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quinta-feira, 30 de novembro de 2017

XUTÁMOS MAIS UMA ESTRELA PARA O CÉU




A facilidade com que a morte arruma e arquiva os nomes que fizeram a nossa história coletiva é revoltante! 
Só esta semana, conto o ator João Ricardo, o jornalista Pedro Rolo Duarte, o empresário Belmiro de Azevedo, o guitarrista dos Xutos & Pontapés.

É impossível não lhe ter raiva, porque não nos dá sossego nem tréguas. Brutalmente apaga-nos memórias importantíssimas da nossa geografia emocional e crava bandeiras negras, onde tínhamos plantadas jardins de sonhos.

A tristeza não estilhaça a alma apenas quando a relação é pessoal. Há gente que nos construiu sem nunca ter trocado connosco uma palavra, um aperto de mão, uma conversa de circunstância. Os artistas têm esse dom.

Há uns anos, quando Manuel António Pina faleceu, deixei de procurar a última página do JN, que para mim era a primeira, por sua causa. Dificilmente voltarei a ouvir “Hotel Babilónia” com o mesmo entusiasmo e acho improvável voltar a assistir a um concerto dos Xutos. Detesto que me apaguem o mapa sem aviso prévio nem autorização. Abomino o conluio que a Morte faz com determinadas doenças e nos levam pedaços de alegria genuína.

«O Zé Pedro dos Xutos morreu!». 
À sua maneira, ele ajudou a construir um grupo ímpar na música portuguesa, que soube transpor e conquistar gerações. 

Ouvi-lo no carro ou na aparelhagem lá de casa é pouco e é pobre. Soa-me a requiem e não àquela força de viver que silvava da sua guitarra. 
Bom, bom era assistir aos concertos, pular, sentir a adrenalina que jorrava das canções que sabíamos de cor, perceber o prazer que dava a todos um êxtase coletivo formidável.
Do último concerto que vi dos Xutos, guardo a memória de uma performance extraordinária do Zé Pedro em “Para Sempre”. 
E tal como refere o início da canção, ele sabe que
O nosso amor de sempre

Brilhará para sempre

GAVB

quarta-feira, 29 de novembro de 2017

BELMIRO DE AZEVEDO REVOLUCIONOU A ECONOMIA E O LAZER EM PORTUGAL


Morreu Belmiro de Azevedo, um dos maiores empreendedores portugueses do século XX e, provavelmente, o maior da democracia portuguesa.
O pai da Sonae transformou a economia portuguesa, ao torná-la quase definitivamente uma economia assente nos serviços. A criação de Centros Comerciais, hipermercados e supermercados, em praticamente todos os concelhos do país, enraizou, nos portugueses, hábitos de consumo permanente.

A cultura shopping marcou o final do século XX, em Portugal, e a Sonae em muito contribuiu para esse fenómeno. A maneira como os portugueses gastavam o seu dinheiro, como se divertiam, como organizavam a sua vida social ficou muito condicionada por esse modelo criado, desenvolvido e aperfeiçoado pela Sonae, de que Belmiro foi, até há alguns anos, o líder incontestado.

No entanto, Belmiro não se interesse somente pelo proliferação de Shoppings e hipermercados Continente pelo país. Também interveio no turismo, na conexão com a agricultura e com diversas indústrias. Ligou-se à área das telecomunicações, através da Optimus (mais tarde incorporada na NOS), e deu-se ao luxo de patrocinar um jornal diferenciador (O Público), ainda que sem grande êxito comercial.

Belmiro era um homem de projetos, de ação, da economia. Um self-made man que tinha uma ideia para o país e que a pôs em prática.

O seu modelo foi replicado por outros e a partir de certa altura caminhou sozinho.
Soube sair de cena, com dignidade, sem ser empurrado nem suscitar sentimentos menores.
Gostemos ou não do estilo, dos métodos ou até do modelo económico que impôs à sociedade portuguesa, o certo é que ele marcou um Tempo e contribuiu bastante para que o país desse um salto de qualidade.
Hoje parte, porque isso é inevitável a todo o ser humano, mas fica a obra. Uma obra enorme de que só se pode sentir orgulhoso.
GAVB


terça-feira, 28 de novembro de 2017

FINLÂNDIA: ENSINAR E APRENDER, COM PRAZER, NÃO É NADA DO OUTRO MUNDO


O ano passado, o polémico realizador e excelente documentarista americano resolveu viajar até à Finlândia para perceber por que razão aquele país se tornou no melhor sistema educativo do mundo. 
Saiu de lá siderado, porque viu gente feliz, culta, de bem com a vida e preparada para ela. Percebeu que não fazem nada de especial, para serem tão bons. Apenas aplicam MESMO aquilo que foram ideias aceites por quase todas as sociedades ocidentais como as melhores para os seus sistemas educativos, mas que por preguiça, oportunismo ou mania nunca puseram verdadeiramente em prática.

