A cultura de um povo não é um bem
negociável, porque ela materializa e sintetiza a alma e a essência desse mesmo
povo.
Durante esta semana, o presidente
iraniano, Hassan Rouhami, visitou a Itália e o Vaticano, num périplo pela
europa. Quando visitou a pátria de Michelangelo, o presidente italiano, Matteo
Ranzi, “aceitou a sugestão” (como abomino os eufemismos da hipocrisia política)
do protocolo e mandou tapar algumas estátuas do Museu Capitolino, em Roma, dado
que estas exibiam a nudez, em sinal de respeito perante a cultura e
sensibilidade iranianas.
Na verdade, Ranzi não se deu ao respeito e envergonhou o povo que devia representar. Nem respeitou o presidente iraniano nem respeitou o cargo que exerce.
A cultura italiana é a herdeira natural da
cultura greco-latina que enche de orgulho a europa ocidental. O nu das
estátuas, pinturas ou esculturas vincou (vinca) a supremacia do estético e do
humanismo sobre a censura das diversas religiões.
Durante séculos, pensadores, filósofos e
artistas “explicaram” aos hipócritas guardiões de uma moral restritiva e
punitiva que a arte greco-latina precedeu o cristianismo ou o islamismo e por
isso delas não recebia ordens absurdas ou lições de comportamento.
Um artista provoca sentidos; representa o
mundo e o Homem e por isso não se submete. Ele sabe ser estético sem nunca
deixar de ser ético. Demorou vários séculos, mas a Igreja Católica acabou por
perceber o que era a Arte e que esta só podia funcionar num espaço de
liberdade.
Quem vive e aceita as sagradas regras da
liberdade, democracia e respeito entre os povos não pode censurar os outros,
mas também não pode censurar-se. Se Ranzi fosse a Teerão, jamais pensaria pedir ao
presidente Hassan Rouhami que permitisse ou obrigasse as mulheres iranianas a tirar a burka. Se o fizesse, estou certo que não só não alcançaria os seus intentos
como também veria a sua viagem ao Irão cancelada. E, a meu ver, com inteira
razão. Há pedidos que não se fazem, há sugestões que não se admitem.
O nu das quatro estátuas do museu romano é
icónico, obviamente, mas não irrelevante. Ele traduz a liberdade de uma cultura
e uma forma de pensar o mundo. Com a sua cobardia, Ranzi humilhou a Itália e a
cultura ocidental, pois não soube explicar ao seu homólogo iraniano a
humanidade e a beleza daquelas figuras nuas. Se Ranzi sente vergonha da
história, da cultura ou da arte italianas não devia ter levado ao museu
Capitolino o iraniano. Se este se incomoda assim tanto com o nu das estátuas
italianas, então, devia também recusar fotos ao lado da estátua equestre de
Marco António.
Não é assim que se estreita as relações
entre povos. O medo, a falsidade, a vergonha daquilo que fomos, somos e
representamos são péssimos atributos de um Presidente. Ranzi pode aproximar
governos, presidentes, interesses económicos posições diplomáticas, mas jamais
aproximará povos e culturas. Assim sendo, os seus esforços serão sempre
infrutíferos.
Como muito bem sentencia um ditado
popular: Quem perde a honra por causa de um negócio, perde o negócio e perde a
honra.
Gabriel Vilas Boas
Gabriel Vilas Boas
O OCIDENTE CIVILIZADO E TOLERANTE, A POR-SE DE COCORAS PERANTE OS REGIMES INTOLERANTES E OPRESSORES.
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