Nestes próximos artigos gostaria de vos falar de
uma forma ligeira e descomplicada da formação e evolução das Cidades. Talvez
dar o nome de História do Urbanismo
seja um pouco pretensioso, visto que em épocas recuadas como a Antiguidade
Clássica não existia propriamente Urbanismo, mas sim uma preocupação e um certo
planeamento urbano.
A temática é extensa, por isso irei tentarei ser o
mais sucinta possível, passando pelos períodos mais relevantes da História.
Para tal abordarei, numa primeira fase, a evolução das cidades até sensivelmente
ao século XVIII e, numa segunda fase, do séc. XVIII até aos nossos dias.
As Cidades podem ser estudadas sob distintos pontos de vista: o histórico,
o geográfico, o político, o sociológico e também o da sua arquitectura e arte.
Analisemos as primeiras grandes Cidades:
Da civilização
egípcia pouca informação existe sobre o plano de urbanização. Esta é-nos
dada através de pinturas e espécies de maquetes encontradas em templos e
túmulos, ou através das escavações. Daí podemos depreender que a regularidade é
a característica mais importante da planificação das cidades, sendo normalmente
de planta quadrangular com ruas rectilíneas, estreitas e pouco longas. Era
habitual serem cercadas por taipais e fossos.
Imagem – Ruínas na vila de trabalhadores do antigo Egipto, Deir
A cidade-estado grega integrava-se na morfologia
do território, isto é, elementos como muralhas, ruas e edifícios adaptavam-se
ao terreno sem o modificarem. Eles incorporavam proporcionalmente os velhos e
os novos edifícios, com o ambiente que os rodeava, respeitando o lema que a
Natureza e o Homem deveriam ser a medida da cidade. Podemos dizer que os gregos
subordinavam a cidade ao centro cívico (ágora, edifícios
públicos), sendo a urbe dividida em três áreas: a privada, a pública e a
sagrada.
No séc. V
a.C. surgiu o primeiro plano urbanístico funcional, criado por Hipódamo
(filosofo e arquitecto da Ásia Menor 498-408 a.C.). Este idealizou uma
organização lógica da Cidade, através de um sistema ortogonal ou de retícula,
onde as avenidas longitudinais e transversais em esquadria formavam quarteirões
regulares com uma funcionalidade específica. O plano coloca o enfase nas
preocupações democráticas e na valorização do Homem como “medida de todas as
coisas”.
Imagem de cima – Maquete de Delfos, exemplificadora da integração
com ambiente natural; Imagem de baixo - A cidade de Mileto (organizada no
séc. V a.C. por Hipódamo) caracteriza-se pelo seu traçado ortogonal que se
adapta ao terreno, a ágora une as duas quadrículas
Nas cidades
romanas o planeamento urbano, se assim podemos dizer, nasceu da tentativa
de resolução dos problemas político-militares, económicos e de salubridade. Estas
evoluíram da expansão de antigas povoações, acampamentos militares ou
propriedades rústicas, no entanto é nas novas cidades do Império Romano que se
verifica uma maior aplicação do plano urbanístico defendido pelos romanos. Este
privilegia o traçado regular e geométrico, em formato de rede ortogonal
atravessado por duas vias principais orientadas segundo os pontos cardeais:
norte-sul – o Cardo - e este-oeste – o Decumano. No cruzamento das duas vias
ficava o fórum e nas suas extremidades as portas principais da cidade, já as
termas e o anfiteatro ficavam nos limites da urbe. Ao contrário dos gregos a
intervenção na paisagem era uma realidade, disfarçavam a irregularidade com
edifícios majestosos, movimentavam as terras para maior efeito cénico ou
prático.
Imagem da Esquerda – Maquete de Roma Antiga; Imagem da Direita- Plano da cidade de Timgad - Argélia, construída no ano 100 pela 3ª Legião ao serviço no Norte de África
A cidade
Medieval, inicialmente campesina e espelho da sociedade feudal, ganha uma
importância no ordenamento do território com o crescimento demográfico, o
desenvolvimento do comércio nos Sécs. XII e XIII e o crescente aparecimento de
uma classe social “burguesa”. Geralmente a cidade situa-se em locais de difícil
acesso por necessidade de defesa, sendo por isso fechada em si e vulgarmente
muralhada. O facto de se adaptar à topografia do terreno torna-a numa cidade
orgânica e condiciona por isso a sua fisionomia espacial, dando origem a ruas
irregulares e tortuosas.