Do documentário retiro algumas ideias fortes, que me parecem tão simples, tão práticas, tão fáceis de implementar, mas de que estamos longe de integrar consistentemente.
Eles não discutem ridículos pormenores, eles aplicam o essencial e… pronto.

- Não têm trabalhos de casa (se excecionalmente existirem não ocupam mais que 15 minutos), porque as crianças têm de ter tempo para serem crianças, para aproveitar a vida, para estar com os amigos e com a família, para brincar, para ler, para jogar ou tocar;

- O horário semanal não ocupa mais de 20 horas, pois o cérebro precisa de intervalos de relaxamento, a fim de absorver convenientemente a informação, articulá-la e finalmente aplica-la;
- Não fazem testes de escolha múltipla, porque acham que para se dar uma resposta certa têm mesmo de saber (e não apenas reconhecê-la ou jogar com a sorte);
- Rejeitam os testes padronizados (uma espécie de exames nacionais ou provas de final de ciclo), porque a maioria deles não ensinam a pensar, mas antes criam seres autómatos e não pessoas livres, críticas, responsáveis;

- Os finlandeses acham (e bem) que o teste padronizado exclui muito saber. Põe de lado de lado a educação cívica, a poesia, a música, a arte, o desporto. Ora, eles pensam que o domínio destas áreas tornarão os seus jovens mais felizes. Afinal, é esse o objetivo final, certo? Ou será ensinar como conseguir um "potinho de moedas" de ouro o mais rapidamente possível? 

- As crianças precisam de experimentar. Ser cozinheiros, poetas, pintores, costureiras, jornalistas… Experimentar, porque essa é a realidade que vão encontrar quando forem adultos;
- Os alunos finlandeses são autónomos e alguns já vão para a escola sozinhos aos 7/8 anos (curiosamente, nós, há quarenta anos também íamos);

- Os alunos finlandeses falam três ou mais línguas estrangeiras: inglês, sueco, francês, alemão, espanhol...
- Quando é necessário fazer a reabilitação de um recreio ou parque de lazer, os arquitetos chegam à escola e vão falar com os alunos e a opinião deles é tida em conta;

- Não sentem necessidade da competição entre escolas, nem acreditam muito na ideia de que a competição entre alunos seja a solução. Por isso, não precisam de rankings, nem de saber qual é a melhor escola. Talvez por isso seja ilegal cobrar propinas numa escola finlandesa e a maioria seja pública. Lá, os pais ricos fazem questão que os seus filhos cresçam e aprendam junto com aqueles que provêm de famílias mais humildes.
        
É fácil perceber que a Finlândia é um país onde ser Professor é uma honra, um privilégio e um prazer. Lá, o professor ensina a pensar, a ser crítico, a respeitar-se e a respeitar o outro.
Ser feliz não é apenas uma ideia bonita, poética e (in)útil.

GAVB


segunda-feira, 27 de novembro de 2017

O GRANDE CORAÇÃO DE RONALDO


Entre a voragem dos golos, dos títulos, dos campeonatos, das bolas e das botas de ouro, das namoradas e dos filhos por encomenda ou feitos por engano, há algo que Ronaldo faz, com alguma discrição, mas com enorme coração: filantropia e solidariedade. Nisso ele é também um verdadeiro campeão, porque me pareceU sempre verdadeiro e inteiro.

Há dias, o insuspeito jornal italiano Gazzetta dello Sport’ considerou o capitão da seleção portuguesa o futebolista mais solidário do mundo. Talvez seja um pouco exagero (como em muito do que gira à sua volta), mas é certo que o jogador do Real Madrid é um homem sensível aos momentos de dor, não só daqueles que lhe são próximos como de outros que mal conhece, mas que se conectam com ele, de uma maneira ou de outra.

Alguns exemplos: doou mais de 100 mil euros ao Hospital onde a mãe fez tratamentos contra o cancro da mama; ofereceu à Cruz Vermelha o prémio de 100 mil euros que recebeu recentemente da UEFA; é dador de razão; é dador de medula óssea, doou a Bota de Ouro conquistada em 2011 à Fundação do Real Madrid; auxiliou monetariamente várias famílias da ilha da Madeira, de onde é natural, aquando das cheias de 2010 e dos terríficos incêndios de 2016.

