No mesmo mês, no mesmo local, dois músicos da mesma geração, dois concertos completamente diferentes. Primeiro foi Patxi Andión, com o seu domínio da palavra, que, cantada sempre em castelhano e uma vez em basco, foi falada na língua de Camões, num português quase perfeito. Nos braços, a guitarra que o acompanhou por cerca de duas horas, entusiasmando um público maioritariamente de cabelos brancos ou grisalhos que não se inibiu de pedir as músicas mais conhecidas do cantor e autor espanhol, desejos que este não se escusou a satisfazer. Foi muito bom, a sala cheia, a acústica perfeita, o músico em palco conquistando os presentes com a sua voz, simplicidade, simpatia e coloquialidade. No final, dirigiu-se a cada um dos presentes, a quem dedicou a derradeira música, Yo Estaré Aqui, e nessa altura, todos ficaram definitivamente rendidos aos encantos da voz e da presença do músico.
Yo estaré aqui
Cuando sientas el alma volarte entre los dedos,
Cuando sientas que el aíre se acerca hasta tu inverno,
Cuando oigas silencios posarse en tu ventana
Y vagues cada noche com el ala cansada.
Yo estaré aqui detrás de ti para calmar tu sed
Y reforzar tu fe, acompanhar tu sombra
Para calmar la hora de rellenar alcobas
Y enderezar las horas.
…
Yo estaré aqui detrás de ti a remendar dolor
Y abrigarte la voz, dar sombra a tu verano
Y hacer tuya mi mano y ser tu companhia
Y que tú, que tú seas la mía.
Patxi Andion teve problemas com a censura em Espanha e por duas vezes foi expulso do nosso país, pois era persona non grata, dadas as suas convicções políticas e a sua consciência social que o fazia denunciar situações com as quais não podia concordar. No entanto, em 1974, ainda antes do 25 de abril, conseguiu cantar no Coliseu dos Recreios, com agentes da PIDE na sala. Depois disso apresentou-se várias vezes em Portugal, país ao qual sente uma ligação muito forte e onde tem amigos. As suas canções têm essencialmente uma temática social ou romântica.
O segundo concerto foi de outro grande músico, mas este português e a comemorar os 25 anos do lançamento do álbum Bairro do Amor.
Jorge Palma proporcionou a todos os presentes uma noite memorável, interpretando ao longo das duas horas de espetáculo algumas das suas músicas mais conhecidas ao piano ou na guitarra. As interpretações ao piano foram simplesmente magníficas. Jorge Palma fez-se acompanhar de dois músicos igualmente excelentes, Gabriel Gomes no acordeão e Vicente Palma dividindo-se, correndo entre o piano e a guitarra. O espetáculo teve ritmo, sequência, excelentes momentos, fruto de muito caminho percorrido e de uma grande sabedoria. Parco em palavras, foi farto em bons momentos musicais, terminando em beleza com todos a cantarem A Gente Vai Continuar. Para comemorar os 25 anos da edição do Bairro do Amor foi feita uma reedição da obra que sabe sempre bem ouvir.
A vida é um Carrossel
Ode há sempre lugar para mais alguém
O Bairro do Amor foi feito a lápis de cor
Por gentes que sofreu por não ter ninguém.
Margarida Assis
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