A História escreve, nos anais do Tempo, ironias tão certeiras e profundas que
algumas parecem brotar das mãos dum Poeta Divino. Hoje é o Dia Internacional dos
Direitos Humanos e, precisamente neste dia, terminou uma das mais infames existências
do século XX: Augusto Pinochet.
Augusto Pinochet viveu longuíssimos noventa e
um anos, de uma vida profundamente lamentável, onde é difícil encontrar algo de bom
para referir.
O chileno mais desprezível do século XX entrou na História do seu país
quando traiu os ideais militares que jurou defender e depôs, através dum golpe
de estado extremamente violento, o mítico líder comunista Salvador Allende, a 11
de setembro de 1973.
Durante dezassete anos submeteu o seu povo a uma ditadura militar execrável,
onde exercitou os piores defeitos deste tipo de regime: corrupção; atropelo aos
direitos humanos; ausência de liberdade de imprensa; perseguição, tortura e assassínio
da oposição política; fraudes eleitorais; criação de leis que visavam uma
proteção futura dos crimes cometidos; diminuição em 40% dos salários reais dos
chilenos; duplicação do número de pobres; o desempregou aumentou 500%...
Na verdade, a realidade ultrapassa a imaginação mais cruel e maldosa, pois tudo e mais alguma coisa Augusto Pinochet fez aos seus.
Haveria de terminar como viveu: no meio da mais profunda indignidade.
Pacientemente os chilenos deixaram que fosse expondo toda a sua abominável personalidade.
Em plebiscito, os compatriotas negaram-lhe que se perpetuasse no poder.
Cobardemente, saiu da cadeira do poder, que ocupou tanto tempo tão
indignamente. Negociou a sua retirada para senador vitalício, onde às mordomias
materiais acrescentava a impunidade perante os crimes, cuja profundidade se ia descobrindo, mês após mês.
Rapidamente
se soube que Pinochet estivera envolvido na “Operação Condor”, na “Caravana da
Morte”, na “Operação Colombo”. Esteve ligado a negócios ilícitos, privatizou
bens públicos que os amigos compraram a preços irrisórios, fugiu ao fisco, chegou
a fazer dinheiro com a fabricação de cocaína em instalações militares!
Em
1998, foi preso em Londres, onde tinha ido por questões de saúde, mas a infeliz
pressão da senhora Thatcher impediu que Baltasar Garzón o julgasse em Espanha
por crimes contra os Direitos Humanos. Regressou ao Chile e fez-se passar por
maluquinho para escapar novamente à justiça. A indignidade, a cobardia eram
traços tão vincados na sua personalidade como a sociopatia, a maldade ou a
corrupção.
Morreria
uma semana após um ataque cardíaco. Acho que o destino e a História esperavam a
chegada do dia 10 de dezembro – Dia Dos Direitos Humanos – para colocar uma
cruz negra sobre um dos seres que mais espezinhou, humilhou e torturou o seu
semelhante.
Gabriel
Vilas Boas
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