Há certamente mais casos que comprovam a filantropia de Ronaldo. Vamos sabendo deles, mas não fruto de qualquer ação de marketing concertado dos seus agentes, porque se percebe que a ajuda de Ronaldo é feita com o coração, com sensibilidade e humildade.
É verdade que é fácil dar alguma coisa quando se tem muitíssimo, mas o mundo do desporto, e em especial o do futebol, está cheio de milionários, mas não abundam casos de generosidade como o de Cristiano Ronaldo.

GAVB

domingo, 26 de novembro de 2017

ALMOÇOS GRÁTIS, FIGURANTES E FIGURÕES


Ao que parece o governo de Portugal acha necessário assinalar com pompa e circunstância dois anos de existência, como se isso fosse um verdadeiro acontecimento. Não é, a não ser que até os seus membros achassem, como Pedro Passo Coelho pensava, que é um verdadeiro milagre aguentarem-se ainda em funções. A passagem do tempo, em governação ou numa qualquer atividade executiva, nada diz sobre a qualidade da mesma.
         Por outro lado, a ideia peregrina de convidar (pagando) pessoas escolhidas a dedo para simularem umas perguntas de ocasião aos vários ministros do Governo é ridícula, tonta, contraproducente, quer sob o ponto de vista mediático quer sob o ponto de vista político.
        
Ao ser descoberto o esquema de questionamento dos cidadãos ao Governo, este ficou numa posição frágil e risível, além da iniciativa ficar automaticamente desacreditada e ensombrada. Que valor terão aquelas perguntas, sabendo a população, que as pessoas que as fizeram foram pagas para tal? E que lá vão fazer os jornalistas, senão assistir a uma peça de teatro de baixa qualidade?
         Politicamente é ainda mais desastroso, pois dá a ideia de um governo que só sabe marcar autogolos, que perde tempo com futilidades e não sabe corrigir até os erros mais básicos.
         A não ser que os portugueses andem muitos distraídos, todos os benefícios propagandísticos deste evento já foram infrutíferos.
         
Se o Governo queria mesmo saber o que povo tinha para lhe dizer tinha três meios fáceis de o fazer.
- Enviava todos os ministros ao Parlamento e disponibilizava-se a responder a todas as questões que os deputados lhe endereçassem, de uma maneira simples e objetiva, sem remoques nem piadas;
- disponibilizava todos os seus ministros para entrevistas alargadas nas várias televisões, rádios e jornais, de maior audiência, e sujeitava-se às perguntas, sem condições prévias ou questões tabu;
- abria a Assembleia da República ao povo e permitia que o cidadão comum, sentado no lugar dos deputados, perguntasse, com urbanidade, o que entendesse.

Se, pelo contrário, querem aproveitar os media, as redes sociais, a pseudo liberdade que outorgam aos cidadãos de os questionar, para fazer propaganda de baixa qualidade, então, o melhor era terem dedicado o fim-de-semana à família.
Nós, cidadãos, não somos nenhuns figurantes da democracia e o mais certo é que estes almoços grátis acabem por ficarem caros aos figurões que nos querem fazer passar por figurinhas do regime.

P.S. Num ano em que morreram dezenas de portugueses por causa da má abordagem governamental ao flagelo dos fogos é de péssimo gosto qualquer evento comemorativo.


GAVB

sábado, 25 de novembro de 2017

A TRAGÉDIA

          
Morava eu na Quinta da Torrinha, Ameixoeira, e muito perto havia um cinema, nas Galinheiras (800 metros em linha recta). Era um cinema construído em madeira e com telhas de zinco.
Numa noite de Inverno, preparo-me para ir ao cinema às Galinheiras e, como chovia muito, calço uns botins de borracha, meto as calças para dentro e com um guarda-chuva, meto os pés ao caminho. A distância era curta, atravessava por um atalho de um olival e em cinco minutos, punha-me lá.
Começou a sessão de cinema, a chuva não parava de cair, cada vez com mais intensidade, a tal ponto que era com dificuldade que ouvíamos o som do filme, tal era o barulho que a chuva fazia nas telhas de zinco.
Uma hora depois, o filme é interrompido por razões técnicas, a chuva começava a entrar dentro do cinema, na plateia já dava pelos tornozelos.

Venho embora, sem acabar de ver o filme, mas com a promessa de a próxima sessão ser grátis para os detentores do bilhete dessa noite.
O trajecto de volta para casa foi aterrador. De noite, só com uma lanterna, tive medo e não vim pelo atalho; por segurança, resolvi ir pela estrada até à Ameixoeira e de lá para casa.
Naquela estrada, a água dava-me pelos joelhos, já nem as botas me “safavam”. De repente, ouço um som esquisito, viro-me para trás com a lanterna e reparo que, empurrada pela enxurrada da encosta do olival, vinha uma árvore na minha direcção, ainda tentei correr, mas a única que coisa que consegui foi cair. Por sorte caí numa valeta e a árvore passou por cima, levando o guarda chuva e um bocado do meu casaco preso a um ramo.
Pensei que morria. Já sem luz, tinha perdido a lanterna na queda, a muito custo consegui chegar a casa, rasgado, encharcado e cheio de lama.
Mas que noite, pensava eu, sem imaginar a tragédia que decorria a dois quilómetros do local aonde estava.

