Ontem morreu Nicolau Breyner. O homem que
pôs de pé a primeira telenovela portuguesa – Vila Faia – e descobriu o enorme
Herman José viveu uma vida cheia, entre o palco, a televisão e o cinema. Com
ele e através dele aprendemos a gostar da ficção nacional, a respeitar os
nossos atores, a valorizá-los.
Nicolau costumava dizer que fez tudo na vida
e no tempo certo. Soube ser criança, adolescente, adulto e velho, vivendo as
experiências de cada tempo com intensidade e profundidade. Também no mundo da
representação e da realização foi assim. Começou no teatro com Francisco
Nicholson e rapidamente ganhou a admiração do público nas pequenas rábulas que
fazia. Também depressa manifestou o seu olho clínico para caçar talentos e é
dele a descoberta e o lançamento de Herman José.
Do teatro saltou para a televisão, onde
toda a gente ganha a notoriedade universal. Aí, mais uma vez, inovou e arriscou
ao desafiar um conjunto de atores portugueses de bom nível, a fazer uma telenovela
em português. O João Godunha da “Vila
Faia” foi uma personagem que entrou para sempre na nossa memória afetiva, tal
era a impressão digital que Nicolau deixara nele.
Haveria de ter o seu Show Nico, de participar como ator, produtor e realizador noutros
projetos de ficção nacional; de protagonizar filmes e de os realizar, de fazer rir e
chorar plateias, de criar uma escola de atores na sua Serpa natal, de ter
opinião sobre a cultura e a vida portuguesas, de casar cinco vezes, de ensinar
os mais novos a amar a representação como ele amava viver.
Sem nos darmos conta, construiu uma
memória que faz parte da nossa história. A televisão, o teatro, o cinema, a
cultura portuguesa devem-lhe imenso: o trabalho, a persistência, o talento, a
inovação.
Hoje Portugal despediu-se do «seu» Nico. Afetuosamente, sem dramas e com serenidade, porque ele soube criar esse elo
amigo com a sociedade portuguesa através de um trabalho longo e profícuo, de
mais de cinquenta anos.
Para
onde quer que olhemos, dentro da ficção nacional, nos últimos quarenta anos
encontraremos sempre Nicolau Breyner: na Vila
Faia e nas Origens, como no Show Nico e em Aqui Não Há Quem Viva, em Gente
Gira, na Ferreirinha, em João Semana, no Triângulo Jota, até nos Morangos
com Açúcar.
No cinema, participou em
dezenas de películas, sendo procurado por todos os grandes cineastas nacionais
para os papéis principais. Para falar apenas daqueles que me lembro, cito de
cor: Crónica do Bons Malandros, Jaime,
Inferno, os Imortais, O Crime do Padre Amaro, Call Girl, Os Gatos Não Têm
Vertigens.
Os outros atores aspiravam a contracenar
com Nicolau para aproveitar a sua fama, o seu talento, o seu ensinamento.
Agora tudo isso terminou. Fica-nos a memória que é o lugar onde vivem os
imortais. E, certamente, Nicolau Breyner é um deles.
Gabriel Vilas Boas
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