Há mais de um século nasceu a República. Quem a implementou tinha o sonho de criar um Portugal mais justo, mais desenvolvido e moderno, que pudesse acompanhar a evolução das nações europeias.
Os portugueses aceitaram pôr fim à monarquia, não porque detestassem o seu Rei, mas porque concluíram que este já não faziam parte da solução, mas sim do problema. Os impostos sufocavam os portugueses, o país pulava de empréstimo em empréstimo, afundando-se em dívidas. O povo não tinha saúde pública, era analfabeto e vivia agarrado à mentalidade eclesiástica do medo.
A República foi uma espécie de tsunami ideológico que sacudiu o país. Com a constituição de 1911, os poderes ficaram definitivamente tripartidos e independentes entre si. As pessoas passaram efetivamente todas a ser iguais perante a lei, destruindo-se os privilégios de nascimento. Qualquer cidadão podia agora aspirar ao mais alto cargo da nação. No entanto, foi na educação e na relação com a Igreja que a República deixou a sua marca e marcou uma evolução do nosso país. Ao consagrar a liberdade de culto, a República fez de Portugal um país sem religião oficial e por isso não faziam sentido os privilégios da Igreja Católica. Igreja e Estado passavam a seguir caminhos separados. O Estado português passava ser laico.
Sou católico convicto e sempre achei bem esta medida republicana. A Igreja não teve uma génese de privilégio e o seu foco sempre devia ter sido o mundo espiritual. A República não impediu o culto cristão católico, apenas o retirou da esfera do Estado, pois não cabe ao Estado regular a relação do indivíduo com o transcendente. No entanto, acho um abuso sem justificação a expulsão das ordens religiosas e a nacionalização de muitos bens da Igreja. Não se derruba uma injustiça com outra injustiça. Se aqueles bens eram ilegítimos, ilegítimo foi nacionalizá-los.
Todavia, a República trouxe muitas outras mudanças positivas ao país. Obrigou as pessoas a registarem-se civilmente, controlando, finalmente, nascimentos, óbitos, casamentos. Permitiu o divórcio, promoveu a igualdade entre filhos legítimos e ilegítimos (Como diria o Papa Francisco, “não há mães e mães solteiras, há Mães”), protegeu e dignificou a condição da mulher, instituiu o descanso semanal, reduziu o horário de trabalho para 48 horas, criou o direito à greve, criou os seguros contra acidentes de trabalho e instituiu o direito à assistência, ou seja, a proteção na velhice e na doença.
Já imaginaram o que seria dum país sem estes direitos básicos? No entanto eles começam a ficar ameaçados, isto é, os fundamentos da República estão em causa.
No entanto, para mim, o grande salto que a República proporcionou à nossa nação foi tornar o ensino primário obrigatório e gratuito. Na altura 70% dos portugueses eram analfabetos, hoje o valor não chega a 7%, o que constituiu uma grande vitória republicana.
Talvez por isso, os professores tenham escolhido este como o seu dia. E fizeram bem. Os professores são um pilar fundamental na Educação de qualquer povo. A Educação dos portugueses nos últimos cem anos deve muito à República.
Passados mais de cem anos desses tempos de esperança e mudança, a República é uma triste caricatura do que quis ser. O país afunda-se em dívidas e os portugueses em impostos, as figuras principais do regime não são parte da solução, mas uma grande parte do “problema” e a Educação gratuita e universal nunca esteve tão em perigo como hoje. Ser professor em 2014 não é um orgulho, uma missão. Quem nos dirige humilha os professores, descredibiliza o bem mais precioso da República.
Como podem os professores ensinar valores como a liberdade, a dignidade, a igualdade, o respeito pela diferença, quando sentem a injustiça com que são tratados?
Muitos milhares de colegas manifestaram-se, hoje, em Lisboa, pela dignificação duma profissão tão relevante em qualquer país. Na sua voz, na sua generosa força de vontade, transportaram a alma dum povo que não quer morrer lentamente. A poucos metros deles, no salão nobre e climatizado da Câmara Municipal de Lisboa, o Presidente Cavaco Silva disse sem rir nem reparar no ridículo: “É urgente uma reflexão séria sobre o regime político português.”, “É preciso entendimentos partidários de curto e médio prazo”.
Ora, entendimentos partidários são o que mais tem havido e, ao que parece, eles apenas pioraram a situação do país, em vez de a melhorar. O que os portugueses desejam não é mais uma reflexão, mas de ação. Uma ação determinada, justa e que vá de encontro aos ideais republicanos que os nossos queridos partidos se têm encarregado de matar lentamente.
Hoje já nem um feriado a implementação da República merece. E nós, continuamos a merecer a República?
Deixo-vos com um tema recente de Pedro Abrunhosa que ilustra a mensagem final que vos quero deixar.
GAVB
A proliferação dos professores, muitos com formações retrogradas baseadas num ensino sem enquadramento na realidade, preocupa-me o facto de não haver uma permanente "reciclagem" e atualização numa profissão onde se assenta toda uma sociedade.É certo que as condições também tem que ser dadas como em qualquer profissão (infelizmente a sociedade dá prioridade aos midia, acima até dos políticos, onde os directores e mesmo os apresentadores usufruem de salários milionários). Estará a nossa sociedade no caminho de uma cidadania?!...
ResponderEliminarDeveria existir mais equidade nas profissões e princípios éticos. Toda a história deveria estar assente no caminho de uma cidadania onde a humanização da nossa sociedade seria uma prioridade. Dentro desta profissão de docente está-se em posições dispares mesmo entre colegas. Posturas de "poder" de "bajulice" cada vez se instalam mais, esquecendo os valores éticos. Quantos Professores de grande valor andam "reduzidos" à proliferação de muitos que utilizam os locais de ensino para buscar o salário e nada mais. É importante separar o trigo do joio.
ResponderEliminar"É alguém capaz de indicar um benefício, por leve que seja, que nos tenha advindo da proclamação da República? Não melhorámos em administração financeira , não melhorámos em administração geral, não temos mais paz, não temos sequer mais liberdade. Na Monarquia era possível insultar por escrito impresso o Rei; na República não era possível, porque era perigoso insultar até verbalmente o Sr. Afonso Costa." - Fernando Pessoa
ResponderEliminarA titulo de exemplo a 1 lei de ensino obrigatório é da monarquia e só a passou a ser uma realidade concreta em ditadura, assim como quase todas as utopias da 1 republica.
http://diariodigital.sapo.pt/news.asp?id_news=384116