis, os compromissos com os amigos sagrados e as responsabilidades ponderosas.

O Amor é aquela parte da nossa vida em que não admitimos ser apenas medianos, mas a realidade demonstra que há vezes a mais em que desistimos ou fazemos falta de comparência.
Falar em absoluto e em eternidade tem uma beleza poética arrebatadora, mas o Amor consome muito mais do que palavras.

Mais interessante do que dizê-lo absoluto é torná-lo total e permanente. É fazê-lo crescer e ganhar todas as pequenas batalhas do quotidiano. É possível que sejamos bem-sucedidos como é possível sairmos derrotados ou até descobrirmos que até nem ficámos descontentes com alguns insucessos.

Há gente para quem o Amor é relativo, ou seja, apenas mais uma vertente da sua vida; numas alturas sobressai, noutras fica à espera de melhor oportunidade.
Também no Amor há gente que não deseja mais do que a mediania e não há nenhum mal nisso. Não temos todos de gostar de poesia. Todavia, desconfio que há sempre um vazio quando não descobrimos o nosso absoluto. Essa maravilhosa utopia que nos faz sonhar, correr com loucos, empenhar recursos e tempo…
É possível viver sem Amor, mas é muito doloroso vivermos sem nós!
GAVB

terça-feira, 14 de fevereiro de 2017

AMO-TE


 Amo-te de uma maneira inexplicável,
de uma forma inconfessável,
de um modo contraditório.
Amo-te, com meus estados de ânimo que são muitos
e mudar de humor continuadamente
pelo que você já sabe
o tempo,
a vida,
a morte.



Amo-te, 
com o mundo que não entendo

com as pessoas que não compreendem
com a ambivalência de minha alma
com a incoerência dos meus atos
com a fatalidade do destino
com a conspiração do desejo
com a ambiguidade dos factos



ainda quando digo que não te amo, amo-te
até quando te engano, não te engano,
no fundo, levo a cabo um plano
para amar-te melhor
Amo-te, sem refletir, inconscientemente
irresponsavelmente, espontaneamente
involuntariamente, por instinto
por impulso, irracionalmente
de fato não tenho argumentos lógicos
nem sequer improvisados
para fundamentar este amor que sinto por ti
que surgiu misteriosamente do nada
que não resolveu magicamente nada
e que milagrosamente, pouco a pouco, com pouco e nada,
melhorou o pior de mim.
Amo-te



Amo-te 
com um corpo que não pensa
com um coração que não raciocina
com uma cabeça que não coordena.
Amo-te incompreensivelmente
sem perguntar-me porque te amo
sem importar-me porque te amo
sem questionar-me porque te amo

Amo-te
simplesmente porque te amo
eu mesmo não sei porque te amo…

Pablo Neruda

quinta-feira, 27 de outubro de 2016

INTIMIDADE


Recentemente, Luís Osório publicou “Amor”, um livro muito interessante sobre Relações, onde a dado passo escreve:
“Uma relação íntima pode existir sem qualquer intimidade. Podemos fazer amor com uma pessoa de quem somos íntimos e com alguém de que pouco ou nada conhecemos. Na cama é melhor que exista intimidade, ouvimos. Nuns casos, sim. Noutros, não. Porque uma relação íntima, com intimidade ou sem ela, só resulta quando, uns e outros, têm a sabedoria de fazer amor sem a rotina de um burocrata. Fazer amor de cor vale o mesmo que o trabalho feito por um operário especializado na mesma tarefa. Precisamos à mesma, mas nunca saberemos o que andámos a perder.


A nossa noção de intimidade está muito limitada ao sexo, o que é uma pena! A intimidade é perfeitamente possível, desejável até, entre duas pessoas que jamais pensaram em se envolver amorosamente. Existe entre duas pessoas que gostam de companhia uma da outra, que prezam longas conversas à mesa do café ou simplesmente têm prazer em partilhar tarefas, conhecimentos, experiências profissionais.


Muita solidão moderna começa na ausência de intimidade. Temos receio de abordar determinados assuntos com os amigos, porque são “demasiado íntimos”, mas a verdade é que eles existem por falta de intimidade com quem nos poderia ajudar a resolvê-los. 