  • No vale de Odivelas, milhares de pessoas lutavam pela vida, no meio daquele dilúvio -  era a fatídica noite de 25 de Novembro de 1967.
Naquela noite morreram mais de 500 pessoas.

 António Correia
                         

sexta-feira, 24 de novembro de 2017

O CONSUMISMO COME O CÉREBRO

Hoje é dia BLACK FRIDAY. Provavelmente o dia do ano em que mais apetece consumir. É já uma data iconográfica.
Para mim é curioso ouvir quase sempre falar dos “direitos do consumidor”, quase nunca dos deveres. Isto acontece porque o consumidor é a parte fraca. Até já tem direito a dia para lembrar os seus direitos. Quanto aos deveres, ele cumpre na perfeição: consome até se consumir.
Consumir já nem é pecado. Tornou-se doença e dependência. Já nem é alvo de censura, mas de compreensão, tal é a impotência com que o enfrentamos. 
Consumir é uma droga legal. Tão legal que muitas economias plantaram o seu sucesso em cima dela. É claro que isso desequilibrou sociedades em geral e o indivíduo em particular, mas isso não interessa nada às máquinas registadoras com duas pernas e muitas mãos. Como são magnânimos e inteligentes permitem o dia do consumidor que, lá no fundo, apenas lhes presta homenagem.



Há mais de cinquenta anos, Kennedy criou o dia procurando que aos americanos fosse garantido o direito à informação, segurança, escolha e o direito a ser ouvido. Portugal só em 1996 consagrou esses direitos, em lei. De lá para cá a DECO tem sido das associações mais ativas em Portugal na sua defesa.
Claro que sei que consumir é uma necessidade humana, claro que reconheço a importância dos direitos dos consumidores estarem plasmados em lei. No entanto, a questão, para mim, transborda o campo legal. É sociológica.
O consumismo é o ato de comprar o que não se precisa, com o dinheiro que não se tem, para impressionar pessoas que não se conhece, a fim de tentar ser aquilo que não se é.
A sociedade ocidental (e agora também a oriental) tornou-se numa sociedade consumista. Uma sociedade de mercado, onde o dinheiro parece ser o único valor que conta, só existe se houver alguém que consuma porque sim.

Isso aconteceu quando o consumismo comeu o cérebro das pessoas. A vaidade e a futilidade fizeram o resto. A mais suprema das ironias é que consumir passou a ser chique, desejável, recomendável. Enfim, uma virtude. É ver a estratégia económica das cidades e até de países como Portugal: “Bom, bom é que venham cá e consumam muito”. É uma ideia de desenvolvimento económica errada, porque depende dos outros. É uma ideia socialmente egoísta que apenas vê o seu interesse. Jamais produzirá sociedades justas, quanto mais felizes ou ricas.
O consumismo é altamente destruidor. Destrói o planeta e o equilíbrio do Homem com a Natureza. Mina o apetite pela descoberta, pela experiência e nesse sentido atrasa a ciência. Mas a mais importante destruição é a do ser humano. Dos valores aos sentimentos a devastação é imensa. O melhor exemplo disso é o Natal, onde a hipocrisia e o consumismo estão a construir uma obra-prima digna do diabo.

O consumismo transformou os valores do ser humano ao entrar-lhe no âmago. Hoje, as pessoas são descartáveis como as coisas, porque as encaramos como objetos consumíveis tal e qual como uma peça de roupa que usamos uma ou duas vezes antes de a pôr definitivamente de lado. Já reparámos que consumimos despudoradamente os outros?
               

Não podemos deixar que o consumismo tome conta do espaço do amor, da amizade, da partilha, pois abrir-se-ão feridas enormes na alma que nos derrotarão com mais contundência que uma doença mortal.
O que temos que fazer é simples: deixar de comprar o que não precisamos. Ter a inteligência suficiente para distinguir entre a necessidade e o desejo.
Precisamos urgentemente de voltar a ter a parcela de liberdade que alienámos. Ela não está perdida, está no “prego”, à espera que tenhamos a coragem de a resgatar.  

