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domingo, 26 de abril de 2015

RESGATE, de Manuel Alegre





Daqui a alguns dias já será possível encontrar nas livrarias o mais recente livro de Manuel Alegre – Bairro Ocidental – e é lá que podemos ler este maravilhoso poema sobre a revolta do poeta português sobre os anos de submissão económica e social que ainda vivemos.
Com o poema RESGATE, Manuel Alegre reafirma o eixo fundamental da sua poesia: a intervenção social e política através da poesia.
Em «Resgate» podemos ler toda a revolta do português que se sente humilhado pela intervenção da troika e pela submissão dos governantes do seu país, incapazes de compreender o seu povo. Depois de há cinquenta anos insuflar esperança através dos seus poemas, agora, Manuel Alegre defende a dignidade do seu povo, num poema belíssimo que passo a transcrever e que vale a pena ler com muita atenção.


RESGATE
Há qualquer coisa aqui que não gostam
Da terra das pessoas ou talvez
Deles próprios
Cortam isto e aquilo e sobretudo
Cortam em nós
Culpados sem sabermos de quê
Transformados em número estatísticas
Défices de vida e de sonho
Dívida pública dívida
De alma
Há qualquer coisa em nós de que não gostam
Talvez o riso esse
Desperdício.
Trazem palavras de outra língua
E quando falam a boca não tem lábios
Trazem sermões e regras e dias sem futuro
Nós pecadores do Sul nos confessamos
Amamos a terra o vinho o sol o mar
Amamos o amor e não pedimos desculpa.
Por isso podem cortar
Punir
Tirar a música às vogais
Recrutar quem os sirva
Não podem cortar o verão
Nem o azul que mora aqui
Não podem cortar quem somos!

Manuel Alegre

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