Em França o assunto do momento já não é a humilhante
derrota da seleção gaulesa frente aqueles nojentos dos “Bidonville”, mas o
salário do cabeleireiro do presidente Hollande: dez mil euros. Sim, dez mil
euros para pentear um careca, ou melhor, a calvície de um presidente que exibe algumas melenas na cabeça. Deve ser trabalhoso ter de lavá-las, penteá-las,
pintá-las e portanto dez mil euros é um ordenado perfeitamente aceitável.
O fait-divers diverte a França que se mostra indignada com o
seu presidente e levou François Hollande a responder: “Fiz diminuir o orçamento
do Eliseu de 109 milhões de euros para 100 milhões, desde 2012 até agora. Reduzi 10% ao efetivo do
Eliseu. (…) O meu salário foi reduzido em 30% e vêm ter comigo por causa de um assunto
do qual não sou o primeiro responsável? Admito qualquer crítica, mas essa não!”
Hollande esteve bem na resposta, exceto no facto de… ter
respondido, não respondendo.
Hollande respondeu com aquilo que deve ser respondido:
a despesa com o pessoal do Eliseu baixou; o ordenado do presidente baixou. O
resto não interessa. Se não interessa, por que se deu ao trabalho de responder?
E, optando por responder, por que não respondeu ao que lhe foi perguntado? Se
ele não é o responsável pelo seu cabeleireiro pessoal, quem é?
A situação é ridícula e embaraçosa, mas a melhor maneira de
a enfrentar ter sido não lhe responder ou dispensar os serviços de um
cabeleireiro que a careca do presidente não justifica.
A resposta do presidente a este divertido fait-divers suscita-me no entanto uma outra reflexão: Hollande não se preocupou em explicar
aos franceses o anémico crescimento económico da França, os problemas com os
emigrantes, os sucessivos incumprimentos do défice público, a insatisfação dos
trabalhadores, mas teve necessidade de justificar o salário bruto de um
cabeleireiro, para dizer que era uma tontice. Daqui se pode concluir que
Hollande só responde a tontices, porque para assuntos sérios não tem resposta.
Este fenómeno não é um exclusivo do presidente francês, mas
de muitos políticos um pouco por todo o mundo. São notícia pelos faits-divers,
estão sempre dispostos a alimentá-los quando não a provocá-los, mas fogem a perguntas sérias e objetivas sobre os principais problemas dos povos
que governam.
Esta maneira oportunista e pequenina de atuação política e
gestão da informação pública é estupidamente alimentada pelos media,
especialmente a imprensa, que, em busca do último caso para entalar o seu odiozinho político de estimação, gasta o tempo e a paciência das pessoas com
assuntos menores e esquece de apresentar e explicar o plano governamental (ou
presidencial) para as diversas áreas económicas, sociais, culturais. Graças a
esta gestão show off, vários diretores, ministros, primeiros-ministros escapam ao escrutínio das suas medíocres
decisões, das suas omissões, dos seus enganos.
Quando passamos a vida a discutir o superficial, obviamente
o essencial fica por avaliar. Depois é fácil escolher outro porque o resultado
deste foi mau. O problema é que poucos sabem dizer por que correu mal, o que
teria sido possível fazer de diferente nas circunstâncias em que determinadas
decisões ocorreram.
Discutir o cabeleireiro de um careca é divertido, mas não
deve ocupar mais tempo que o de uma boa anedota.
Gabriel Vilas Boas
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