GAVB

quinta-feira, 23 de novembro de 2017

OS CARNICEIROS TAMBÉM SE ABATEM



Estreou hoje nas salas de cinema portuguesas “O Homem do Coração de Ferro", filme de realizador francês Cédric Jimenez, que bem podia chamar-se O Carniceiro de Praga, cognome de Reinhard Heydrich.


Sob o ponto de vista puramente cinematográfico, o cineasta francês tinha condições para fazer melhor, pois ao seu dispor estavam atores da estirpe de Jason Clarke, o australiano que fez de Heuydrich, a bela Rosamund Pike (encarna o importante papel de mulher de Heydrich, começando muito bem, mas vai-se apagando com o decorrer do filme, o que é uma pena, pois o seu potencial é inegável), e os promissores Jack Renoir e Jack O´Connell, que vestiram a pele dos dois membros da resistência checa encarregues de assassinar o Carniceiro de Praga.

A grande força do filme está na personalidade hipnótica, desumana, cruel, assustadora de Heydrich, a quem o cognome de «carniceiro» assenta que nem uma luva.
Mais do que a resolução dos jovens checos em assassinarem um dos maiores ícones dos criminosos nazis, o que releva nesta película do Jimenez é a assustadora determinação do alemão em concretizar um plano de destruição total dos judeus (é de Heydrich e Müller a “Solução Final”, plano de assassínio em massa dos judeus, através dos campos de concentração e das câmaras de gás).

O filme começa com a cena decisiva – o momento do atentado, que ocorreu a 27 de maio de 1942, embora o alemão só venha a falecer uma semana depois.

Depois a película de Jimenez revela todo o percurso de ascensão de Reinhard Heydrich, desde o momento em que se casou com um dos membros do partido nazi até à altura em que se tornou numa figura incontornável dentro da elite nazi. 
No início nota-se a influência da mulher na sua personalidade, mas rapidamente a criatura ultrapassou o criador e até a sua mulher lhe ganha medo.
“O Homem do Coração de Ferro” mostra ao detalhe uma época, onde a disciplina alemã, o seu rigor e método estiveram ao serviço do mal.
Apesar de só agora chegar a Portugal, o filme já circulava pelas salas de cinema europeias há alguns meses. Entrou em Portugal agora para não coincidir com “Anthropoid”, de Sean Ellis, também focada no mesmo tema, mas o sucesso deste foi mínimo. Espera-se que o filme protagonizado por Jason Clarke tenha melhor sorte, até porque parece-me que este tem o condão de nos pôr a pensar até onde pode ir o ímpeto da alma humana quando se trata de ser… desumana.

GAVB

quarta-feira, 22 de novembro de 2017

INFARMED NO PORTO: O PRIMEIRO PASSO PARA A DESCENTRALIZAÇÃO?


Poucas horas depois do Porto ter perdido a Agência Europeia do Medicamento para Amesterdão (a candidatura do Porto ficou em sétimo lugar), o governo anunciou a transferência da sede do Infarmed, de Lisboa para o Porto, a partir de 1 de Janeiro de 2018.
Espero que não tenha sido uma espécie de prémio do consolação para a cidade nortenha, mas uma medida pensada, seguindo uma linha de descentralização que o país precisa.

O momento escolhido para o anúncio da decisão faz pensar mais numa medida emocional do que estrutural, infelizmente. E sendo assim, não valerá o sacrifício que muitos técnicos do Infarmed terão de fazer para manter os seus empregos, pois a sua vida estava organizada em Lisboa.

No entanto, não deixei de notar a estupefação com que os media receberam a notícia. “Como era possível o Infarmed ir para o Porto? E então a vida das pessoas, toda ela organizada nos arredores da capital? Que crueldade!” 
Tão cruel como tem sido para todas as pessoas do Porto, gente de enorme gabarito nas suas áreas profissionais e que servem o Estado português, que há décadas têm de mudar a sua vida para Lisboa, para poder continuar a trabalhar, abdicando da família ou desorganizando-a por completo. Gente que ano após anos fez incontáveis viagens de 300 km, enquanto outros lhes batiam umas hipócritas palmadas nas costas, lamentando a sua sorte, mas nunca pensando verdadeiramente passar pelo mesmo.
Talvez tenha chegado a hora de perceber o que significa 300 km todas as semanas; ficar longe dos seus, dias e dias seguidos.

A descentralização é uma forma de igualdade e justiça que precisamos de incrementar. Haverá sempre alguns danos colaterais, mas serão sempre muito menores que aqueles que a centralização do Estado provocou durante séculos.
Aguardo pela efetivação desta medida, pois um ano é muito tempo para se poder exercer pressões, para que ela não se realize. 

