Uma escola de qualidade!
Ultimamente, este
argumento tem sido muito esgrimido pelos professores, pais, alunos e diretores
das escolas do ensino privado e cooperativo, para justificar a continuação da
subsidiação de várias turmas do ensino privado.
Mas o que é uma escola de qualidade? E quem deve ter
direito a ela? A resposta parece evidente: uma escola que faz crescer os
alunos, que os torna melhores. Essa escola deve estar ao dispor de todos.
Hoje queria recordar que nesses todos também cabem os
alunos com Necessidades Educativos Especiais. Talvez a designação seja um pouco
estranha para quem está um pouco desfasado dos assuntos relativos à Educação,
mas estes são aqueles alunos a quem é reconhecido um atraso mais ou menos
profundo no seu processo de desenvolvimento cognitivo, que os impede de acompanhar, no mínimo, o ritmo de aprendizagem dos restantes colegas. Depois de
um relatório psicológico e de outro de um pedopsiquiatra, uma comissão
especializada propõe o aluno para a Educação Especial, sendo definido um
Programa Educativo Individual, onde (conforme cada caso), são definidas várias
medidas, que podem ir de simples adequações curriculares e adequações ao processo de
avaliação até à definição de um currículo específico individual.
Em Portugal, há quase oitenta mil alunos com Necessidades
Educativas Especiais. Por estes dias, nas escolas públicas portuguesas (porque
nas privadas estes alunos são geralmente rejeitados), centenas de professores
reveem dezenas de milhares de processos, tentando, pelo menos, manter a maior
destes alunos dentro deste programa de assistência mínima.
O Ministério da Educação manda dizer que o número de alunos
tem de diminuir, que eles custam dinheiro, que uma escola com X alunos, não
pode ter mais de Y alunos com NEE, como se tal coisa fosse possível ver por
este prisma.
A verdade é que estes alunos estão muito mal apoiados nas
escolas portuguesas. Alguns agrupamentos com mais de 2000 alunos, onde 8% tem
NEE, dispõem apenas de um psicólogo e uma equipa de professores
especializados que não chega a dez elementos. No agrupamento onde dou aulas, o
rácio é 17 alunos por cada professor. Ora, estamos a falar de alunos que
precisam de um forte apoio individualizado, que têm carências cognitivas,
sociais, afetivas, médicas, psicológicas. Por vezes um único aluno “consome”
quase todo o horário de um professor.
Estamos a falar de gente que provém de
famílias pobres ou muito pobres. Para estes, o Estado oferece um professor
especializado, na maioria dos casos, duas horas por semana. No resto do tempo o
aluno vai às aulas, com os colegas da turma, mas pouco aprende pois
o desfasamento para os outros alunos é muitíssimo.
Sobra a enorme solidão dos
cantos da escola, a tristeza de um corpo a crescer num mundo que compreende
muito mal.
As direções das escolas, os professores de educação especial,
os pais destes 80 mil alunos lutam todos os anos pelo futuro pessoal e
educacional destas crianças, pedindo nada mais que as migalhas que possam cair do
orçamento do Ministério da Educação. Um Ministério da Educação que obriga
muitas destas crianças a fazer exames nacionais, que nega formação aos
professores, que retira docentes especializados a meio do ano letivo sem qualquer
explicação, que investe zero euros em recursos materiais e no fim diz-se defensor
de uma escola inclusiva. Claro que é inclusiva… eles vão à escola! E é tudo!
Uma escola inclusiva como o Ministério da Educação entende faz parte da lei
geral. O que eu queria era uma escola de qualidade para estas crianças, ou
seja, uma escola que lhes permitisse crescer a vários níveis.
Quando alguns professores, diretores de escola e pais falam
do direito a uma escola de qualidade, apetece-me perguntar-lhes quanto qualidade acrescentaram eles a este tipo
de alunos. Não têm vergonha de ficar com recursos que lhes deviam ser
destinados?
Gabriel
Vilas Boas
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