«O Estado
Sou eu» - esta frase do rei sol francês, Luís XIV, parecendo desmesurada à
primeira vista, exprimia de certa maneira as relações sociais na era do
absolutismo. Ao contrário da Idade Média, o monarca era soberano absoluto, com
poderes ilimitados: nem integrado numa estrutura de poderosos suseranos feudais
nem dependente da cooperação ou concordância de coorporações políticas
autónomas. À volta da sua pessoa, o rei reunia milhares de nobres e seguidores
e recebia diariamente centenas de membros da nobreza que prendia a si pela
atribuição de cargos e honrarias.
Para
esta corte, tornava-se necessário um enquadramento adequado e representativo.
Luís XIV, que foi rei aos cinco anos de idade e aos vinte e três tomou efetivamente
nas mãos o comando do seu país, decidiu-se pela ampliação de Versalhes. Para
ele o palacete de caça mandado construir por Luís XIII num terreno pantanoso,
às portas de Paris, estava ligado a memórias felizes de infância. Arquitetos inspirados
como Louis Le Vau, Jules Hardouin-Mansart e Robert de Cotte, o genial arquiteto
paisagista André le Nôtre e mais de vinte mil trabalhadores reuniram os seus
esforços numa tarefa gigantesca: a criação de um conjunto arquitetónico formado
por um palácio e um parque que se converteu no modelo dos palácios
residenciais em toda a europa. As obras de construção alongaram-se por quase cinquenta
anos: quando Luís XIV pôde entrar pela primeira vez na igreja do palácio já ia
nos 72 anos de idade.
Foi só
durante uma boa centena de anos que Versalhes serviu de residência aos reis de
França: de 1682 até à revolução francesa em 1789. O sucessor de Luís XIV mandou
instalar algumas dependências privadas, construir um palacete ao lado do Grande
Trianon e, além disso, ampliar as zonas ajardinadas.
Luís
XVI introduziu apenas pequenas alterações no edifício principal, mas para a sua
esposa, Maria Antonieta, criou um jardim que incluía uma edílica aldeia artificial
com quinta, vacaria, moinho e pombal.
No
essencial, o conjunto arquitetónico de Versalhes apresenta-se até hoje como uma
imponente geometria do poder. Largas avenidas conduzem ao edifício principal,
situado num plano mais elevado: uma estrutura simétrica, composta por tês alas,
com três pátios escalonados que foi copiada em numerosos palácio barrocos –
especialmente nos liliputianos principados alemães – numa escala infinitamente
menor da fachada traseira, o olhar abre-se sobre o parque, com os seus canais,
terraços e fontes artificiais e cria um enquadramento sumptuoso para o palácio,
prolongando, paisagem adentro a sua monumentalidade arquitetónica. Aquele que
reina sobre os homens aparece neste exemplo paradigmático, como alguém que
também domina a natureza, organizada em simetrias e recortada em artificiais
formas geométricas.
O
espaço interior mais famoso é a Sala dos Espelhos, uma galeria exuberantemente
decorada por Charles Le Brun. A designação vem-lhe dos dezassete espelhos,
colocados exatamente de fronte das janelas redondas até ao chão e que produzem
uma cintilação quase irreal. Luís XIV mandou construir a sala depois da
assinatura do Tratado de Nimegue, em 1678, que confirmou a sua hegemonia na
europa. Era nesta sala que os cortesãos apresentavam as suas homenagens ao
monarca; raramente tinham aqui lugar quaisquer festividades.
Em
1871, o rei da Prússia, Guilherme I, reconverteu a sala para uma celebração
insólita: vitorioso na guerra franco-alemã, foi aqui que se fez proclamar
imperador do recém-fundado império Germânico. Em 1919, depois da derrota alemã
na primeira grande guerra e da queda do império Guilhermino, foi na sala dos
espelhos que, finalmente, se assinou o Tratado de Paz de Versalhes.
Brigitte
Beier
Sem comentários:
Enviar um comentário