«Júlio César» é a primeira das tragédias
que Shakespeare escreveu inspiradas na história de Roma, baseando-se, sobretudo,
numa tradução de “Vidas Paralelas” de Plutarco.
No entanto, embora toda a obra gire em
torno do assassínio de Júlio César, pode considerar-se que é Bruto o verdadeiro
protagonista pela profundidade com que é feita o estudo do seu carácter.
Bruto, o grande amigo de César, é aquele
que o trai mais profundamente. Shakespeare coloca na sua obra todos os
elementos clássicos da tragédia: indícios, afunilamento da ação, concurso
negativo de determinadas circunstâncias, mas a verdade é que a morte de César
não ocorre por “culpa do destino”, mas por ação objetiva dos homens que
arquitetam um plano para matar Júlio César, dado que não podiam suportar todo o
seu poder e o amor que o povo lhe tinha. No fundo não conseguiam «encaixar» a
sua superioridade.
Bruto é o elemento central desta tragédia,
pois não tinha motivos para matar César nem o trair, até porque era
sincera a amizade entre ambos. Bruto acabou por ser traído pela sua vaidade, pelo
cerco de adulação que Cássio lhe monta. O trágico, que ao mesmo tempo funciona
como uma espécie de justiça poética, é que Bruto acaba por ser ultrapassado pelo hábil
Marco António, que lhe deu a beber o mesmo veneno que César tomara: a
ingenuidade perante os amigos.
Através de Bruto, o Judas de Roma,
Shakespeare talvez queira lembrar-nos que a vaidade é a maior tragédia humana.
Trata-se também de uma das obras do grande
poeta em que o seu estilo melhor mantém um tom constante de nobre
naturalidade, sem os contrastes habituais.
Na véspera dos idos de Março, Júlio César
entra triunfante em Roma (neste ponto Shakespeare comete mais um dos seus
famosos erros históricos) e no Senado é-lhe oferecida três vezes uma coroa, que
ele recusa três vezes.
Cássio convence Marco Bruto a entrar numa
conspiração que tem por finalidade derrubar Júlio César. Bruto, que tem por
César uma viva amizade, acredita que é preciso sacrificar essa amizade em
benefício do bem público de Roma e desse modo libertar a capital do império da crescente
tirania com que César governa.
Um adivinho previne César contra os
perigos que o ameaçam e até a sua mulher, Calpúrnia, o convence a permanecer em
casa em vez de se deslocar ao Senado, mas um dos conjurados (Décio) consegue
levá-lo e, então, antes de entrar no Capitólio, os traidores
abeiram-se de Júlio César, sob o pretexto de lhe apresentar uma petição, a qual
é negada, e, um após outro, cravam os seus punhais no peito de César, que morre
depois de reconhecer Bruto entre os seus assassinos.
Segue-se uma confusão geral e Marco
António, com hábeis palavras, consegue que Bruto lhe permita prestar honras
fúnebres ao cadáver. Bruto sobe à tribuna e explica ao povo os motivos do
assassínio; contudo, depois, Marco António, num habilíssimo discurso faz com
que o povo se revolta contra Cássio, Bruto e restantes conjurados de tal
maneira que estes têm de fugir de Roma.
Constituídos em triunvirato, Marcos
António e Otávio, marcham à frente de um poderoso exército ao encontro dos
republicanos que se haviam refugiado nas províncias gregas. Trava-se a batalha
na província de Filipos. Aí as forças de Cássio são derrotadas e este
suicida-se. Bruto consegue uma ligeira vantagem sobre Otávio, mas é vencido por
uma vez e também pede ao seu escravo que segure a espada enquanto ele se
precipita sobre a sua lâmina. António o Otávio honram as suas virtudes,
ordenando funerais dignos de um grande soldado.
Gabriel Vilas Boas
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