Numa
noite de Inverno, preparo-me para ir ao cinema às Galinheiras e, como chovia
muito, calço uns botins de borracha, meto as calças para dentro e com um
guarda-chuva, meto os pés ao caminho. A distância era curta, atravessava por um
atalho de um olival e em cinco minutos, punha-me lá.
Começou a
sessão de cinema, a chuva não parava de cair, cada vez com mais intensidade, a
tal ponto que era com dificuldade que ouvíamos o som do filme, tal era o
barulho que a chuva fazia nas telhas de zinco.
Uma hora
depois, o filme é interrompido por razões técnicas, a chuva começava a entrar
dentro do cinema, na plateia já dava pelos tornozelos.
Venho
embora, sem acabar de ver o filme, mas com a promessa de a próxima sessão ser
grátis para os detentores do bilhete dessa noite.
O
trajecto de volta para casa foi aterrador. De noite, só com uma lanterna, tive
medo e não vim pelo atalho; por segurança, resolvi ir pela estrada até à
Ameixoeira e de lá para casa.
Naquela
estrada, a água dava-me pelos joelhos, já nem as botas me “safavam”. De
repente, ouço um som esquisito, viro-me para trás com a lanterna e reparo que,
empurrada pela enxurrada da encosta do olival, vinha uma árvore na minha
direcção, ainda tentei correr, mas a única que coisa que consegui foi cair. Por
sorte caí numa valeta e a árvore passou por cima, levando o guarda chuva e um
bocado do meu casaco preso a um ramo.
Pensei
que morria. Já sem luz, tinha perdido a lanterna na queda, a muito custo
consegui chegar a casa, rasgado, encharcado e cheio de lama.
Mas que
noite, pensava eu, sem imaginar a tragédia que decorria a dois quilómetros do
local aonde estava.
- No vale de Odivelas, milhares de pessoas lutavam pela vida, no meio daquele dilúvio - era a fatídica noite de 25 de Novembro de 1967.
Naquela noite morreram
mais de 500 pessoas.
António Correia
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