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domingo, 19 de fevereiro de 2017

O COMPRIMIDO DA ATENÇÃO

Embora muitos lhe chamem o “comprimido da inteligência”, eu prefiro designá-lo como “comprimido da atenção”. Diz o JN, hoje, que desde de 2010 tem aumentado brutalmente a medicação a alunos com perturbação de hiperatividade e défice de atenção (PHDA). A notícia refere que há turmas do ensino privado com 80% de alunos medicados. Nas escolas públicas também há cada vez mais problemas desses, mas a tipologia de alunos é diferente: crianças desatentas e problemáticas.
         Enquanto professor tenho notado o aumento deste problema e não vejo grande preocupação em atacá-lo convenientemente.
        


 Primeira questão: este não é um problema que só atinge alunos difíceis ou com dificuldades de aprendizagem. Os números referentes ao ensino privado indiciam que a questão é generalizada a muitos alunos.



Por que é que o problema tem vindo a aumentar?
A atenção dos alunos é hoje constantemente solicitada e a Escola é só mais um dos solicitadores. Grande parte do tempo em que uma criança está acordada é ocupada a responder a estímulos visuais e cognitivos. A ânsia de corresponder a todos estes estímulos, de abarcar toda essa informação (televisão, internet, smartphone, escola, pais, amigos…) torna-os tensos, irritados, hiperativos, desconcentrados.


É o estilo de vida em permanentes flashes e solicitações que lhes desarruma a mente. A concentração só pode descer! Não só na escola como também em casa ou com os amigos. A maneira como falham pequenos compromissos é mais recorrente do que seria desejável e não é apenas o TPC a pagar a fatura. Quando muitos deles dizem que se esqueceram, isso é dramaticamente verdadeiro.


Se repararmos numa criança que ocupa o seu tempo livre a praticar desporto, a tocar um instrumento ou a desenhar, veremos que ela se concentra com mais facilidade, anda mais relaxada e falha menos compromissos. Não é apenas uma questão de método, mas de não estar constantemente a massacrar a mente com solicitações de atenção até que ela se descontrola.


Por outro lado, o facto da metodologia vigente na Escola portuguesa ainda ser dos primórdios do século XX não ajuda nada. Aulas expositivas, dominadas pelo professor, exigem um poder de atenção/concentração altíssimo. Ora, o momento dos alunos neste item é deficitário.


Como resolver o problema? A maneira mais rápida é a pior: o comprimido. O comprimido não ataca as causas, cria habituação e não resolve nada de fundamental.
No meu entender, a solução está nos pais, nos alunos e nos professores. Concertando esforços, o problema diminui bastante. É preciso que pais e alunos organizem melhor o tempo fora da escola. Procurando atividades que deem prazer e não solicitem novamente a mente. Não será possível (nem desejável) acabar com o computador, o telemóvel ou a televisão, mas é possível fazer com que os jovens se interessem por outras atividades e diminuam por moto proprio o seu uso. A boa gestão do tempo de descanso mental é um fator essencial, até porque há outras partes do corpo que precisam de ação.

Por outro lado é preciso reciclar professores. Fazer com que percam o medo e abram mão do controlo das aulas. Simplificar currículos, reduzir turmas, reorganizar a geografia da sala de aula, promover uma abordagem mais prática e descontraída, nas aulas, mesmo em disciplinas teóricas - seriam passos para recuperar a atenção perdida. 
Gabriel Vilas Boas

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