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quinta-feira, 3 de março de 2016

ENTREVISTA A UM PROFESSOR DE MORAL Professor António Madureira

António Augusto Nogueira Madureira é professor de Educação Moral Religiosa e Católica (EMRC) há um quarto de século e diretor do Secretariado Diocesano do Ensino da Igreja nas Escolas da diocese do Porto há mais de oito anos.
E.M.R.C. é, por várias razões, uma disciplina diferente das outras no curriculum escolar. Por essa razão, achei por ouvir o professor Madureira acerca da «sua» disciplina e para todos os agentes educativos poderem ter a perspetiva de quem gere os professores de E.M.R.C. no distrito do Porto.


O que é que a disciplina de EMRC dá de mais relevante à formação/educação de um aluno?
A Educação Moral e Religiosa Católica (EMRC) contribui para uma educação integral, em que a dimensão transcendente e religiosa da pessoa, da sociedade e da cultura se oferece como instância de leitura interpretativa do sentido para a vida. Só uma visão ampla da cultura permite ao aluno, na sua caminhada pessoal de liberdade, assumir-se todo e em tudo como membro de uma comunidade/sociedade. O quadro da educação, onde a EMRC se insere, é a cultura, não uma cultura qualquer à medida da consideração de cada interveniente, mas a cultura de um povo, a compreensão da pessoa, da vida e da história, lida e assumida ao longo do tempo, em perspetiva cristã.

Apesar de não ter um caráter obrigatório, a disciplina é frequentada pela esmagadora maioria dos alunos das escolas portuguesas. Como interpreta este facto?
Começaria por clarificar a afirmação “esmagadora maioria” pois não é verdadeira a nível nacional! Eu prefiro olhar a disciplina de EMRC, distante das leituras estatísticas e mais como uma proposta qualificada e qualificadora, para o desenvolvimento integral e integrado da pessoa humana! Quando esta missão se cumpre na escola é razão que valida as opções dos pais e ou alunos!

Normalmente, todos os alunos obtêm boas notas em EMRC. Acha que isso é fator fundamental na atração dos alunos?
Aqui a resposta imediata é «não»; a avaliação deve ser muito dialogada para conseguir ser entendida como uma forma de ajudar cada um a rever as suas metas. As boas notas, penso que, derivam mais do estar ali com e por gosto!


A nota da disciplina não é contabilizada para a passagem do aluno. Não pensa que isso diminui a EMRC no cotejo com as outras disciplinas curriculares aos olhos dos alunos, pais e outros professores?
 Não olho para avaliação/nota como necessidade qualificadora! Esta circunstância é um desafio interno que nos exige cuidar sempre a própria dinâmica da nossa disciplina! Não podendo ser uma como as outras, a EMRC caminha sobre um fio muito fino, pressionada por muitos lados. O lugar que lhe cabe, à EMRC, é exigente. Mas conhecendo nós estes dados é mais fácil compreender e redesenhar o nosso lugar e possíveis modos de o habitar nesta escola, sem demasiada angústia, com razoável esperança.
 Que papel espera que o professor de EMRC tenha numa escola?
     Sejam testemunhas credíveis de alegria! Adultos confiáveis! Cabe-lhes cultivar horizontes 
     largos e respirar revitalizantes!
É fácil e colaborante a relação entre as direções das escolas e o trabalho dos professores de EMRC?
Tenho imensa dificuldade em responder a esta questão, pois cada escola é uma realidade diferente com modalidades de diálogo particulares e difíceis de generalizar.
O que posso dizer é que uma liderança comprometida com a escola obriga a um olhar para todos e com todos fazer caminho!

Quais as qualidades essenciais que um professor de EMRC deve ter?
A missão entregue aos professores de EMRC exige ter-se em conta o “equilíbrio e a maturidade humana”. Devem ter um comportamento sensato, uma personalidade equilibrada e maturidade adequada à missão a desempenhar, bem como “capacidade de relação e de integração escolar”. O professor de EMRC deve ainda primar pela simpatia, delicadeza e pelo bom relacionamento com todos, capacidade de comunicar e de criar empatia, além de uma atitude construtiva na comunidade, isto no perfil humano. Depois temos perfil cristão e as necessárias habilitações académicas e são estas as qualidades desejadas para o docente de EMRC.

Os professores de EMRC facilmente são confrontados com a docência de 20 turmas. Não julga que isso é excessivo e contraproducente?
Prefiro orientar o meu olhar para a sorte que tem o professor de Moral… Conhece quase toda a escola e com todos é feliz… Importante é encontrar tempo e disponibilidade para quem precisa. Braços abertos para abraços verdadeiros!

