Gil Eanes foi um dos
mais marcantes navegadores portugueses do século XV. Para sempre ficará
associado à passagem do Cabo Bojador em 1434. A dobragem deste cabo, a sul
das ilhas Canárias, era importantíssimo, quer a nível “físico” quer a nível
psicológico.
Aquele que ficou
conhecido como o cabo do medo enterrou dezenas de embarcações e de vidas e
obrigou o infante D. Henrique a destacar 15 expedições até que o navegador
algarvio o conseguiu dobrar.
E por que era assim tão
difícil vencer este cabo africano? A culpa era do deserto do Saara que, ao
longo dos anos, em virtude das suas cíclicas tempestades de areia, assoreou uma
parte do Oceano Atlântico, a alguns quilómetros do referido cabo, fazendo
encalhar todas as embarcações que por lá passavam.
Como não conseguiam explicar o facto
de, em pleno alto mar, não obterem uma profundidade superior a dois metros, os
navegadores portugueses justificavam o seu insucesso com razões sobrenaturais.
Até que Gil Eanes empreendeu uma manobra que hoje nos parece simples e
óbvia: decidiu manobrar para oeste afastando-se da costa africana. Após um
dia inteiro de navegação longe da costa, deparou com uma baía plácida de ventos
amenos, e então dobrou para sudeste e logo percebeu que havia deixado o Cabo
Bojador para trás.
Gil Eanes tinha ganho o seu lugar na História e Portugal avançava na conquista
do desconhecido, explorando a Costa de África, a caminho da Índia, deitando um
olho ao Brasil.
O Bojador era um grande obstáculo que se resolveu com uma medida simples.
Depois de vencido é fácil catalogá-lo como trauma psicológico, mas eu vejo-o
como mais uma lição da História ao Homem. Mesmo os grandes obstáculos são
ultrapassáveis e não necessariamente por super-heróis. Não nos resignarmos,
atuarmos com racionalidade e confiança, buscarmos também as respostas simples
são atitudes e métodos que nunca devemos abandonar.
A nossa vida é feita de
pequenos bojadores, fins de mundo anunciados, que logo se tornam ridículos
perante o aparecimento de novos fantasmas.
Gosto de pensar que a vida é tanto mais saborosa
quanto mais nos desafia, mas a verdade é que observo muito desespero de várias
pessoas, perante os bojadores que se lhes deparam.
Visto em perspetiva, o Bojador foi um fantasminha
histórico e Gil Eanes o primeiro duma saga de grandes navegadores portugueses.
Os nossos problemas também são pequenas gotas no oceano das confusões do mundo.
Talvez não fosse má ideia assumirmos o leme da vida que nos coube e imitarmos
metaforicamente o Gil Eanes.
Gabriel Vilas Boas
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