A Igreja esteve, está e estará ligada ao
ensino. Provavelmente é a instituição que mais contribui para a evolução do
ensino, não só em Portugal como um pouco por todo o mundo. Milhões de pessoas
devem a sua instrução e a sua evolução cultural e profissional a escolas
católicas.
Aquilo que a Igreja fez pelo ensino e pela
cultura portuguesas é de uma importância inegável e a sociedade deve estar-lhe
grata por isso, pois em muitos casos milhares de pessoas carenciadas puderam
estudar através do projeto social da Igreja, na vertente ensino. No entanto, é
preciso que fique claro que a Igreja não só deu muito como também recebeu
muito. A facilidade com que as escolas privadas ligadas à Igreja sempre acederam
ao financiamento público foi quase sempre maior do que a generalidade dos
outros colégios privados; a Igreja Católica, através da Concordata e da posição
privilegiada dentro da sociedade portuguesa, beneficiou de isenções fiscais e
outras ajudas monetárias avultadas que lhe permitiram uma maior desafogo
económico na hora de contratar pessoal, reformular colégios, aguentar épocas de
crise económica e social, em que as famílias não podiam manter os filhos nos
seus colégios.
É verdade que a Igreja sempre procurou ter
em atenção os casos dos alunos mais carenciados, isentando-os, formal ou
informalmente, das respetivas propinas. Mas fê-lo sempre com filantropia? Creio
que não! Esses alunos foram também um excelente cartão publicitário da ação
social da Igreja e um excelente argumento para negociar com o governo boas
condições nos contratos de associação. Nos colégios privados abriram cursos
únicos em determinadas cidades, o que não foi permitido a mais nenhuma escola
privada ou pública. Nesse ponto a Igreja não podem nem deve fazer o papel de
coitadinha nem de bom samaritano, pois não ficou a perder na relação económica
com o Estado.
No entanto, no meu entender, à Igreja
exige-se mais. O objetivo da Igreja não pode ser ter colégios ricos, não pode
ser fazer dinheiro. Todo o dinheiro que a Igreja receba através dos seus
colégios deve ser canalizado para permitir o acesso a esses mesmos colégios de
gente carenciada e que não consegue aceder a determinados cursos no ensino
público, porque não os tem perto de casa ou tendo-os, as vagas estão totalmente
preenchidas.
Os colégios católicos deviam orgulhar-se
de duas coisas que esqueceram: não ter efetivamente lucro e ter um número considerável
de turmas com alunos carenciados (e não facilmente carenciados), houvesse ou
não contratos de associação, porque isto de fazer flores com a carteira dos
outros é de uma grande hipocrisia.
Gostaria ainda de fazer notar que a Igreja
Católica tem outras fontes de financiamento que pode usar no ensino, que
ninguém a criticaria por isso. Os donativos e esmolas dos seus fiéis. Em vez de
investir na bolsa, em vez de investir no mercado imobiliário como qualquer
Banco Espírito Santo, como ao que parece fez a falida diocese do Porto, devia
investir na educação dos mais pobres do país.
Como reagiriam os fiéis se soubesse que a diocese
do Porto andou a investir na compra e venda de casas e deu-se mal, em vez de
investir nos seus colégios privados, e agora anda a choramingar uns milhões de
euros ao governo, usando os seus alunos mais pobres para fazer chantagem
emocional? Acho que todos nós, cristãos com sentido de justiça, não deixaríamos
de nos sentir envergonhados, pelas más ações de quem dirige a Igreja
portuguesa, que também é quem superintende os colégios católicos.
A Igreja tem direito reclamar a ajuda estatal
para os seus colégios? Tem, mas devia ser a última a fazê-lo, até porque não
tem sido um exemplo na gestão do dinheiro que tanta gente necessitada lhe
confia.
Gabriel Vilas Boas
Sem comentários:
Enviar um comentário