Entretanto espero que a minha intuição esteja errada e outros institutos e organismos do Estado descentralizem. Não para penalizar os lisboetas que neles trabalham, mas para que as outras cidades possam ter um real potencial de crescimento sustentado, feito através das nossas decisões organizativas. E talvez alguém descubra que se chega tão rápido de Lisboa ao Porto como do Porto a Lisboa, porque muitas vezes dá a sensação que Lisboa fica já ali enquanto Porto, Coimbra, Braga, Faro ou Viseu são de difícil acesso.
GAVB


terça-feira, 21 de novembro de 2017

DA TELEVISÃO PARA O COMPUTADOR E DESTE PARA O SMARTPHONE


Com a chegada da internet, o computador roubou o lugar à televisão, nas preferências das pessoas. A televisão não era portátil, não era tão interativa, nem permitia criar um menu pessoal. 
Por mais melhorias técnicas que as televisões apresentassem, o computador derrubava-as com facilidade, porque juntava prazer e trabalho na perfeição.
As redes sociais tiraram do poleiro o computador e lá puseram o smartphone. 
Absolutamente portátil, é uma espécie de três em um: televisão, computador e máquina fotográfica, sempre com a internet como pano de fundo.

Mais do que o computador ou a televisão, foi o smartphone que nos alterou os hábitos e o ritmo de vida. Foi ele que trouxe a inquietação permanente de estarmos conectados com o nosso mundinho privado e de olho no mundo exclusivo de quem está na moda. É lá que nos atualizamos a cada dez minutos, num tique nervoso que não conseguimos controlar, de tal modo se tornou viciante.
As grandes marcas tecnológicas investem tudo no desenvolvimento técnico dos smartphones e colocaram em segundo plano o investimento em computadores de ponta ou televisões com a mais perfeita das imagens.

A grande questão é se temos a perfeita consciência do caminho pessoal e social que estamos a percorrer com esta dependência física e psicológica de um objeto tão extraordinário quanto viciante? Se somos nó que guiamos a máquina para onde queremos  ir ou já é ela que nos formata?


Haverá gente com problemas de coluna, outros de visão, outros ainda sentirão dificuldade no contacto pessoal, apesar de serem virtualmente tão sociais. Será cada vez mais difícil participar num evento sem ter a tentação de o fotografar, filmar e publicar; tornar-se-á penoso para muitos assistir a um filme, a um concerto ou uma peça de teatro sem dar uma espreitadela ao último, tweet, à última foto ou publicação de fulano ou sicrano. 
E nessa altura já não o  faremos por querer, por termos a mania que somos especiais, mas apenas porque já não conseguimos deixar de o fazer. Nessa altura pouco mais será que uma dependência que nos consome e desgasta.
GAVB

segunda-feira, 20 de novembro de 2017

QUE ILHA LEVARIAS PARA UMA PESSOA DESERTA?



Provavelmente, uma ilha rica em recursos naturais e em pessoas sensíveis, cultas, bondosas e silenciosas. Gente que não tivesse medo do silêncio nem das palavras; gente que soubesse amar e ser amada.


Uma ilha onde a sobrevivência fosse possível, mas não oferecida em bandeja de prata; um lugar onde cada pessoa tivesse de se construir em relação, sem estatuto, sem poder, sem preconceitos.
Um espaço de descoberta e conquista interior, de partilha ou solidão.

Uma pessoa deserta é uma oportunidade de construção de personalidade que não se deve desperdiçar, porque a vida de cada PESSOA é muito mais do que areia sem alma a desaparecer na ampulheta do Tempo.

Por isso, a minha ilha teria sempre gente livre, diversa e provocadora de emoções.

Não sei se atravessar uma pessoa deserta é mais ou menos difícil do que atravessar um deserto, mas é certamente mais desafiante e motivador.

GAVB

domingo, 19 de novembro de 2017

AGORA É GOTA A GOTA




Acordou, como sempre, mal disposto e cambaleou até à casa de banho. Abriu a torneira e esta apenas tossiu um espirro de água… despertou os sentidos imediatamente! 
«Que brincadeira era aquela!?»
Rodou o manípulo, mas obteve apenas um esgar envergonhado, como resposta da companhia de águas. Correu até às outras torneiras. O resultado era idêntico. À quarta torneira, o alarme da sobrevivência foi ativado: recolheu em copos todas as gotas que as brilhantes torneiras guardavam nas canalizações. Tinha de lavar a cara, os dentes, tomar o pequeno-almoço. Tomar banho estava, obviamente, fora de questão.

No caminho para o trabalho recebeu uma SMS da companhia que fornecia a água: «A partir do dia X, o consumo de água será racionado. Por mês apenas poderá gastar y m3. O fornecimento da rede pública apenas será ativado das 7.30 às 8.30; das 11.30 às 14h e das 19 às 21.30.»

