Tal como um ser vivo, o Museu do Louvre, em Paris, revelou, ao longo dos séculos um crescimento progressivo e gradual. As suas coleções continuam a expandir-se de modo constante. O que lá podemos encontrar é o resultado dos gostos, das escolhas e das circunstâncias ligadas às ações dos reis e governantes franceses bem como dos seus artistas.
Grande parte das obras primas que se encontram hoje no Louvre faziam parte das coleções particulares dos reis de França, mas só a partir de Luís XV, o Louvre começou a ser pensado como a “casa das Musas”, ou seja, o lugar onde sistematicamente eram guardadas as grandes obras-primas das coleções francesas com o objetivo de serem exibidas ao público. 
Atualmente o museu mais conhecido de França têm à sua guarda 30.000 objetos distribuídos por sete coleções, visitadas anualmente por cinco milhões de pessoas. O espólio está repartido pelas seguintes secções: artes decorativas, antiguidades egípcias, gregas, etruscas e romanas, pintura francesa, italiana, espanhola e desenhos italianos.
Se nos retivermos na pintura, é fácil entender que o quadro mais famoso do Louvre é a “Gioconda” (1503-1506) de Leonardo da Vinci, a que este blogue já fez referência.
Por isso, hoje proponho um olhar mais atento para “A Liberdade Guiando o Povo” (1830), de Eugène Delacroix. 
Quando, em 1831 foi apresentado no Salon, “A Liberdade Guiando o Povo” teve uma clamorosa receção: a crítica mostrou-se escandalizada pela audácia com que o pintor tratara o tema e pela violência dos sentimentos que exprimia. Porém, as contestações em nada afetaram Delacroix, que ao invés, ficou orgulhoso e satisfeito por ter realizado uma obra que enaltecia os valores da pátria. 
“A Liberdade Guiando o Povo” constitui um ponto de viragem para a pintura europeia, elevando-se a solene manifesto das exigências espirituais duma nova geração de pintores, que, imbuídos da cultura romântica, viveram apaixonadamente o seu tempo e souberam expressá-lo através da arte, pondo de lado os temas tradicionais da “pintura de história”, inspirados na Antiguidade ou, pelo menos, num passado remoto.
Olhando tecnicamente para o quadro, observamos que o lugar de destaque vai obviamente para a Liberdade, representada como uma deusa clássica, sinónimo de virtude e eternidade. No entanto, os seus traços robustos são comuns ao povo francês. Empunha uma arma moderna – um mosquete. Os cadáveres são membros da guarda de elite do rei. O realismo dos cadáveres é inspirado em obras de Antoine-Jean Gros, que Delacroix admirava.
Um fator que torna a obra complexa e ambígua é a presença dum cadáver desnudado, um homem desprovido da sua dignidade. As roupas foram roubadas, pois outras personagens do quadro apresentam-se com objetos roubados dos cadáveres. Daí se conclui que mesmo entre aqueles que lutam pela liberdade, há atitudes censuráveis. Delacroix não se esforça por dignificar aquilo que lhe parece indigno.É forçoso repararmos nas bandeiras. No quadro temos duas bandeiras, uma empunhada pela liberdade e outra sobre a Catedral de Notre Dame. A bandeira tricolor foi utilizada na Revolução Francesa de 1789 e nas guerras de Napoleão. Após a derrota deste em Waterloo, a bandeira não foi mais utilizada. O regresso deste símbolo é carregado de emoção, como se o povo reconquistasse o seu orgulho.
Em resumo, temos uma composição clássica, piramidal, em que a liberdade ocupa o vértice da pirâmide. O mosquete com baioneta que a liberdade empunha cria uma linha paralela com a arma segurada pela criança. No restante do quadro, várias linhas diagonais trazem dinamismo à composição. Além dos elementos pintados, ganham especial relevo neste quadro as cores e o jogo de luzes.
As cores vivas da bandeira auxiliam o destaque  dado à mulher que simboliza a liberdade. Nota-se que o vermelho da bandeira está sobre o céu azul, o que o salienta ainda mais. As cores repetem-se nas roupas do trabalhador aos pés da liberdade. As vestes da liberdade são pintadas num tom mais claro do que aqueles encontrados no restante da pintura, facilitando o sentido da leitura.
Quanto à luz, é de realçar o forte contraste de luz e sombra que confere maior dramaticidade à cena. Na paisagem, a luz do entardecer mistura-se com a fumaceira dos canhões, dissolvendo-se num brilho marcante.


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