Deus estende o braço e com o indicador da sua mão
direita tenta tocar Adão e assim criar a humanidade. O espaço entre os dois
dedos acentua o dramatismo do momento da criação humana por parte de Deus.
Neste famoso e
maravilhoso fresco de Miguel Ângelo está patente todo o simbolismo,
genialidade, perfeição e verdadeiro milagre da arte e da técnica que constitui
o teto da capela sistina, no Vaticano, em Roma. A obra é tão perfeita, tão monumental,
tão difícil de executar que quem a observa ao vivo ou em imagens pergunta-se
repetidamente se foi obra dum mortal ou dum ser divino. Provavelmente, o dedo
do criador tocou no pincel de Miguel Ângelo durante aqueles longos quatro anos,
entre 1508 e 1512, e fez nascer uma criação artística que é património da
humanidade.
Há cinco séculos, ao pintor Miguel Ângelo foi colocado
um enorme desafio: decorar o teto da capela do palácio do Papa, em Roma. O
resultado foi uma assombrosa série de cenas religiosas, onde se destaca a já
citada imagem de Deus a criar Adão.
O teto era tão grande e tão alto que
muitos duvidaram que Miguel Ângelo conseguisse levar a cabo tão ciclópica
tarefa. O esboço final enchia o teto de ponta a ponta com mais de 300 figuras.
Para as pintar, Miguel Ângelo passou anos empoleirado no andaime, inclinando
penosamente o pescoço para cima enquanto a tinta lhe pingava para o rosto. Ao final do
dia, ele tinha cãibras a tal ponto que mal conseguia ler as cartas que seus
familiares lhe enviavam. Miguel Ângelo pagou um preço altíssimo por esses anos
de trabalho: a sua visão ficou reduzida e desgastou-se muito. Quando terminou a
obra, com apenas 37 anos, estava impressionantemente velho.
Na pintura do teto da capela sistina, Miguel Ângelo aplicou uma técnica conhecida
como fresco, o que implicava aplicar as cores diretamente sobre o estuque
ainda não enxuto.
Convém lembrar que o teto tem uns estonteantes 20 metros de altura. As
cores fortes e os contornos definidos tornam mais fácil observar as figuras a
partir do chão. Nessas figuras vemos corpos musculados, o que revela os
conhecimentos de anatomia de Miguel Ângelo.
A parte central do teto da Capela, pintada por Miguel Ângelo, retrata
cronologicamente a história do livro Gênesis do Antigo Testamento. (1) Deus
separando a Luz das Trevas, (2) Deus criando o Sol e a Lua, (3) Deus
separando a terra das águas, (4) A Criação de Adão, (5) A Criação
de Eva, (6) O Pecado Original e A Expulsão do Paraíso, (7) O
Sacrifício de Noé, (8) O Dilúvio Universal e, por último, (9) Noé
Embriagado com vinho.
Nos quatro cantos são retratadas cenas também do Antigo testamento. No
canto superior esquerdo, Judith matando o general assírio Holofornes. No
inferior esquerdo, David matando o gigante Golias. No superior direito, a
Serpente de Bronze, que salvou os israelitas picados pela serpente do
deserto. No inferior direito, O castigo de Amã, que, por querer
exterminar o povo Judeu, acabou enforcado com sua família.
Na região mais lateral do teto estão retratadas as Sibilas – mulheres da
mitologia greco-romana, que possuíam poderes proféticos – bem como profetas do
Velho testamento: Zacarias, Joel, Isaías, Ezequiel, Daniel, Jeremias e Jonas.
Concluída a obra, o sucesso foi tal que Miguel Ângelo foi convidado a
pintar as paredes da capela. Decidiu cobri-las com uma visão aterradora do
episódio bíblico do Juízo final, que abordaremos noutra altura. Entre os
demónios e as almas condenadas incluiu um autorretrato inquietante, talvez para
lembrar a quem via o sofrimento que ele passara para pintar aquele teto.
Hoje, quem visita a mais famosa capela do Vaticano não pode deixar de considerar
que lá no alto está aquilo que é divino, a imortal obra do genial Miguel Ângelo.
Gabriel Vilas Boas
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