Em 1984, com
alargamento em 1994, a Unesco classificou a Mesquita e o centro histórico de
Córdova como Património da Humanidade. A cidade que outrora era conhecida como
a Constantinopla do Ocidente, simultaneamente pérola da Espanha árabe e ícone
da Reconquista, tem como grande atração histórica, cultural e arquitetónica a
mesquita de 19 naves, reconvertida em catedral, construída no sítio onde havia
um templo de Jano. Mas Córdova tem também o Alcazar dos Reis Cristãos, o
Palácio episcopal (século XVI), o Bairro Judeu.
Praticamente nenhuma
outra cidade espanhola evoca o tempo em que o domínio do Oriente se estendia de
Damasco à Península Ibérica como Córdova.
No ano de 711 vieram
exércitos muçulmanos do norte de África e, num ataque inesperado, conquistaram
a Espanha. O príncipe dos Omíadas Abd ar-Rahman I fez de Córdova o centro do
seu emirato “Al Andalus”.
Começou, então, uma era
de prosperidade inigualável. Sob o domínio dos novos soberanos e graças a
sofisticados métodos de irrigação, a campiña
ressequida transformou-se numa região florescente. Córdova converteu-se num
centro cultural e científico, na mais rica e importante cidade da europa.
A força e a capacidade
de realização da cultura árabe concretizaram-se numa atividade arquitetónica
que ainda hoje é visível. O Casco Viejo, o maior centro histórico de Espanha,
em termos de superfície, é puro encanto feito pedra. Por detrás das muralhas da
cidade, caiadas de branco, quase nada mudou no primitivo traçado árabe. As ruelas
estreitas entre as casas cubiformes configuram um labirinto proliferante de
praças, pátios e arcadas. Vivendas urbanas com varandas de ferro forjado,
vão-nos escoltando até ao bairro judeu e à sinagoga, que existem ainda hoje. O
espírito de tolerância reinante no emirato permitia uma coexistência pacífica
entre muçulmanos, judeus e cristãos – um feito civilizacional pouco imitado,
mas fundamento da ascensão de Córdova.
“Cidade das maravilhas”,
assim denominavam os mouros a sua cidade. Entre essas maravilhas
arquitetónicas, conta-se a Mesquita, única construção do género, em toda a
Espanha, que escapou à sanha destruidora dos guerreiros da Reconquista cristã.
O despojamento exterior encerra um interior esplendoroso. Através da “Porta
do Perdão” e do “Pátio das Laranjeiras” chega-se à grande Sala das Orações, com
a sua floresta de colunas marmóreas – 856 ao todo – e arcos duplos, em forma de
ferradura, listrados a vermelho e branco. Um espetáculo de cortar a respiração
cuja elegância austera se constrói sobre a geometria. Como o Alcorão proibia o
recurso a imagens na decoração, os artistas muçulmanos, apaixonados pelo
pormenor, revestiam as paredes, os portais e as cúpulas, com uma grande
variedade de padrões ornamentais e motivos abstratos, geométricos e vegetais,
utilizando também caracteres do alfabeto árabe.
O centro do culto muçulmano
- o recanto das orações – forma uma estrela de oito pontas, virada para Meca
que se encontra no extremo da nave central. É encimado por uma cúpula alta, artisticamente
decorada com baixos-relevos e mosaicos, sob a qual o Imã recitava as suras do
Alcorão. A acústica era de tal modo excelente que, mesmo nas últimas filas da
sala de orações, os fiéis podiam ouvir as suas palavras.
São praticamente
indetetáveis as numerosas ampliações do edifício primitivo. Porque, crescendo a
cidade, também tinha que crescer o espaço de oração sob o teto da Mesquita.
Porém, os sucessivos emires e califas preservaram o estilo de construção, de
modo que a sala de orações parece constituir uma peça única de dimensões
gigantescas. Quando se deu a queda do califado de Córdova, em inícios do século
X, a construção da mesquita culminara na aparência que ainda mantém hoje.
Conquistada a cidade
pelo exército de Fernando, o Santo, a tolerância reinante não sofreu
alterações. Se, em toda a Espanha, a Mesquita de Córdova foi a única que
escapou à sanha destruidora dos cristãos, pelo menos a princípio, o facto ficou
a dever-se a esse espírito tolerante. Nas imediações da Mesquita e sobre as
ruínas de um balneário oriental, os novos reis ergueram o seu alcazar fortificado,
de onde conduziram a queda do último bastião árabe, a cidade de Granada.
A Mesquita manteve-se
intacta até 1523. Nesse ano o clero decidiu assinar, de forma indelével, o
triunfo do Cristianismo sobre o Islão. Partes da Sala de Orações foram
arrancadas, a fim de criar espaço para uma catedral no meio da Mesquita. A
partir daí, a presença do pesado templo cristão tem constituído um corpo
estranho que é impossível ignorar no meio da floresta de arcos e colunas.
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