Pelo facto de estas cidades terem surgido
naturalmente há uma grande variedade de esquemas planimétricos: Cidade linear, Cidade em cruz, Cidade em esquadria, Cidade nuclear, Cidade
binuclear, Cidade espinha de peixe, Cidade acrópolis e Cidade radioconcêntrica.
No entanto esta última é a mais usual na Idade Média, talvez porque a sua forma
circular ou elíptica se torne de fácil defesa e mais económica. Verifica-se
aqui que as ruas mais importantes desenvolviam-se a partir do centro, radialmente, até às portas da fortificação e as secundárias ligavam as
principais entre si de forma circular e dispunham-se em torno do centro, sendo
este ocupado por uma catedral ou um templo e pelos edifícios mais importantes
para além das necessidades de mercado - centro cívico. Os Grandes monumentos
serviam de foco a toda a estrutura da cidade.
Toledo - ilustra a localização preferencial da Idade Média, numa colina rodeada por um fosso natural de um rio.
Vista aérea da cidade de Eguisheim França, patenteia o esquema da cidade radioconcêntrica
A cidade
ideal do Renascimento nasce a partir das descrições deixadas por Vitrúvio
(arquitecto romano do séc. I a.C.), sendo uma criação mais intelectual que
real. No período renascentista muitos foram os teóricos que se debruçaram sobre
a organização das cidades, criando mesmo o conceito de “Cidade Ideal Italiana”,
onde as casas eram proporcionadas ao espaço, os centos administrativos/políticos
e os palácios eram alinhados com os demais edifícios e as igrejas eram em forma
circular, para que tudo confluísse numa perspectiva linear e matematicamente
rigorosa, baseados nos novos conceitos e mentalidades da época. Esta cidade
toma a forma de um octógono, tendo por base uma estrela de 8 pontas inscrita
num círculo, devido quer à necessidade de defesa, quer à necessidade de
protecção dos ventos dominantes, efectuada com torres circulares nos seus
ângulos e rodeada de muralhas, ficando cada lanço da muralha oposto a um vento.
Nas cidades do velho continente, o pensamento
utópico organiza cidades geométricas ideais, com preponderância dos traçados
regulares, apresentando simetria e proporção rígida na execução das vias, escadarias,
terraços e praças. Esta última é o “Cartão de Visitas” da cidade e das
autoridades. É contudo nas novas cidades que os ideais vigentes ganham espaço
surgindo um modelo regular, de ruas rectilíneas, que definem quarteirões,
geralmente quadrados, onde o centro é conseguido através da supressão de
quarteirões, criando assim praças onde os edifícios mais importantes são
implantados.
A cidade Barroca foi herdeira dos estudos teóricos do Renascimento, do critério albertiniano, baseado na pura harmonia geométrica, independentemente da percepção visual. Esta revelava preocupação na criação de zonas monumentais, para conter grandes massas que permitissem o espectáculo absolutista da Igreja e do Rei, onde ruas e avenidas rectas, largas praças, palácios com fachadas surpreendentes, fontes e jardins exuberantes, criam o cenário para tal. É neste contexto que surge um novo tipo de cidade, a Cidade-Capital, criação moderna, racionalmente planificada, imagem da realidade nacional e consolidação do poder político num único centro. Esta criação barroca confere à cidade um elemento político, social e cultural decisivo.
O Barroco gerou uma nova ideia de conceber a cidade,
esta deveria ser considerada como obra de arte, de percepção visual imediata, usando
a linha recta, a perspectiva monumental, o programa e a uniformidade como meios.
Imagem da Esquerda - A Praça Monumental, construída para servir de
quadro a um rei, foi um tema adoptado pelo barroco ; Imagem da Direita – Praça
de Espanha-Itália
A Cidade é feita de história, dependente das etapas por que passou e de uma certa maneira fragmentada e inacabada, constituindo uma herança dos nossos antepassados. Esta é o resultado de uma actualização das fases históricas por que passou e a sua projecção em direcção ao futuro.
Teresa Beyer
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