Não serão poucos os
que, vítimas da sua própria boa-fé ou ganância, já caíram no conto do vigário… Acreditaram numa história
bem contada e, seduzidos pelas vantagens aparentes que os burlões lhe
ofereciam, acabaram ludibriados.
Os vigaristas – que efetivamente não olham a meio para atingir os seus
fins – recorrem aos mais variados estratagemas (todos fraudulentos!) com o
objetivo de extorquir dinheiro aos pobres incautos…
Ora, a este golpe perpetrado
pelo vigarista dá-se o nome de conto do vigário. Mas vigário não é sinónimo de pároco, alguém que à partida é uma
pessoa idónea e séria? Como pode então a palavra ter adquirido um sentido
pejorativo?
De facto, o termo vigário designa um padre que substitui
outro no exercício das suas funções, como quando se fala, por exemplo, de
vigário-geral, está-se a referir o padre a quem o bispo delega as funções de
gestão da vida diocesana e não um vigarista.
Contudo, antes de
adquirir este significado eclesiástico, vigário
já tinha o sentido genérico de “indivíduo que substitui o outro”, pois provém
do latim vicarium – “aquele que faz
as vezes de outrem”; “substituto”. Trata-se de uma palavra formada a partir do
substantivo vicis – “vez” (do qual
também derivou “vice”, elemento que entra na composição de várias palavras e
que traduz uma ideia de substituição e subalternidade).
Mas qual dos vigários é
responsável pela expressão conto do vigário?
Ninguém sabe dizer ao
certo se o primeiro intrujão terá sido um pároco, alguém que pretendia fazer-se
passar por familiar ou amigo de confiança de um padre ou apenas um finório à
caça de alguns trocos.
Como é costume ouvir-se
em alguma publicidade feita por bancos, hoje em dia ninguém empresta nada sem
uma garantia. E é provável que sempre tenha sido assim. Consciente de tal
facto, o primeiro vigarista concebeu
um estratagema brilhante, cuja “receita” era a seguinte: começar por escolher o
papalvo a ludibriar; convencê-lo de que a sua honestidade estava acima de
qualquer dúvida; confiar-lhe provisoriamente e por motivos de força maior um
embrulho que deveria conter muito dinheiro; aproveitar para pedir uma pequena
soma, em jeito de adiantamento, para pagar algumas despesas urgentes. Como o
embrulho não tem qualquer valor, o pouco que o vigarista consegue arrecadar é ganho, pois ele não tem qualquer
intenção de voltar ao sítio da burla para recuperar o pacote.
Outras versões divulgam
uma receita um pouco diferente, pois o vigarista alega que o
dinheiro lhe foi entregue pelo vigário da freguesia ou que provém de uma
herança.
Há uma versão
particularmente curiosa, segundo a qual um português, recém-chegado ao Brasil,
se faz passar pelo herdeiro de uma grande fortuna de um vigário. Na promessa de que tudo haveria de pagar quando recebesse
a herança, lá foi comendo e bebendo às custas de quem pode. Mas claro, nunca
chegou a saldar as dívidas!
Mas onde terá nascido o
conto do vigário? Fernando Pessoa
escreve: “Ninguém já engana ninguém – o que é tristíssimo – na terra natal do
Conto-do-vigário”. Através deste registo cai por terra a ideia de que a
expressão tenha sido criada no Brasil. Terá sido então, em Portugal, que alguém
muito astuto e velhaco terá dado à luz tal evento? Ou terá sido em Espanha? É
que em espanhol esta vigarice é
conhecida como cuento del tio, pois nas histórias do golpista menciona-se a
herança que um tio vigário terá
deixado a um sobrinho órfão. Em italiano, usa-se a expressão truffa
all’amaericana (“golpe à americana"), o que pode responsabilizar os
americanos pela criação de tal famosa intrujice. Em inglês, por ironia,
conto do vigário diz-se confidence game ("jogo de
confiança”) e vigarista, confidence man, à letra, “homem de confiança”.
No entanto a dúvida persiste quanto à paternidade de tão famoso e proveito conto...
No entanto a dúvida persiste quanto à paternidade de tão famoso e proveito conto...
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