Em Portugal fala-se de mais e faz-se de
menos. Constantemente ouvimos falar em reformas estruturais (já sabemos que
isto quer dizer demissão das funções sociais do Estado), que o país tem de
fazer isto e aquilo (como se o país não fossemos todos nós e o governo não
tivesse o direito e o dever de assumir a iniciativa), que é preciso ir contra
os interesses instalados (quando o governo propôs cortar os subsídios dos
colégios dos meninos, ai que isso não pode ser, que é uma grande injustiça, uma
grande maldade), que é preciso tomar medidas que auxiliem as famílias, que
necessitamos de incentivar a natalidade (mas quando alguém quer aumentar um
euro por dia ao ordenado mínimo, isso é que não pode ser nada, porque o país
não aguenta. Basicamente o país não aguenta um aumento que pague as fraldas
mensais de um recém-nascido, mas aguenta três banco falidos em cinco anos)…
Na
verdade, ano após ano assistimos a um discurso social hipócrita. Quem tem
filhos sabe, há muito tempo, do que a casa gasta, mas revolve-me sempre os
fígados estas falinhas mansas de gente que não se vê ao espelho.
Ideias não faltam e algumas muito válidas.
Recentemente, a Ordem dos Médicos fez uma proposta muito interessante: reduzir
o horário laboral de um dos pais até que o seu filho faça três anos. Vieira da
Silva, ministro do Trabalho, disse hoje que estava disponível para discutir o
assunto, mas que tínhamos de ir com calma
(maneira educada de dizer “para já não!”), que o assunto era para ser discutido
em concertação social (Até ele já está a ver a posição dos patrões: “Somos
favoráveis a todas as medidas pró família desde que não paguemos um cêntimo.”
), que temos de saber que isto custa dinheiro, blá, blá, blá…
Tudo custa dinheiro! Até o blá, blá, blá
de um ministro. A política é fazer opções. O governo não está a tentar cumprir
a sua promessa de repor as 35 horas na função pública e não tem dinheiro para a
festa? Então que ganhe coragem e assuma uma opção pró família e comece a implementar esse horário com os pais e as mães.
Obviamente, teremos logo a conversa de
que o setor privado não pode cumprir, que não tem condições económicas para uma
medida tal, que… Há mais de três décadas que já sabemos que o setor privado não
tem condições para aumentar o preço de um café por dia ao ordenado dos seus
trabalhadores. A conversa é sempre a mesma.
Esta proposta da Ordem dos Médicos é boa.
É socialmente justa, económica viável e traz enormes benefícios socais. Já
pensaram quanto poupariam as famílias em ATL´s, em correrias, em discussões
extenuantes, se a mãe ou o pai pudesse sair todos os dias às 17 horas do seu
emprego? Já notaram quanto mais felizes e bem-dispostas andavam milhões de
pessoas em Portugal? Isso não seria excelente para o país sobre todas as
perspetivas? Será que isso custa assim tanto dinheiro? Ou estamos antes a falar
de egoísmo?
E já não estou a pensar naqueles patrões
que mal vissem a medida aprovada, aproveitariam para constranger as pobres
mães, torcendo o nariz a promoções, colocando-as na primeira linha de possíveis
despedimentos, ignorando a lei com o maior descaramento.
Em Portugal, demora-se demasiado tempo a
aceitar as coisas mais óbvias, especialmente quando, por acaso, elas beneficiam
primeiro o vizinho.
GAVB
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