A ordem não tem rosto, mas é clara: os
médicos dos Centros de Saúde têm cinco minutos, em média, para atender cada
doente. Uma consulta completa em cinco minutos! Há que perceber o historial clínico
do paciente, ouvir as suas queixas, fazer-lhe perguntas, fazer um diagnóstico
rigoroso, preencher um formulário informático, prescrever-lhe uma receita,
explicar-lhe como, porquê e para quê são determinados remédios, assegurar-se
que o doente percebeu o que se pretende assim como da importância de cumprir
todas as orientações médicas.
Obviamente é impossível fazer isto em 300
segundos com a qualidade necessária que um ato médico requer. O diagnóstico
médico é um ato da maior importância para a saúde, para a vida das pessoas e
não pode ser feito a correr como quem despacha uma encomenda. O objetivo não é
fazer muitas consultas, mas fazê-las bem-feitas.
Reparemos que isto é o tempo médio que
cada utente dos Serviços de Saúde tem para ser atendido pelo seu médico de
família ou alguém que faça a sua vez. Se uma pessoa consultar o seu médico de
família três vezes ao ano (há muita gente que não necessita de tanto), tem
direito a um quarto de hora de médico por ano. Há pausas para um café que
demoram mais.
No entanto, o mais grave nem é a
desumanização, a falta de consideração e respeito com que os utentes são
tratados com uma medida como esta, que os põe ao nível de um embrulho nos
correios; o mais grave é a desqualificação do ato médico que perde
perigosamente qualidade. Como poderá um médico de família se responsabilizar
por um diagnóstico assertivo quando tem de o fazer debaixo desta coação administrativa? As probabilidades de erro aumentam bastante, além de todo o stress que esta
medida causa aos clínicos, enfermeiros e assistentes administrativos.
Bem sabemos que faltam médicos de família,
bem sabemos que há médicos com mais de dois mil pacientes, mas o problema não se resolve desta maneira. Por muito que os problemas das pessoas que se dirigem
aos Centros de Saúde possam parecer corriqueiros e repetitivos, há sempre casos
complexos, que exigem ponderação, tempo, mais perguntas, até uma conferência de
clínicos. Para usar mais tempo com estes casos e cumprir o diagnóstico em cinco
minutos, os médicos têm, forçosamente, de retirar tempo às outras consultas que
assim descem para 3/4 minutos por doente.
Nem todos os diagnósticos são “Chapa 5" nem os doentes vão à consulta sempre com as mesmas queixas. Com a saúde
não podemos brincar à estatística nem devemos levar os médicos à exaustão
psicológica, pois o perigo de diagnósticos errados é altíssimo.
Esta é uma ordem perigosa, que achincalha
utentes e profissionais de saúde, como se estes fossem uns pastelões que
arrastam consultas e aqueles uns inconscientes que recorrem aos serviços de um médico
de família por tudo e por nada. Os médicos merecem mais respeito, a população
merece mais consideração e quem ordenou tal orientação devia ter um pouco mais
de bom senso.
Gabriel Vilas Boas
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