A primeira semana de janeiro trouxe a
Portugal os problemas mais previsíveis de qualquer início de inverno: uma vaga
de frio e enorme afluência de doentes às urgências dos hospitais. Mas, ao que parece, as bem
pagas administrações hospitalares não estavam à espera do sucedido e ocorreram
uma série de “pequenos imprevistos”: a maioria das pessoas esperou em média
cinco ou mais horas para ser atendido por um médico; os bombeiros viram as suas
macas retidas várias horas porque os hospitais não tinham camas para colocar os
doentes e, para completar o quadro, alguns doentes acabaram por falecer num
corredor da urgência dum hospital, sem terem sido vistos por um médico que lhes
valesse. De tanto esperar, desistiram de viver!
O sistema nacional de saúde é o bem
mais precioso que o país tem! As urgências hospitalares são o coração do
sistema e nelas estão concentrados todos os meios técnicos e humanos de
socorro imediato ou não fossem “urgências”. Nos hospitais, o país investe muito
dinheiro, fazendo dos médicos os funcionários públicos mais bem remunerados do
país, comprando, na maioria dos casos, os fármacos que são prescritos,
adquirindo os meios de diagnóstico e tratamento necessários às boas práticas
médicas. A isto acresce que o país tem hospitais e centros de saúde, espalhados
pelo território, em número mais que suficiente para atender à população.
Então, qual a razão destas indecorosas
mortes? Parece-me óbvio que faltam recursos humanos e que os que existem são
(foram) muito mal geridos, nestas últimas semanas.
Como é possível que as administrações hospitalares tenham permitido que os médicos marcassem férias para esta altura do
ano, onde é mais que previsível uma enorme afluência de doentes aos hospitais?
O senhor doutor tem direito a elas? Pois tem, mas há alturas do ano em que
devia ser vedada a possibilidade dum médico marcar férias. Isso acontece com
outras profissões do Estado, como por exemplo, os professores. Se as
administrações não têm poder para isso, que a peçam à tutela; agora, deixar
morrer um velho num corredor de hospital como um cão é que não!
Tivemos e continuamos a ter,
infelizmente, o caricato problema da falta de camas para colocar os doentes
internados. Os hospitais portugueses têm camas suficientes, mas alguns estão
fechados e outros com lotação longe de esgotar. Por que será que os doutos
administradores da saúde pública portuguesa não fizeram a tempo uma transferência ordenada de doentes para que aquelas unidades de saúde que têm
urgências pudessem receber o esperado ataque, em massa, das gripes e
constipações, um clássico desta altura do ano?
O cada vez menos brilhante ministro
Paulo Macedo já nos descansou, ao dizer, sem rir, que a situação é má, mas vai…
piorar! A sua honestidade deixa-me furioso! Ele não está lá para constatar, ele está lá para resolver, encontrar soluções. E a solução não é pagar 80 euros, à
hora, a médicos para fazer urgências! Os mesmos médicos que Paulo Macedo e a
troika empurraram para o sistema de saúde privado são agora assediado com
ordenados à jogador de futebol, como se de mercenários se tratassem, para
salvar a face dum sistema que não soube prever o óbvio.
Os médicos que existem são poucos e
estão exaustos. Não são 1000 euros por dia que apagam o cansaço e lhes dão
discernimento necessário para decidir em poucos minutos a melhor solução para
salvar uma vida.
Além de médicos, faltam enfermeiros.
Aqueles desgraçados que ganham pouco mais de mil euros por mês (recordo que se
oferece o mesmo por dia a um médico, em situações de desespero como acontece
agora) e que o ministro empurrou para fora do país ao não atender a muitos dos
seus justos pedidos. No último ano foram seis por dia, ou seja, mais de dois
mil, aqueles que emigraram. Este caos também se deve à sua ausência.
Para terminar, lembro que se fecharam muitas
urgências hospitalares, como por exemplo Amarante, para se concentrar meios num
hospital de referência regional. A medida, em teoria, parecia acertada, na
prática e face à carestia de meios humanos imposta pela troika, talvez não
fosse nada mal pensado reabrir algumas urgências durante estas semanas de
grande afluência da população aos hospitais. Afinal de contas, muito do
equipamento está parado…
Estas coisas são de previsão e
planeamento fácil, porque são mais previsíveis que o frio no inverno e o calor
no verão. Se um ministério não serve para planear o óbvio, para que serve,
afinal?
Gabriel Vilas Boas
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