A intimidade é uma relação de cumplicidade que criamos ou recriamos com alguém em quem confiamos, alguém que nos respeita e, sobretudo, alguém que nos faz crescer enquanto pessoas. 
Não abundam pessoas assim na vida de cada um, mas existem. Seria um erro, uma enorme estupidez afastarmo-nos delas por causa daquilo que outros vão pensar ou dizer, porque é inconveniente ser “íntimo” de um homem ou uma mulher que apenas tem o nobre estatuto de amigo. 
A intimidade de cada um é demasiado importante e séria para ficar dependente de qualquer preconceito bacoco.


Gabriel Vilas Boas

quarta-feira, 28 de setembro de 2016

SEREIA ENGANOSA

Mar!
Enganosa sereia rouca e triste!
Foste tu quem nos veio namorar,
foste tu depois que nos traíste!
Mar!
E quando terá fim o sofrimento!
E quando deixará de nos tentar
o teu encantamento!
"O Mar"
Mar!
Tinhas um nome que ninguém temia:
era um campo macio de lavrar
ou qualquer sugestão que apetecia
Mar!
Tinhas um choro de quem sofre tanto
que não pode calar-se, nem gritar,
nem aumentar nem sufocar o pranto… 
Mar!
Fomos então a ti cheios de amor!
E o fingido lameiro, a soluçar,
afogava o arado e o lavrador.
Miguel Torga

terça-feira, 16 de agosto de 2016

CAN´T HELP FALLING IN LOVE, Elvis Presley


Can´t help falling in love foi um dos maiores êxitos do rei Elvis Presley. 
O maior fenómeno da música norte-americano do século XX tinha um dom especial para as canções de amor.
Elvis conseguia como ninguém misturar a alegria, a força e a adrenalina do rock libertário dos loucos anos 60 à sensibilidade intemporal das canções de amor. A sua voz tanto transmitia a loucura e a ousadia juvenil como a poesia doce das belas histórias de amor.
Elvis tinha uma voz e uma presença hipnotizadoras e certas canções, como Can’t help falling in love, ajudavam a expandir a sua aura de grande sedutor e conquistador.

A letra desta arrebatadora música baseia-se num poema francês do século XVIII e mostra um cantor completamente dominado pelo amor, incapaz de contrair o seu destino.
Em toda a música, a voz de Elvis deixa perceber a beleza, a doçura, o prazer que existe sempre que duas pessoas se apaixonam. A música recria essa atmosfera de concórdia, paz, amor como se de um ideal de felicidade se tratasse.
O poema começa para aludir à dicotomia tolo/sensato para lembrar o que muitos pensam do Amor: uma tolice ou até uma insensatez. No entanto, a força do Amor, da Paixão costuma ter o vigor de um rio, de um destino, de uma inevitabilidade, por mais esforço que façamos, por mais racionalidade que ponhamos nas nossas ações há sempre um (ou vários momentos) em que somos impotentes perante a sua força. E mesmo quando ele nos magoa ou nos trai, a devastação que causa é a prova do seu poder, da sua importância para cada um de nós.
Apesar de todos os emboras, a sensatez sem um pouco de loucura, de vez em quando, é uma tremenda tolice.
Gabriel Vilas Boas

terça-feira, 5 de julho de 2016

RELACIONAMENTO(S)


Um relacionamento é entrar na intimidade do outro, ao mesmo tempo que aprofundamos a nossa. Um re-lação não é mais que uma repetição de “laços”, de “nós”, em que cada um mantém e alimenta um aspeto da relação.
Por isso, a relação é uma construção, uma alteridade, uma reciprocidade e não uma indiferença em que aquele(a) com quem nos relacionamos só interessa na medida dos nossos interesses.
O outro é um ser dotado de individualidade e autonomia, que precisam de ser compreendidas e respeitadas. Partindo desta premissa essencial, é possível fazer crescer uma relação, mas é preciso mais… instalar a reciprocidade, ou seja, a capacidade de alimentar permutas, de partilhar.
Em última análise, não é o amor que mantém uma relação, mas a qualidade da própria relação.

Frequentemente confundimos relação com comunicação ou com emoções, ou com sentimentos. Comunicamos com a vizinha, emocionamo-nos com o Ronaldo e nutrimos amor por uma determinar pessoa, mas a verdade é que não nos relacionamos com nenhuma delas.

