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terça-feira, 8 de julho de 2014

O MISANTROPO, de MOLIÈRE



   Molière é dos dramaturgos mais famosos de todos os tempos. O escritor francês viveu no século XVII e conviveu com toda a frivolidade cortesã da corte de Luís XIV, sendo, por isso, um atento observador dos defeitos morais da sociedade francesa do seu tempo. Captou-lhe os tiques, as fraquezas morais, as modas da classe dirigente, a entourage que vivia à sua custa.As suas peças são maioritariamente comédias satíricas que visam de modo direto os costumes sociais, por vezes, muito censuráveis.

   Hoje falo-vos do MISANTROPO. Esta peça foi escrita no curioso ano de 1666 e parodia um homem assumidamente anti-social que recusa todas as regras e convenções da sociedade em que vive e não considera ninguém suficientemente digno de se lhe comparar. 
   Esse homem é Alceste, o misantropo, que odeia o falso honnête-homme e todas as hipocrisias que rodeiam a corte. Molière, como a maioria dos escritores da época, frequentava a corte e por isso sabia bem do que falava.
   O que prende leitor e espetador é a ironia que perpassa a vida do misantropo. Alceste, o homem que se autoexclui da sociedade porque se revolta contra a hipocrisia da maioria das relações sociais acaba por se apaixonar por uma viúva jovem vaidosa e deslumbrada, que tem o comportamento exatamente oposto ao dele. Não há nada em comum entre eles.


   O embate de Alceste com sua amada Célimène é contado em cinco atos, com uma homogeneidade perfeita em versos de rimas ricas. 
   Alceste é obrigado a frequentar a corte que tão abominava, por amor de Célimène e isso torna-o um ser melancólico e enfastiado com a hipocrisia reinante na corte de Luís XIV. 
   Alceste vive duplamente angustiado: com a personalidade da mulher que ama e com ele, por não se sentir corrompido por um modelo social que detesta, mas que o envolve. 

  Além do drama de Alceste e da irónica lição de moral que Molière prega ao seu excesso e rígido moralismo, a comédia O MISANTROPO concentra-se em fotografar a alta burguesia, a nobreza e a realeza do século XVII, através de um retrato claramente exagerado. Aliás, a única maneira de criticar algo ou alguém na altura seria exagerar determinadas características para não ofender directamente os visados.

    Philinte, amigo de Alceste, tenta constantemente chamá-lo à conveniente razão e tenta fazer com que o amigo veja que é necessário, muitas vezes, ceder ao cinismo e à hipocrisia para alcançar a paz e o sucesso social. É necessário usar máscaras para nos integrarmos. 

    No entanto, Alceste não atende às razões do amigo. Ele continua a pugnar por um mundo ideal. Jamais aceita que a vida em sociedade exige uma série de relações convencionais e superficiais. É impossível tornar amizades de dois dias em amizades de dois anos; é inviável pensar que todos têm as melhores intenções a nosso respeito, especialmente quando aceitamos como humanos certos defeitos morais como a inveja, o orgulho, a vaidade ou a arrogância. Para viver em sociedade, torna-se, então, imperioso fingir, ou seja, ser hipócrita.
 


   A comédia satírica de Molière aborda ainda outros motivos através das diversas personagens que compõem o enredo. Temos um cortesão com pretensões a literato, evocando o cómico e o ridículo (Oronte), uma "coquette" (Célimène), uma rapariga estranhamente sincera considerando o meio em que se insere (Éliante), uma falsa puritana (Arsinoé) e mais algumas personagens sem grande relevância mas que provocam umas quantas gargalhadas. 
   Como resolve Molière o drama de Alceste? Inovando! A inovação de Molière em O Misantropo é a introdução de uma carta que vai desmascarar Célimène e que vai pôr em evidência um dos ensinamentos daquele século: as confidências são perigosas e para estarmos bem com todos é necessário ser dotado duma grande “qualidade” social: a hipocrisia.

Gabriel Vilas Boas

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