“Água racionada!?” Quem diria? Ele, que ganhava mais de dez mil euros por mês, que se fazia transportar num ultramoderno carro híbrido e usava a mais avançada tecnologia de comunicação, não tinha ÁGUA para tomar um simples duche.

Três semanas mais tarde, a revolta passara, mas o pesadelo não! Comprara umas centenas de litros de água potável no supermercado, que guardava ciosamente na despensa. Agora, a água, no supermercado, estava quase sempre esgotada, apesar do preço ter subido 500%.

Lá em casa a vida mudara também. Todos procuravam a hora do jantar para tomar banho e acordavam mais cedo, precisassem ou não de sair de casa; fazia-se contas diárias à cota de água ainda disponível; vigiava-se qualquer gasto supérfluo de água. Os banhos não podiam exceder os cinco minutos; a máquina de lavar roupa só trabalhava em dias de lotação esgotada (e como isso mudara a gestão descontraída do guarda-roupa!); deixara de se ouvir o som da água a correr.


A água (ou a falta dela) passara a ser tema de conversa como se um anónimo serviçal se tivesse tornado no único herdeiro da fortuna familiar. Discutia-se o buraco do ozono, as medidas estruturantes para devolver água potável ao planeta, os culpados (Como se isso desse de comer à fúria ou trouxesse a água de regresso às torneiras, sem restrições). Demorou tempo a discutirem o essencial: O que podiam fazer? A partir daquele momento já só podiam adaptar-se a uma nova forma de viver, onde a agua era um bem escasso.

De vez em quando a Raquel recordava os longos banhos de 50 minutos, com água quente sempre a correr e muita espuma, mas já nem ousava verbalizar essas memórias, com medo da reação do resta da família.
Os meses passaram e todos perceberam que o racionamento tinha vindo para ficar. Também ele se tornara um ícone da modernidade como o smartphone, o carro elétrico, a televisão inteligente ou as viagens de avião de três em três meses, para uma escapadinha de fim-de-semana.

Rita percebera que aquela treta da poupança de água, que a professora de Ciências vendia todos os anos como uma pedinte sem sorte, tinha-se tornado cruel realidade. Também para eles que nunca tiveram problemas de dinheiro. Agora tinha um que não podiam resolver pagando.
Ricardo recordou o dia em que a torneira se engasgou. Não fora um sonho mau.
GAVB

sábado, 18 de novembro de 2017

UM GRANDE ACORDO PARA O GOVERNO, MAS FRACOTE PARA OS PROFESSORES


Assinado o acordo, os professores vão ter de o aguentar, pelo menos, mais um ano ( e não apenas até 15 de Dezembro), apesar do governo não o poder garantir de todo, dado que ele pressupõe a sua efetivação lá para 2023, ou seja, final da próxima legislatura, altura em que ninguém sabe se o PS estará no governo e. portanto, a validade do acordo alcançado entre Governo e os sindicatos de professores seja pouco mais do que um processo de intenções.

No jogo de cintura entre sindicatos e Governo, os professores lá marcaram o seu golinho, mas quem saiu vencedor foi mesmo o governo. Senão vejamos:
António Costa não vai pagar mais do que tinha previsto aos professores em 2018;

A reposição salarial dos professores será feita apenas a partir de 2019 e pode prolongar-se até 2023;
O atual governo do PS apenas é obrigado a orçamentar 20% dessa reposição, pois só é responsável pelo Orçamento do 2019. E não é nada certo que esse OE passe pois as posições da esquerda vão endurecer, daqui a um ano;
Com o acordo negociado com o governo, os professores ficam sem grandes razões para grandes reivindicações salariais perante este governo;
Se, daqui a dois anos, o governo não for do PS, 80% do acordo fica por cumprir, porque PSD e CDS não se comprometeram politicamente com nenhum tipo de reposição;
O governo conseguirá entreter os professores durante todo o ano de 2018, sem se comprometer grandemente, porque só precisa de começar a pagar reposições a sério a partir de 2019. Se tiver folga orçamental para o fazer, fá-lo-á e capitalizará politicamente, se não houver realmente dinheiro para ir repondo a todos, veremos pouco mais do que «rebuçados».

A pequena-grande vitória dos professores foi o primeiro-ministro ter feito marcha atrás na contagem, para efeitos de progressão, dos nove anos e quatro meses, em que os professores estiveram congelados. António Costa queria apagar esse tempo. Cedeu, mas pouco, até porque até 2023 muitos professores irão para a reforma, sem terem sido reposicionados no escalão a que tinham direito e portanto perderão parte dos seus direitos «para sempre».
Post Scriptum: mais uma vez foram os professores a exporem-se, a ir à frente nas reclamações, entre as diversas carreiras da função pública (com a honrosa exceção dos enfermeiros), a levar com a ignorância e as críticas mal-intencionadas de gente que cresceu a odiar professores. Entretanto, outros ganharão pela calada.

