Há cerca de 25 anos
Portugal estava completamente apaixonado por mais um professor de economia e
finanças (o mesmo que hoje aguarda pacientemente que se cumpram os prazos
legalmente estabelecidos para entrar num asilo de verdade) e poucos se lembravam
que, seis antes, um governo de salvação nacional e verdadeiros amigos alemães
nos tinham salvado da bancarrota.
Era tempo de esquecer
tristezas porque fundos a perder de vista iam entrar pelos gabinetes
ministeriais e, excetuando o “Independente” de Paulo Portas, não havia ninguém
para escrutinar tão avultadas transações.
Cavaco declarara, à
professor, “P'ró betão e p'ró alcatrão e em força”. Ferreira do Amaral
plantou-lhe IP’s, A1, A2 e A3, que havíamos de pagar; Leonor Beleza pediu
hospitais; Álvaro Barreto mandava plantar e desplantar, mas os agricultores
colhiam sempre o mesmo: subsídios e jipes.
Alguém lembrou o óbvio: “Quem
seriam os intermediários para tanto negócio a fazer?”. Os bancos, claro está! Outro alguém, advertiu: “Mas tem de ser alguém da nossa confiança!” e logo o avisado acrescentou: “… e da deles, porque
isto vira de vez em quando!”
Então, Oliveira e Costa
saiu do governo e foi para o BPN emprestar dinheiro e comprar cumplicidades ao
bloco central dos interesses; o BES expandiu a sua rede tentacular de negócios
e reabilitou aquele partido que Cavaco quase destruíra; enquanto isso, o BCP
aproveitava a recompra, sem concorrência, do Totta aos espanhóis, para lançar
uma OPA hostil ao BPA. Cavaco lá teve de se antecipar a Guterres e informar os
ex-amigos que “Era a vida. Eles
também têm de ter o banco deles”. E
tiveram.
A grande corrida ia
começar e todos estavam a postos e nos seus lugares: a Caixa fazia de velho
patriarca familiar e dava respeitabilidade ao sistema; BES, BCP e BPN (o arco
do poder) eram os filhos, ávidos de poder e dinheiro que fariam de tudo para
ficar com a melhor parte da fortuna do pai: privatizações da PT, GALP e EDP…
Havia ainda um tio velho e rezingão que só se queria vingar da esquerda de abril
e logo que pôde espetou a faca a Guterres ao trocar o império Champalimaud por
ações do Santander; e também um sobrinho desalinhado (BPI) a quem foi permitido
jogar o jogo da fortuna, mas apenas no papel de ator secundário.
Seguiram-se consultadorias
financeiras em barda e generosamente pagas, privatizações em fatias sucessivas
e cada vez mais calóricas. Os bancos prosperavam, incorporavam ex-governantes
e emprestavam dinheiro que iam buscar a 1% ou 2% para satisfazer os caprichos
infantis de governantes falhos de ideias de desenvolvimento.
O povo achava ótimo.
Emprestavam-lhe dinheiro para a casa, para o carro e para as férias, bem acima
das garantias dadas.
Ninguém lhe disse que a
bolha havia de rebentar na América e atravessar o Atlântico. O Paulinho deixara
de ser “Independente” e quis ser Popular… nas feiras, no partido e no governo.
Guterres já se tinha
sentido enojado com o mau cheiro do pântano e refugiara-se tão longe que poucos
sabem onde, mas ainda havia alguém para vender banha da cobra por ouro de
primeiro quilate. Um verdadeiro animal político, dizia-se… Dos bancos ainda lhe
gritaram, desesperados, que era preciso responsabilidade porque o “muro” era já
ali.
O Banco de Portugal sabia
que os bancos só tinham papéis sem valor e que só o nome do país garantia
empréstimo para pagar empréstimo, sempre a juros mais elevados. Mas ninguém
queria mudar de vida. As administrações dos bancos cometiam erros de gestão
absurdos de tão dependentes que estavam do poder político.
Montavam-se complexos
esquemas para embelezar as feias contas públicas e privadas até que chegou à Europa
o pus da bolha gigante que a administração Bush deixou rebentar em Nova Iorque.
Nem para maquilhagem havia dinheiro.
Os ratos fugiram para
Bruxelas e teve de ser uma senhora, armada em sopeira, a impor a dieta a colher
de pau. Como tinha mais que fazer deixou cá dois ajudantes de cozinha para
controlar a dose do paciente, mas um não sabia os passos que havia que dar e
outro era tão inseguro que até da sombra tinha medo.
Aos bancos disseram para
arrumar aquela papelada tóxica no lixo da Mody’s, mas eles não quiseram sujar
as mãos e tivemos de ser nós a reciclar o material mais perigoso. Ao que parece
há mais lixo no pântano de Guterres, mas acho que toda a gente já reciclou o
que tinha a reciclar.
Gabriel Vilas Boas.
Excelente post!
ResponderEliminarObrigado, Anabela Magalhães.
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