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quarta-feira, 1 de outubro de 2014

DA ARTE, DA PINTURA, DE MÁRIO CESARINY


"É preciso dizer PARA SEMPRE em vez de dizer AGORA"

Mário Cesariny

Sem título, acrílico sobre platex,1969
Mário Cesariny, nome grande do Surrealismo português, haveria de nascer em Lisboa a 9 de agosto de 1923, cidade onde a Morte também o procurou a 26 de novembro de 2006. Privados assim que fomos da sua presença física, a sua obra continua a falar por si de forma poética e ao mesmo tempo revolucionária, como também o foi o próprio movimento surrealista que ele abraçou.


Sala de Exposições Temporárias
Exposição Mário Cesariny, 2014
Cursa apenas o primeiro ano de Arquitetura na Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa e é a partir de 1942 que produz as suas primeiras obras. É também desta altura a sua aproximação pouco duradoura ao Neo-Realismo.
Em 1947, enceta viagem a Paris para estudar na Academia de La Grande Chaumiére, altura em que o Surrealismo se reorganizava naquela cidade, o que lhe permite, absolument pas par hasard, o encontro com André Breton, Victor Brauner e Henri Pastoureau, nomes charneira do Surrealismo francês.
Em 1948, cria o grupo “Os Surrealistas” de Lisboa, onde, para além de Mário Cesariny, figuram nomes como o de António Maria Lisboa, Cruzeiro Seixas, Henrique Risques Pereira e Pedro Oom, entre outros.
A primeira exposição do grupo “Os Surrealistas”,  acontece em 1949,na Sala de Projeções da Pathé-Baby, Lisboa, e a sua primeira exposição individual ocorre na casa de Herberto de Aguiar, no Porto, em 1951,ano a partir do qual se destaca e distingue como criador de uma das obras literárias mais complexas do seu tempo. Mais tarde, aproxima-se de Pascoaes e da sua obra, num abandono de Pessoa, e Amarante passa a ser o espaço incontornável de encontro com a família do Poeta amarantino.
Desde 27 de setembro que o MMASC tem patente na sua Sala de Exposições Temporárias boa parte da obra de Cesariny, que eu vos convido hoje a visitar. Amarante é sem dúvida o local de eleição para mais uma Exposição do artista, porque Amarante foi sempre para ele um espaço de afeição. Convidado assíduo da Casa de Pascoaes, amigo de João e Amélia Vasconcelos, com eles se correspondeu sempre e, por isso mesmo, não resisto hoje a transcrever um excerto de uma das suas epístolas, (onde fala do seu arrebatamento súbito pelo noir-blanc ), extraída da edição de António Cândido Franco, publicada pela Documenta, Fundação Cupertino de Miranda:
Mário Cesariny e João Vasconcelos, Capa do Livro editado pela Documenta
Fundação Cupertino de Miranda
“…há mais ou menos seis anos, dando-me o desgosto da cor, fiz uma série noir-blanc. Pareceu-me e parece-me ainda, que o trabalho mais desvelado do pintor é fazer com que as cores não pareçam o que realmente são (tintas, drogaria). Todo o quadro que não pareça uma drogaria é já, só por isso, uma obra- prima.(…) Estou disposto a continuar, essa série, agora em acrílico. (Continuo a não querer o óleo, matéria sobremodo capitalista de tempo e de dinheiro, duas categorias da morte).
(Um quadro eterno! Diga-me se haverá propósito mais fútil-e mais horrendo? O acrílico, dizia, material que promete deteriorar-se mais naturalmente. Mas gostava de ter alguma companhia, a sua. Lembremos:
“a luz(é cada vez) mais clara
A treva(cada vez)mais negra”
Abraça-o o Cesariny
(E porque não, se houvesse, fazermos depois uma exposição de homenagem a Teixeira de Pascoaes?!!!)
Um abraço para a Maria Amélia e a todos vós."

De Cesariny, sabemos que foi sobretudo Surrealista. Este movimento literário e artístico envolveu não só a pintura, mas também a escultura, a fotografia e o cinema, vindo até a influenciar a moda e a publicidade. Pensado e estruturado entre as duas Grandes Guerras do séc. XX, é André Breton que lhe dá corpo, através do Manifesto escrito em 1924.
Como reação ao absurdo que foi a Primeira Guerra e ao caos que se lhe seguiu, renegam toda a cultura europeia, contestando a ordem política, social e cultural estabelecida. Buscam temáticas oníricas e fantasiosas, a subversão do real através de um processo criativo semiconsciente e dominado por automatismos psíquicos .Em suma, desmistificar e subverter a realidade atingindo assim o surreal.
E como tão bem disse António Cardoso, ”O Surrealismo e as suas poéticas supõem, afinal, a herança freudiana, com a ênfase do irracional, a implícita sexualidade ou as “questões de género”, a liberdade como ética, o humor e a ambiguidade, as técnicas instrumentais (automatismos, colagens, o “cadavre exquis”), com diversos autores ou participantes, entre o jogo verbal e o da imagem.”
Partam então à descoberta deste movimento artístico internacional e igualmente tão português. É já ali, a um passo de boa vontade, no nosso Museu Amadeo de Souza-Cardoso.
Entretanto, espreitem o documentário Autografia, sobre Cesariny, muito bem conseguido por Miguel Gonçalves Mendes. Aqui, o artista lembra o poeta que havia afirmado que só havia três maneiras de se viver neste mundo: ou bêbado, ou apaixonado ou poeta. E remata: “Isto é muito lindo.” Pois é! então, encantem-se.
Rosa Maria Alves da Fonseca


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