Há uns meses, toda a
europa pode exercer a solidariedade que mais gosta: a das palavras. Aconteceu
quando o jornal satírico francês Charlie Hebdo foi decapitado barbaramente.
Agora é preciso passar das palavras aos atos e acolher centenas de milhares de
pessoas que fugiram à guerra, arriscando as suas vidas, para chegar até solo
europeu.
Não são ricos, não têm
uma mentalidade europeia nem professam uma religião muito bem vista na europa,
no entanto são seres humanos. E é de humanidade que trata a solidariedade.
A razão por que os
devemos acolhê-los é tão-somente a mais básica e elementar condição que
partilhamos com eles. Obviamente não se meteram num bote para atravessar o
mediterrâneo e depois a europa para nos violentar, catequizar ou ficar com os
nossos recursos. Passámos anos a acusar tantos povos asiáticos africanos de
usarem a venda ideológica que os seus líderes políticos e religiosos lhes
colocavam, mas hoje somos nós que não percebemos a xenofobia, o sectarismo, os estereótipos
em que caímos.
Desconheço quem nos fez
assim tão desumanos, mas isso é um problema menos urgente. A questão
fundamental é que quem quer ajudar, quem quer receber o sírio ou o líbio o possa
fazer sem constrangimentos ou remoques do vizinho, acusando-o de oportunismo e
exibicionismo.
É certo que o
estrangeiro que agora suplica a nossa solidariedade é tão merecedor dela como o
indigente por que passámos ontem, a velhinha do 2.º esquerdo ou a mãe com
filhos de colo e sem recursos para os alimentar, mas convém não esquecer que a
solidariedade é um ato livre, espontâneo e que deve partir do nosso coração.
Ninguém é obrigado nem constrangido a tornar-se solidário, até porque isso não resultaria
em solidariedade nenhuma.
Se a pessoa que
conhecemos a todo o tempo egoísta quer agora ajudar, devemos apoiá-la sem a
criticar. Normalmente, as motivações de cada pessoa são as linhas tortas por
onde escrevem os mais belos poemas das suas vidas. Para muitos portugueses e
europeus, este será um momento marcante na sua vida, pois irá descobrir-se
descobrindo o outro, a sua cultura, a sua mentalidade.
Obviamente que nem tudo
correrá bem, pois todas as rosas têm espinhos, todavia este é um trabalho que
tem de ser feito. Das poucas coisas boas que Angela Merkel fez ultimamente foi
perceber isto. É certo que a traumatizante experiência de uma alemã de leste
deve ter ajudado, mas é de louvar a sua atitude-locomotiva, em contraste com as
vergonhosas palavras David Cameron e as titubeantes atitudes do presidente francês,
François Hollande.
A solidariedade não se
mede aos palmos nem às nacionalidades. Quem a quer praticar, pratica-a, quem
não quer, está calado. Caso contrário, dá mais trabalho que o refugiado!
Gabriel Vilas Boas
Ora! Aí está! :)
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