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domingo, 12 de junho de 2016

O ZÉ PARVINHO

 Em 12 de Junho de 1875 Rafael Bordalo Pinheiro fazia nascer a figura do Zé Povinho para ilustrar como o governo português carregava o povo de impostos, deixando-o cada vez mais pobre.
A caricatura ganhou lastro social e Bordalo Pinheiro alargou o âmbito da sua crítica, apresentando Zé Povinho como uma figura resignada perante a corrupção e a injustiça, ignorante e obediente. Algumas décadas depois, Portugal mudou da monarquia para a república e pouco depois resignou-se à ditadura para acabar com a rebaldaria. No entanto, o Zé continuava parvinho e a caricatura de Bordalo Pinheiro, infelizmente, continuava a ter atualidade.
Em nome do Zé, um século depois do desenho de Rafael Bordalo Pinheiro, acabou-se com o Estado Novo que sempre cheirou a velho e restabeleceu-se a democracia.  Houve quem falasse em triplo D (Democratizar, Descolonizar e Desenvolver), mas ficámo-nos pelos dois mais fáceis e talvez por isso, a 12 de Junho de 1982, Portugal assinou o tratado de adesão à CEE. O Zé cantava, alegre, que queria ver Portugal na CEE… e viu! O Zé já não era inculto, o Zé já não era tolo, o Zé já nem era povo… era cidadão!

Agora já não havia rei, já não havia ditadura, agora é que era! Não foi! Ingénuo como sempre, o Zé continuou parvinho, agora enganado por outros Zés, que fizeram uma interpretação muito própria do verbo “desenvolver”: governar-se.

Mais uma vez ludibriado, mais uma vez gozado, o Zé passou a rir de si próprio, queixando-se de tudo, de todos e também da sorte, à boa maneira dos calimeros.

Passaram-se cento e quarenta anos e o Zé nunca deixou de ser parvinho, nunca deixou de ser povinho.
Não tem piada, não me apetece rir. São décadas e décadas a cometer os mesmos erros, a ver outros povos crescer, cair e tornar a erguer-se enquanto os portugueses continuam a contar piadas sobre o Zé, ou seja, sobre si.
Rafael Bordado Pinheiro criou uma caricatura para arrumar com uma realidade opressora. Está mais que na hora de acabar com a caricatura de povo que, muitas vezes, somos.
Tão fartinho de ser Zé… parvinho!


Gabriel Vilas Boas 

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