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segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

ESTRELA DA TARDE, de Ary dos Santos e Carlos do Carmo


Trinta e dois anos depois da sua morte, José Carlos Ary dos Santos continua vivo na memória do seu povo. A imortalidade conquistou-a em cada poema, em cada verso que generosamente escreveu para outros cantarem. Ary dos Santos foi o poeta abençoado que fez brilhar a voz de Fernando Tordo, Amália Rodrigues, Carlos do Carmo, Tonicha, Simone de Oliveira, Paulo de Carvalho entre tantos outros. Através da sua poesia alguns ganharam festivais da canção, muitos conquistaram notoriedade na música, quase todos experimentaram a terna melancolia do sentir português.

Hoje escolhi uma canção – ESTRELA DA TARDE – que Ary escreveu para um dos seus parceiros favoritos: Carlos do Carmo.
Neste poema/letra tudo é perfeito. A sonoridade melancólica dos versos, o ritmo – ora pausado ora acelerado -, a combinação entre versos longos e curtos e, sobretudo, a extraordinária beleza metafórica com que Ary trata o Amor. Personificando-o, dá-lhe uma humanidade divina.
Nesta canção/poema, Carlos do Carmo narra uma história de amor única, impossível e carnal ao mesmo tempo que canta os encantos da sua amada, comparando-a com a beleza de um final de tarde.

No poema de Ary dos Santos, o Amor ganha amplitude, verdade e beleza. Há a paixão dos amantes, a força e grandeza dos sentimentos, as incertezas e o medo, mas também uma fé no futuro: “Meu amor, nunca é tarde nem cedo para quem se quer tanto.” Como se aquele verso final fosse a conclusão feliz de uma batalha onde força opostas se digladiam:
“Meu, meu amor
Eu não tenho a certeza
Se tu és alegria ou se és tristeza”
Durante todo o poema/canção, Ary joga magistralmente com a palavra “tarde”. Era de “tarde” que os amantes se encontravam, a incerteza e a tristeza cresciam quando algum “tardava” e o ânimo “entardecia” na ausência do outro, mas o final traz a convicção de que “nunca é tarde” quando o Amor existe.

Se a “tarde” aparece associada aos encontros furtivos, à espera e à incerteza, a “noite” liga-se à paixão arrebatadora, onde o amor se consuma numa felicidade total, poderosa e definitiva.

“Foram noites e noites que numa só noite nos aconteceram (…)
Foi a noite em que os nossos corpos cansados não adormeceram
E da estrada mais linda da noite uma festa de fogo fizeram.”
Não deve ter sido por acaso que Ary dos Santos escolheu Carlos do Carmo para interpretar este poema. A voz melodiosa de Carlos do Carmo expressa perfeitamente a força da paixão de um amor transbordante em paralelo com a melancolia triste de quem receia que esse amor arrefeça e se perca.
O mais maravilhoso e inquietante desta canção é que continua a tocar o coração de diferentes gerações, mesmo depois das várias voltas que o planeta deu à desconcertante máquina humana.

Gabriel Vilas Boas



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