A 21 de janeiro
de 1793, Luís Bourbon, antigo rei Luís XVI – que perdera o trono de França
quando a monarquia fora abolida em setembro do ano anterior -, subiu ao cadafalso
e pôs, serenamente, a cabeça debaixo da guilhotina. Depois do golpe fatal, o
mais novo dos guardas, um rapaz com cerca de dezoito anos, agarrou
imediatamente na cabeça e mostrou-a ao povo, dando a volta ao cadafalso. A
princípio fez-se um silêncio terrível, mas por fim alguém gritou «Vive la République».
A pouco e pouco, as vozes multiplicaram-se e em menos de dez minutos este grito
tornou-se o brado universal da multidão e todos os chapéus se ergueram no ar.
Este foi o momento culminante de mais de três anos de agitação em França, ou seja, todo o
período que se seguiu à revolução francesa.
A sentença de
morte tinha ficado decidida a 9 de dezembro de 1792, dois dias depois de
Robespierre ter declarado que «Luís tem de morrer para que o país possa viver».
Ainda que à tangente, a Convenção Nacional votou a favor da execução do
anterior rei. No cadafalso, Luís recusou ser amarrado e instou os carrascos a
cumprirem a ordem que lhes tinha sido dada.
A execução do antigo
rei de França chocou toda a monarquia europeia e poucos anos mais tarde já a
França andava em guerra com Espanha, Inglaterra, Holanda, Prússia e Áustria. A política de terrorismo de Estado levada a
cabo por Robespierre, segundo ele para proteger a República, foi das maiores
manchas sobre os ideais da revolução francesa.
Lembrei-me
disto, porque duzentos e vinte anos depois a França aparece como a grande guardiã
dos valores da tolerância, da liberdade de expressão, da igualdade e da fraternidade.
Há poucos mais de duzentos anos, Luís XVI
tornou a guilhotina a máquina de morte mais conhecida de sempre. Nesses anos
loucos, em Paris, foram decapitadas quase 2800 pessoas! Que número assombroso!
No país da
liberdade, dos ideais iluministas, a revolução da igualdade, liberdade e
fraternidade fazia-se com decapitações. Calcula-se que entre 1792 e 1799 tenham
sido decapitadas mais de quarenta mil pessoas!
Não há culturas
superiores! O que há é culturas com valores diferentes e, desejavelmente, complementares.
A arrogância cultural é facilmente desmentida pela História e, caso pretendamos
que outros povos atinjam patamares superiores de humanidade, o melhor é
investir no exemplo, na colaboração e paciência.
Gabriel Vilas Boas
"Lembrei-me disto, porque duzentos e vinte anos depois a França aparece como a grande guardiã dos valores da tolerância, da liberdade de expressão, da igualdade e da fraternidade."
ResponderEliminarVeremos. Veremos se a França consegue segurar estes valores superiores.