Relação, comunicação, emoção e sentimentos são coisas bem diferentes. 
No mundo da comunicação em que vivemos, estabelecemos inúmeros contactos diários com várias pessoas, mas isso está longe de determinar um sentimento quanto mais uma relação. 
A justificação de um sentimento vai muito além da mera casualidade sugerida por Milan Kundera em A Insustentável Leveza do Ser. O sentimento é também diferente da emoção. Vejo esta como algo momentâneo, com uma causa exterior a nós. Pode caminhar e desenvolver-se num sentimento ou não, mas não se confunde com ele. O sentimento depende de nós, do nosso livre arbítrio, da nossa escolha.

É preciso perceber que um sentimento não é uma relação, mas pode caracterizá-la. Uma relação resulta sempre de uma escolha livre. Acontece quando alguém autodetermina o seu caminho independentemente das suas tendências, da influência dos outros, das circunstâncias.
Autodeterminar-se é das coisas mais complexas e difíceis, porque entre nós deixamos crescer “autossabotadores”. Os autossabotadores alimentam-se de dúvidas, dos medos, da culpabilização permanente, do egocentrismo, da procrastinação… É por causa deles que muitas relações se baseiam no medo e no controlo em vez de se basearem na liberdade e na confiança.

Um relacionamento verdadeiramente livre fundamenta-se na honestidade, no amor incondicional, na confiança absoluta, com compromisso (em primeiro lugar e antes de mais consigo próprio), enquanto um relacionamento nascido no medo vive do segredo, da manipulação, do mistério que causa a dependência, da necessidade de controlo.

A escolha é fácil e óbvia. O problema é que muitas vezes pensamos que somos sócios do primeiro, mas praticamos o segundo.
O medo nunca foi sinónimo de liberdade.

Gabriel Vilas Boas 

segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

ESTRELA DA TARDE, de Ary dos Santos e Carlos do Carmo


Trinta e dois anos depois da sua morte, José Carlos Ary dos Santos continua vivo na memória do seu povo. A imortalidade conquistou-a em cada poema, em cada verso que generosamente escreveu para outros cantarem. Ary dos Santos foi o poeta abençoado que fez brilhar a voz de Fernando Tordo, Amália Rodrigues, Carlos do Carmo, Tonicha, Simone de Oliveira, Paulo de Carvalho entre tantos outros. Através da sua poesia alguns ganharam festivais da canção, muitos conquistaram notoriedade na música, quase todos experimentaram a terna melancolia do sentir português.

Hoje escolhi uma canção – ESTRELA DA TARDE – que Ary escreveu para um dos seus parceiros favoritos: Carlos do Carmo.
Neste poema/letra tudo é perfeito. A sonoridade melancólica dos versos, o ritmo – ora pausado ora acelerado -, a combinação entre versos longos e curtos e, sobretudo, a extraordinária beleza metafórica com que Ary trata o Amor. Personificando-o, dá-lhe uma humanidade divina.
Nesta canção/poema, Carlos do Carmo narra uma história de amor única, impossível e carnal ao mesmo tempo que canta os encantos da sua amada, comparando-a com a beleza de um final de tarde.

No poema de Ary dos Santos, o Amor ganha amplitude, verdade e beleza. Há a paixão dos amantes, a força e grandeza dos sentimentos, as incertezas e o medo, mas também uma fé no futuro: “Meu amor, nunca é tarde nem cedo para quem se quer tanto.” Como se aquele verso final fosse a conclusão feliz de uma batalha onde força opostas se digladiam:
“Meu, meu amor
Eu não tenho a certeza
Se tu és alegria ou se és tristeza”
Durante todo o poema/canção, Ary joga magistralmente com a palavra “tarde”. Era de “tarde” que os amantes se encontravam, a incerteza e a tristeza cresciam quando algum “tardava” e o ânimo “entardecia” na ausência do outro, mas o final traz a convicção de que “nunca é tarde” quando o Amor existe.

Se a “tarde” aparece associada aos encontros furtivos, à espera e à incerteza, a “noite” liga-se à paixão arrebatadora, onde o amor se consuma numa felicidade total, poderosa e definitiva.

“Foram noites e noites que numa só noite nos aconteceram (…)
Foi a noite em que os nossos corpos cansados não adormeceram
E da estrada mais linda da noite uma festa de fogo fizeram.”
Não deve ter sido por acaso que Ary dos Santos escolheu Carlos do Carmo para interpretar este poema. A voz melodiosa de Carlos do Carmo expressa perfeitamente a força da paixão de um amor transbordante em paralelo com a melancolia triste de quem receia que esse amor arrefeça e se perca.
O mais maravilhoso e inquietante desta canção é que continua a tocar o coração de diferentes gerações, mesmo depois das várias voltas que o planeta deu à desconcertante máquina humana.

