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segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

GRÂNDOLA, VILA MORENA, de Zeca Afonso


Zeca Afonso partiu há trinta e três anos, deixando uma saudade imensa entre os portugueses. Ele era a personificação musical das melhores conquistas do 25 de abril de 1974: liberdade, fraternidade, democracia.
Na década de sessenta e setenta ele foi a voz do povo na luta contra o fascismo, a ditadura, a injustiça social. Sendo assumidamente de esquerda, a sua música estava para além da ideologia e unia pessoas de diversos quadrantes políticos, ideológicos, sociais e geográficos.
Zeca Afonso “fazia” uma música simples, de raiz popular, mas profundamente portuguesa. Há nas suas composições musicais a saudade, a tristeza, a esperança de tempos melhores, assim como a denúncia das injustiças sociais que caracterizavam a sociedade portuguesa do terceiro quartel do século XX.

A sua música era simples sem nunca ser simplória, pois brotava da alma lusitana e nela se reconhecia a esmagadora maioria dos portugueses. As letras comunicavam ideias justas e claras, assumiam posições políticas, denunciavam.
Há muitas canções que ainda hoje são trauteadas por milhões de compatriotas, com emoção. Hoje quero apenas concentrar-me numa “Grândola Vila Morena”. Escolhida pelo Movimento das Forças Armadas (MFA) para servir de senha/sinal para o começo da Revolução de Abril de 1974, tornou-se um ícone dessa mesma revolução, pois resumia muitos dos valores que se pretendiam restaurar em Portugal: democracia (“o povo é quem mais ordena”), fraternidade, liberdade.

Poucas canções alcançaram aquilo que “Grândola Vila Morena” conseguiu: símbolo duma revolução sem sangue; emblema da recuperação da liberdade de expressão, fator de união entre um povo demasiado oprimido.
Se reparamos bem, não há nada de excecional na letra ou na música, mas a sua simplicidade refletia a limpidez de alma de um povo que procurava renascer dum longo inverno de privações. O povo português revia-se nela, porque ela traduzia os seus desejos mais intrínsecos e básicos.


Passadas três décadas, não encontro outra música que nos unisse tão profundamente como a composição de Zeca Afonso, nem vislumbro algo que defina tão categoricamente um período social e histórico como o “Grândola Vila Morena”.
No meu entender, o grande segredo da música de Zeca Afonso era a sua raiz popular e despretensiosa, mas que ao mesmo tempo penetrante, ousada. Não havia dúvidas sobre o que queria dizer com os “Vampiros” ou “A Formiga No Carreiro”.
Acho que a música de Zeca Afonso foi mais um fenómeno social que político. A música do Zeca trouxe as pessoas para a rua, acordou-as para a vida e pô-las a cantar o que lhes ia na alma. Talvez não fosse má ideia que os músicos portugueses atuais pensassem nisto:
 Que fotografia musical deixaremos destes tempos de frustração coletiva? 

 Gabriel Vilas Boas

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