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domingo, 23 de novembro de 2014

O MOMENTO DA VERDADE DA JUSTIÇA PORTUGUESA



Agora já não é possível recuar: ou a Justiça portuguesa cumpre o seu papel fundamental – julgar – ou cairá num descrédito perante a população de que demorará muito tempo a levantar-se.
Com a prisão, há dois dias, para interrogatório, do ex-primeiro-ministro José Sócrates, a Justiça portuguesa completou um ramalhete de casos/processos relacionados com as pessoas mais poderosas do país.
Na última década, algo mudou na justiça portuguesa. Desde o processo Casa Pia, os portugueses assistiram à “queda” de muitas figuras prestigiadas, mediáticas e poderosas do país, nos mais diversos quadrantes. No entanto, excetuando o traumatizante processo de pedofilia na Casa Pia, que condenou Carlos Cruz, Jorge Rito, Ferreira do Amaral e Carlos Silvino, todos os outros processos tiveram um fim pífio ou ainda decorrem.


No futebol, todo o país soube quem e como corrompia árbitros, mas as escutas, afinal, eram ilegais e a justiça formalista arquivou aquilo que devia ter condenado.
Entretanto a crise da economia mundial destapou as tramóias financeiras, jurídicas e políticas em que viveram quase todos os bancos privados portugueses. BCP, BPP, BPN, BES afundaram-se em dívidas, casos de corrupção, branqueamento de capitais, fuga ao fisco, entre outros. Apesar de privados, foi o erário público a pagar penosamente os erros e roubos alheios. O Ministério Público e a PJ têm levados alguns desses responsáveis a tribunal, mas ainda nenhum caso foi julgado, nenhum banqueiro está preso e as hipóteses de recuperação do dinheiro público investido nesses buracos negros são nulas.


Depois de Isaltino de Morais andar a brincar ao esconde/esconde, com o sistema judicial português ridicularizando as leis que temos e de Duarte Lima ter sido preso por putativos crimes económicos quando os brasileiros pressionavam para o ouvir por homicídio, altos funcionários do Estado português são acusados de corrupção e ficam em prisão preventiva. Agora chegou a vez do ex-primeiro-ministro José Sócrates responder perante um super-juíz, ao bom estilo de Baltasar Garzón, sobre eventuais pecados cometidos enquanto governante e de que a população portuguesa falava à boca cheia sem nunca ter surgido uma acusação formal.
A Justiça não escolhe quem julga nem o que julga. Ricos, pobres, poderosos, influentes, mediáticos, desconhecidos – todos são possíveis alvos dos tribunais quando prevaricam. O problema da Justiça é que todos estes casos estão por fechar e quase todos eles ainda nem sequer atingiram a fase de julgamento.



A partir de agora é com o tribunal, ou seja, com os juízes. E eles também estão em exame perante a sociedade portuguesa. A tibieza demonstrada em caso anteriores, ainda que com honrosas exceções, não augura nada de bom… Talvez eles ainda não tenham reparado, mas a paciência não se esgota apenas com os políticos corruptos, com os banqueiros desonestos, com os dirigentes negligentes… O mundo e Portugal mudaram. Os portugueses exigem uma justiça bem mais célere, audaz e certeira. Dispensam acertos de contas, jogos florais, processos mal instruídos, fogueiras mediáticas que acabem em condenações de pena suspensa.
Se é para condenar, que se condene com rapidez, firmeza e sensatez; se é para absolver, que se seja rápido e claro. O cinzento é a cor que pior combina com a justiça.


Gabriel Vilas Boas 

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