Atualmente os alunos portugueses passam cada vez mais tempo nas escolas. Este é um caminho que deve ser aprofundado e defendido?
Penso que o tempo em casa e com a família deve ser o mais amplo possível, dentro dos limites profissionais e sociais com que se debatem as famílias. É de evitar a tentação de atribuir à Escola a função de suplência ou de substituição em relação às famílias. A Escola deve respeitar o princípio dos pais como primeiros e insubstituíveis educadores e colocar-se a seu lado, mas não em sua vez. Um Estado paternalista e dominador pretende sempre formatar os seus cidadãos segundo a sua ideologia, desconfiando da família, como primeiro espaço educativo. A Doutrina Social da Igreja não apoia esta visão.

Como avalia o modo como o ensino não católico se relaciona com a disciplina de EMRC?
No que diz respeito ao ensino estatal e ao quotidiano dos professores há boas e menos boas experiências. Por outro lado, o ensino não estatal nem confessional é uma realidade muito situada em cada instituição e com respostas muito diferentes: uns vêm a disciplina como muito importante para a formação dos alunos e promovem-na na sua comunidade educativa e outros pura e simplesmente ignoram a disciplina.

Os colégios católicos têm obrigação de dar uma relevância maior à disciplina de EMRC? Acha que é isso que se passa?
Há experiências muito díspares… Há colégios que levam muito a sério o primado do seu projeto educativo e são verdadeiras escolas católicas… Há outros colégios que esqueceram a marca essencial do seu projeto educativo e são apenas boas escolas! Obviamente a disciplina de EMRC devia ser uma das «marcas de água» da especificidade da Escola Católica e a alma da mesma.

O encontro de EMRC, em Maio, para os alunos do 8.ºano, é um momento marcante na carreira de qualquer estudante. Qual é o objetivo central dessa atividade?
O encontro promovido pela Diocese do Porto para os alunos de EMRC tem como primeiro objetivo apoiar e reconhecer os discentes que conscientemente fizeram esta opção. Depois promover encontro como espaço de cuidar do outro, agir com responsabilidade e liberdade. Promover uma experiência de alegria pela alegria de estarmos juntos!

Como reage à provocação de alguns agentes educativos que defendem a eliminação de EMRC dos curricula porque o Estado é laico?
O Estado é laico, mas a sociedade é plural. A reta laicidade não implica a eliminação da disciplina ou da dimensão pública do fator religioso, neste caso oferecida por uma instituição que, tem no campo social, educativo e cultural, uma marca história e ainda hoje um contributo essencial, reconhecido pelo próprio Estado e assegurado na Concordata. Essa opinião revela um desconhecimento do que é a missão da escola, o Estado Português, ao serviço da educação pretendida pelos pais, assume a sua responsabilidade na cooperação e na criação das condições necessárias para que os pais possam livremente optar, sem agravamento injustificado de encargos, pelo modelo educativo que mais convenha à formação integral dos seus filhos. Sem a abordagem desenvolvida na EMRC é claramente posto em causa a formação integral! A dimensão religiosa é constitutiva da pessoa humana, pelo que não haverá educação integral se o fenómeno religioso e as suas expressões e influências culturais não forem tomados em consideração!
Gere os professores de EMRC da diocese do Porto. O que lhe pede o senhor bispo no início de cada ano letivo?
A palavra gere não se aplica nesta missão que me foi pedida. O meu Bispo pede-me todos os anos para cuidar dos professores de EMRC que lecionam no espaço geográfico da Diocese do Porto… Saliento o desafio CUIDAR!

Quais as grandes compensações que o seu trabalho lhe dá?
Na verdade a sucessão dos anos de serviço, onde me sinto cada vez mais “em casa”, enriquece-me sobretudo pelo trabalho de equipa, e pela minha entrega mais situada e qualificada. O assumir, na minha Diocese, a função de Secretário Diocesano do Ensino da Igreja nas Escolas, isso obrigou-me a tomar contacto pessoal com a realidade da Disciplina e dos Professores na Diocese. Por outro lado, a necessidade de definir um percurso, de fazer opções, de elaborar e propor orientações, para os professores e disciplina de EMRC na Diocese, levou-me a investir na minha formação pessoal, nomeadamente no estudo mais apurado da legislação, na abordagem mais atenta dos documentos do Magistério, a fim de fundamentar devidamente o trabalho, que me foi confiado pelo Bispo Diocesano. Procurei orientar tudo isto no sentido de um desafio de crescimento pessoal e de maior e melhor serviço à Igreja.
Qual o grande desafio da disciplina de EMRC na próxima década, dentro da Escola portuguesa?
O desafio é conseguir ser lugar privilegiado para o cultivo da cultura e da sensibilidade espiritual, estética, ética e transcendente.
Qual é o professor de Moral desejável: um centrado na vertente humanista ou alguém mais concentrado no aspeto teológico?
O perfil do professor de EMRC contém aspetos que se aplicam a qualquer professor e aspetos específicos que decorrem da identidade da disciplina de EMRC. Este docente é caracterizado por três funções inseparáveis: testemunha, professor e educador.

O professor de EMRC desejável é aquele que assume educar com amor e educar para o amor e em colaboração com a família!

GAVB

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