Gabriel Vilas Boas



sexta-feira, 4 de setembro de 2015

UM DIA


Há quatro anos, numa sala de cinema, fui surpreendido por um filme sobre o acaso, o destino, o amor e a vida. Chamava-se “UM DIA” e baseava-se no livro homónimo de David Nicholls que acabaria por assinar o argumento.
A 15 de julho de 1988,precisamente no dia em que acabavam de se formar em Edimburgo, Emma Morley (Anne Hathaway) e Dexter Mayhew (Jim Sturgess) conhecem-se e instintivamente se cria uma química entre eles que os ligará toda a vida numa relação de amizade e amor imprevisível, dolorida, indestrutível.

A lei das coisas previsíveis e estruturadas dirigiu-os por caminhos diversos, durante vinte anos, de acordo com as suas personalidades. Emma era a rapariga simples, bela, cheia de ambições e princípios, que sonhava transformar o mundo num lugar melhor. Dexter era o típico playboy das histórias de amor moderno, que pensa que o mundo será sempre uma eterna loja de doces, onde todas as guloseimas são permitidas.
Decidiram apenas colocar um pouco de areia na engrenagem dessa terrível máquina que produz seres normais e banais: todos os anos se encontrariam no dia 15 de julho para fazer o ponto de situação das suas vidas.

Ao longo de duas décadas Emma e Dexter seguem caminhos de vida diferentes, encontram novas pessoas, outros lugares, realizações profissionais diversas, mas todos os anos recuavam ao 15 de julho que os unira. Nesse dia conseguiam falar de si, das esperanças perdidas, das lágrimas e dos risos que nunca se apagaram da memória, das discussões que sempre tiveram…
Com o passar dos anos foram ganhando consciência que só eram verdadeiramente felizes no dia 15 de julho e que aquilo que procuraram por todo o lado e por todo o tempo sempre estivera ali, à espera que decidissem abrir o presente que o acaso lhes tinha deixado vinte anos antes.
Lembrei-me logo de Milan Kundera em “A insustentável Leveza do Ser”, quando explica que muitas das decisões mais importantes da nossa vida nascem a partir de um acaso qualquer sem importância aparente. Detestamos essa ideia e muitas vezes resistimos-lhe com toda a força que a lógica tem, mas, frequentemente, a leveza do seu peso é tão insustentável que acabámos por ceder.
Foi o que aconteceu com Emma e Dexter, todavia o destino resolveu mostrar outra das suas facetas mais conhecidas: a crueldade, e numa esquina de azar terminou com um amor que demorou vinte anos a arrancar.
UM DIA mostra toda a beleza e tragédia da vida: todas as vidas têm, pelo menos, um dia extraordinário e único: infelizmente muitos de nós demoram demasiado tempo a reparar nisso.
Gabriel Vilas Boas    

quinta-feira, 25 de junho de 2015

ALL YOU NEED IS LOVE, Beatles


Há quarenta e oito anos, a BBC pediu aos Beatles que escrevessem e interpretassem uma canção facilmente entendível pelo mundo e que ao mesmo tempo veiculasse uma mensagem forte e persuasiva.
Talvez inspirados por algo divino, Lennon e MacCartney escreveram uma das mais belas canções de sempre: ALL YOU NEED IS LOVE.
A simplicidade e beleza do tema fundem-se de um modo perfeito e natural, atraindo milhares de pessoas ao centro vital do ser humano: o Amor e a Paz.

Ao longo deste quase meio século, a música foi influenciando, divertindo, denunciando, expelindo emoções e pensamentos, mas o que sempre fez melhor do que qualquer outra arte foi espalhar Amor entre as pessoas.
All you need is love é daquelas canções que se impõe pela beleza sonora, mas sobretudo pela mensagem. Há cinquenta anos, o mundo vivia entre várias guerras regionais e mensagens como a desta canção penetravam com mais facilidade no coração e na alma das pessoas. Hoje, somos emocionalmente mais atentos, mas facilmente perdemos a esperança, nos milagres que o Amor opera. Sedentos dele, duvidamos da sua força e do seu triunfo. Exigimos-lhe que nos conquiste, que entre pela nossa porta e nos faça felizes em meia hora… ou então que não nos desinquiete com promessas vãs.

