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quinta-feira, 4 de setembro de 2014

DA ARTE, DA PINTURA, DE TIZIANO VECELLIO (1488-1576)

“Ela é Vénus, a italiana, a filha de Júpiter, a irmã de Afrodite, a grega. O tocador de órgão dá-lhe lições de música. Eu chamo-me Amor. Pequenino, suave, rosado e alado, tenho mil anos de idade e sou casto como uma libélula. O cervo, o pavão real e o veado que se avistam da janela estão tão vivos como o casal de amantes abraçados que passeiam à sombra das árvores da alameda. Em contrapartida, o sátiro da fonte de cuja testa surte água cristalina de um vaso de alabastro, não o está: é um pedaço de mármore toscano que um hábil artista vindo do Sul da França modelou.”
Mario Vargas Llosa

Prémio Nobel da Literatura em 2010

Vénus com o Amor Ouvindo Música, Tiziano, Museu do Prado, Madrid

A obra que escolhi para nós pode ser apreciada no Museu do Prado, em Madrid, e foi um presente de Ticiano para o Imperador Carlos V, aquando da sua estada em Augsburg.
Nesta pintura a óleo, Ticiano explora as suas extraordinárias possibilidades, levando-as a um nível completo e temperado, como podemos apreciar nos reflexos dos tons pastosos, cremosos e luminícos sempre finamente modelados. Este exemplo de alegoria neoplatónica dos sentidos foi sendo interpretado de diversos modos, sendo que aqui se exploram sobretudo a visão e a audição como meios para atingir a beleza e a harmonia. O organista contempla sem pudor a beleza de Vénus enquanto se sente a música que ele toca como ninguém, num enlevo de amor protegido pela luz do entardecer. As sedas ricas e faustosas que envolvem a deusa Vénus, numa indolência preguiçosa e extasiada pelas notas de música que pairam no ar, deixam a nu uma beleza idealizada ao tempo, em que as mulheres deveriam ser de forte compleição e donas de um tom de pele branco e acetinado, de uma alvura imaculada.
As cores de Ticiano estão aqui, quentes e intensas como o Amor que ele quer representar.
Ao fundo, uma fonte de pedra, fria e morta, contrasta com um casal vivo e apaixonado que se passeia pela alameda florestal, rica de fauna variada. É assim conseguida a profundidade tão ao gosto do Renascimento, pela disposição das árvores em perspetiva.
Esta alegoria integra um conjunto de novas experiências onde a cor é bem conseguida, difundida na imagem feminina central, envolvida pela paisagem de fundo. À luz do entardecer na floresta, fundem-se elementos reais e mitológicos, num hino ao classicismo por quem Ticiano se deixa enamorar.
Nascido em 1488,em Pieve di Cadore, no seio de uma família rica e abastada, frequenta desde cedo um atelier de pintura em Veneza, única e exclusivamente devido à sua grande vocação manifestada desde cedo.
Marcadamente influenciado pelo grande Giorgione, demarca-se dele a partir de 1515 e começa a  dedicar-se à produção de obras de grandes dimensões, compondo no espaço cénico formas gigantes e opulentas, em jogos de luz e de penumbra que nos envolvem em jogos de mistério carregados de sensualidade.
         Puras imagens vivas, ardentes ou serenas. Apreciar uma obra de Ticiano é uma experiência única. Elas estão muito próximas de nós e em grande quantidade, no Museu do Prado, Madrid. Neste setembro que apetece, fica aqui a sugestão de uma viagem a Espanha, em busca de um pintor italiano que foi dono como ninguém da cor expressiva, clássica e absolutamente ideal. Porque não?

Rosa Maria Alves da Fonseca

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