A frase de Dostoiévsky lembrou-me o medo que a liberdade causa. Aquela coisa de já não termos mais desculpa para o falhanço ou para a imperfeição.
«O
que te impede?» Quantos já ouviram esta frase fria de um
amigo, como resposta ao seu costumeiro rol de queixas e queixinhas? Na verdade, nada!
Ser livre implica decidir e decidir é arrostar com as
consequências. Impossível saber o resultado antecipadamente, impossível contar
só com vitórias, impossível garantir que não perderemos nada de essencial.
É por isso também que as gaiolas são confortáveis. O templo
do previsível e... do tédio. Nelas habitam as certezas, mas as certezas dos
outros; nelas há conforto, mas o conforto dos escravos.
Não é possível ninguém conhecer o mundo nem a si próprio
dentro de uma gaiola, por mais dourada que ela seja. A maioria das gaiolas onde
habita gente tem a chave por dentro ou a porta semiaberta, mas poucas vezes
nela entra luz. Por que será?
Sophia de Mello Breyner, no conto A Saga refere que Sören “impunha a si e aos outros uma disciplina de responsabilidade e de escolha dentro da qual cada um ficava terrivelmente livre”.
Escolha e responsabilidade! Não sorte nem azar, muito menos
destino ou circunstância. E nada de confundir “responsabilidade” com conveniência
ou medo, porque isso é só mais uma maneira de alijar responsabilidades.
E se a cobardia algum dia nos atirou para a escravidão, não
condicionemos a liberdade dos outros. Deixemo-los escolher, decidir, partir…
sem certezas, porque, afinal, as certezas moram nas gaiolas e lá todo o canto é
triste.
GAVB
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