Talvez o segredo do Amor, que os Beatles proclamavam como a grande necessidade do ser humano, seja o de ser algo que se busca no nosso próprio interior. Algo que se dá antes de se pedir, que se partilha sem condição, como se fizesse parte do ADN da humanidade.
Ao longo dos anos fomos comercializando este verdadeiro elixir da vida, reduzindo o seu poder e magia. 
Ao ouvir esta belíssima canção dos Beatles que vos proponho hoje, vamos perceber que Amar é a nossa dádiva ao mundo. Só nós o podemos fazer! 
Faz-se da maneira mais simples ou do modo mais complexo, com magia ou ciência, com um sorriso ou através de uma dedicação incondicional. O Amor faz-se, constrói-se, cuida-se… porque provavelmente é a coisa de que mais precisamos para chegar à eternidade.
Gabriel Vilas Boas

terça-feira, 5 de maio de 2015

LEANDRO, O REI DA HELÍRIA


Hoje levei os meus alunos do 7.ºano a assistir à peça de Alice Vieira “Leandro, O Rei da Helíria”, levada à cena pela companhia Cultural Kids.
Trata-se de uma história simples e fascinante que nos permite refletir sobre o Amor, a Riqueza, a Ambição e o Poder.
Alice Vieira escreveu este texto dramático a partir de um conto popular de Teófilo Braga sem deixar de ter em conta, também, a imortal obra de Shakespeare, “Rei Lear” (uma tragédia em que se representa o enlouquecimento de um rei que legou, insensatamente, o seu reino a duas das três filhas.).
Na peça da escritora portuguesa, o velho rei da Helíria conta ao seu fiel bobo (que em toda a peça funciona muito mais como confidente e fiel amigo do que como bobo) o inquietante sonho que tivera e onde perdia coroa, trono e reino.

Incapaz de perceber quanto o sonho tinha de premonitório, Leandro assistiu à luta das duas filhas mais velhas pela sucessão do trono. E a sua cegueira de pai impossibilitou-o de ver a dissimulação, a perfídia, o casamento sem amor que cada uma procurava. Cego perante os defeitos de Amarílis e Hortênsia. Leandro também não soube entender o Amor que brotava do coração da mais nova, Violeta.
Um rei concentrado apenas na riqueza material e tangível é um rei perdido. Sem habilidade para decifrar sonhos, também não percebeu quanto Amor brotava da boca de Violeta quando esta lhe disse que “lhe queria tanto quanto a comida quero sal”. O amor está nas coisas pequenas e aparentemente insignificantes, mas o soberano nada percebia acerca do Amor e expulsou a filha, ao julgar-se desconsiderado por tal comparação.

Leandro atribuiu o seu reino a Amarílis e a Hortênsia, em partes iguais, e deu-se o esperado: em pouco tempo as amadas filhas e os ambiciosos genros mostraram quanto o desprezavam. Rapidamente passou de rei a mendigo, ficando apenas com o seu fiel bobo como amparo.
Helíria haveria de se consumir e desaparecer nesta luta fratricida e Leandro andou errando, cego, pelo mundo, até que o destino o levou ao reino de Violeta e Reginaldo, para aprender a mais importante e simples das lições: o Amor. Aquele que se encontra nas coisas pequenas, como o sal, aquele que perdoa sempre como Violeta, aquele que se torna coroa, trono e reino que todos querem (e podem) possuir.

A Cultural Kids fez uma encenação fiel ao texto e à mensagem, introduzindo alguns laivos de modernidade através da ligação, via Skype, a William Shakespeare, que interrompeu a peça algumas vezes, para deixar comentários certeiros, humorados e reveladores da conexão desta peça com a tragédia “Rei Lear”.

O trabalho dos atores Anabela Santos, André Louro, Bruno Martelo, Jorge Neto, Pedro Cardoso, Pessoa Júnior, Sofia Brito, Sónia Aragão e do encenador John Mowat mereceram o aplauso de toda a sala do Teatro Sá da Bandeira, hoje repleta de adolescentes, ávidos de ver as palavras ganharem vida, coração e alma, em palco.
Gabriel Vilas Boas