Um jornal titulava «Já é nosso», outro
agradecia com um sentido «Obrigado» - no mundo da cultura portuguesa vai uma
alegria pueril e incontida pelo sucesso do peditório nacional para a compra,
por parte do Museu Nacional de Arte Antiga, do quadro de Domingos Sequeira “A
Adoração dos Magos”.
É, de facto, uma boa notícia, mas a
satisfação generalizada que perpassa nos jornais e nas redes sociais é
cruelmente esclarecedora quanto à realidade da cultura portuguesa.
O sucesso desta operação pública de
mecenato popular mostra que a sensibilidade artística dos portugueses tem uma
base social mais alargada, que a sociedade se consegue mobilizar economicamente
para aquisição de uma obra de arte de autor português. E não há nada de melhor
quando o público “constrói” o espólio dos seus museus porque isso revela
interesse, amor à arte, capacidade de decisão quanto aquilo que é importante
para o bem comum.
No entanto, a “salvação” do quadro de
Domingos Sequeira expõe também toda a fragilidade económica do mais importante
museu português assim como a inexistência de uma política cultural, por parte
do governo, que evitasse este espetáculo deprimente de um peditório nacional
para comprar um quadro de pouco mais de meio milhão de euros. Pode até ser
enternecedor, mas certamente também é caricato e humilhante.
Estamos a falar de 600 mil euros! Como é
possível um ministério da cultura não ter um plano de investimentos que permita
aos museus nacionais adquirir obras de arte com algum valor de mercado, de
molde a enriquecer o seu acervo e assim atrair mais visitantes? O valor em
causa era tão baixo que que o MNAA nem deveria precisar de qualquer ajuda
estatal ou privada para fazer esta aquisição, mas a nossa realidade económica,
quando falamos de cultura, é esta.
Quando comparo este heroísmo popular na
aquisição da tela de Domingos Sequeira com os “azares” dos nossos bancos
privados (que fomos obrigados a resgatar), não deixo de sentir uma enorme
revolta, porque Portugal só não tem dinheiro para investimentos necessários e
úteis, já que para acorrer a trafulhices que correram mal há sempre verba.
Hoje passam 151 anos que nasceu o grande
pintor naturalista José Malhoa. A sua obra-prima, Fado, datada de 1910 ilustra
bem o seu génio e essa mentalidade pequenina e submissa dos portugueses, que os
impede de avançar.
Mantemos aquele fatalismo e saudade que
Malhoa pintou há cem anos e por muito cosmopolitas que sejam os nossos
banqueiros não deixamos de ser uns pobres magos enganados que continuam a
adorar o menino errado.
Gabriel Vilas Boas
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