GAVB   

sexta-feira, 17 de novembro de 2017

BRUNO DE CARVALHO ESTÁ DESCONTROLADO E PRECISA DE ALGUÉM QUE O PARE URGENTEMENTE



De há uns meses para cá o destempero verbal do presidente do Sporting tem aumentado muitíssimo, atingindo atualmente um nível inimaginável.
O insulto gratuito, desproporcionado e violento tornou-se uma prática tão recorrente que é quase impossível que até o cidadão mais desatento ao mundo do futebol não se recorde de um deles.

Bruno de Carvalho insulta tudo e todos, sejam eles dirigentes dos clubes adversários, ex-dirigentes do seu próprio clube, presidentes de órgãos disciplinares, jornalistas, empresários, adeptos de clubes adversários, sócios e simpatizantes do próprio clube. Não poupa ninguém e parece sempre a escalar o nível do insulto, de tal modo que se torna constrangedor comentá-lo, falar da sua postura, da sua educação.
Nos últimos dias, mesmo sem grande provocação, à mínima crítica a sua incontinência verbal bateu recorde atrás de recorde. Anotemos alguns exemplos.

Sobre Luís Filipe Vieira e a sua entrevista à BTV, onde vaticinou, com alguma basófia, que o Sporting não ganharia novamente nenhuma competição este ano:
«A entrevista de Vieira é de um perfeito idiota!»

Sobre Paulo Pereira Cristóvão, que sugere ter documentos que comprometem a seriedade do presidente leonino, na venda do passe de Tanaka:
«Vá chatear para o raio que o parta.»

Sobre o seu adversário nas últimas eleições, Pedro Madeira Rodrigues:
«Sonso e idiota.»

Sobre o jornalista Rui Santos, que ainda hoje escrevia ser precisa uma entidade que ponha Bruno de Carvalho no lugar:
«Paineleiro mexeriqueiro, com feitio de gaja».



Há nove meses, depois de ser reeleito presidente do Sporting Clube de Portugal, sem que nada o fizesses prever, e no discurso de vitória, Bruno de Carvalho já se tinha saído com esta:
«Bardamerda para todos aqueles que não são do Sporting Clube de Portugal.»
Pensei que fosse apenas um péssimo momento, mas nos últimos dias a linguagem tem descido a um nível inimaginável que é urgente que alguém pare, literalmente, o presidente do Sporting. Para seu bem, para bem do Sporting, para bem do Desporto em Portugal.

GAVB

quinta-feira, 16 de novembro de 2017

SE ESTIVERES BÊBADO, NÃO ADIANTARÁ DARES À CHAVE




Por enquanto ainda é só uma ideia dos deputados do Parlamento Europeu, mas é provável que passe à prática daqui a alguns meses, pois o objetivo parece-me meritório.
Tentando reduzir ainda mais os acidentes rodoviários causados pelo excessivo consumo de álcool, os deputados europeus querem aprovar uma norma que obrigue todos os condutores profissionais assim como aqueles condutores que já causaram pelo menos um acidente sob o efeito do álcool a usar, nas suas viaturas, um dispositivo de bloqueio de ignição. 
Este dispositivo obrigaria os condutores a ‘soprar no balão’ antes de ligar o carro. E só no caso de não se detetar qualquer vestígio de álcool no sangue é que o carro começaria a trabalhar.


Paralelamente com a introdução deste dispositivo de segurança anti bêbados, o Parlamento Europeu quer impor a taxa 0,0% de álcool no sangue para novos condutores e condutores profissionais.


Ainda no que diz respeito a normas de prevenção e segurança rodoviária, os deputados do Parlamento Europeu propõem a instalação em todos os veículos novos de sistemas de assistência ao condutor, que incluam travagem de emergência automática e aviso para saída de estrada, quando se detetar que o condutor já conduz há mais tempo do que as normas de segurança recomendam.
Falta saber a recetividade da indústria automóvel, que tem apostado forte na renovação tecnológica e por certo não quererá perder o desafio da segurança preventiva.


A Ford, por exemplo, criou o boné anti-sono para os condutores profissionais. Este boné foi desenvolvido para captar o mínimo sinal de fadiga e cansaço dos condutores de longo curso, como é o caso dos condutores de camiões de transporte de mercadorias. Nessa altura, o boné procurará alertar o condutor de que deve parar o mais rapidamente possível através de sinais luminosos, sonoros e vibratórios.

GAVB