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domingo, 7 de junho de 2015

ADOÇÃO SIGNIFICA... APRENDER A AMAR




A adoção, como todos sabem, é um complexo processo burocrático. O que todos ignoram é o turbilhão de emoções sentidas, quer pelos pais quer pela criança: expectativas, esperança, felicidade, medo, receio e frustração.
Quando a criança é institucionalizada, sente que foi abandonada pelos progenitores. Deixa de confiar nos adultos porque não percebe o que está a acontecer. Está no meio de um processo que não entende. Apesar de viver em condições precárias, esse era o seu mundo, o mundo ao qual foi vilmente arrancada.

Um dia, aparecem pessoas, que legalmente, serão seus pais mas que não conhece, por quem nada sente. Mas são essas pessoas que a podem resgatar da instituição onde não gosta de estar. (Por muito boa que seja a instituição, não é um lar, é impessoal, o carinho das funcionárias não chega a todos, não há privacidade…).
Como convencemos uma criança fragilizada a confiar e a amar desconhecidos? Mãe, não é aquela que nos deu o ser? Pai, não é aquele que nos acompanha a par e passo? Quem são estes senhores que dizem ser os meus pais?

Nesse dia, a criança sai da instituição de mãos dadas com os “novos” pais a quem chama “mãe” e “pai”. Estas crianças desenvolvem um grande espírito de sobrevivência e tudo fazem para sair da instituição, até dizer o que os pais querem ouvir. Neste caso, após um processo tão longo, ouvir a palavra “mãe” ou “pai” é uma sensação indescritível.
Nesse momento começa uma grande aventura chamada “construção de afetos”.
Esta aventura passa por várias fases. A primeira é a do Encanto: os primeiros dias são maravilhosos, todos estão muito felizes, todos concretizaram um sonho. Nesta fase, tudo é permitido. Não há compromissos nem castigos, somente presentes e brincadeira.
Depois, vem a fase de regresso à realidade, onde surgem compromissos, responsabilidades… e, a adaptação. Esta ocorre para ambas as partes, os pais têm um filho e o filho tem pais… Uma nova realidade para todos. A criança tem de apreender as regras da família (diferentes de lar para lar) e valores que não são os seus. Depara-se com um mundo novo, um mundo ao qual não pertence: novas regras de higiene, novo tipo de alimentação, novo horário de deitar, nova escola e, por vezes, nova religião.

A criança sente-se perdida no seio de pessoas que desejam que, de um dia para o outro, faça tudo direitinho e esteja integrada como se naquela família tivesse crescido.
Aos poucos os afetos vão surgindo, a criança começa a sentir que aqueles desconhecidos que apareceram na instituição a querem amar e proteger.
“Mas, oh desespero, e se eles me abanam também?” – Aí começa a fase mais complicada de todo o processo. A criança usa um mecanismo de defesa: o teste aos limites. Basicamente, este teste serve para que a criança perceba até que ponto os pais a amam e vão, ou não, lutar por ela. A criança ultrapassa todos os limites da má educação, da desobediência. Não cumpre regra alguma, parte, estraga, insulta… enfim, leva os pais à loucura!

O que a criança pensa é: “se não me abandonares agora, nunca o farás. Portanto, posso confiar em ti.”
Volvida esta fase, a criança deixa-se levar pelos sentimentos, deixa-se amar e passa a amar. Dia após dia, a criança sente-se mais integrada, mais confiante, mais segura. Sente que é parte integrante de um todo: a Sua família. Os laços intensificam-se. Os afetos, a dependência, a proteção, o conforto crescem de dia para dia e dão lugar à Felicidade.
Os afetos constroem-se todos os dias, não aparecem porque um juiz e uma assistente social decidiram que assim tinha de ser.  

Léa Valéria Pinheiro

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