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sábado, 2 de agosto de 2014

EUNICE MUÑOZ



Eunice do Carmo Muñoz é, provavelmente, a atriz de teatro, televisão e cinema mais conceituada de Portugal. 

Filha de atores, a alentejana, nascida em 1928, começa a sua carreira, ainda adolescente, no teatro D. Maria II, com a peça Vendaval. Desde então até hoje só a doença a parou, em 2012.

A estreia no Teatro D. Maria II promoveu o contato com Amélia Rey-Colaço e Robles Monteiro, que estavam à frente do elenco. Eunice Muñoz trabalhou ainda com outros nomes sonantes do teatro, como João Villaret e Maria de Matos. 

A consagração chegou com o papel de D. Maria de Noronha, em Frei Luís de Sousa (1943), desempenho que lhe valeu a revelação de um excecional talento dramático. É com este temperamento colado ao drama que a actriz arrancou os mais fortes e sentidos aplausos, sobretudo a partir de Joana d’Arc, de Jean Anouilh, no Teatro da Avenida.

Depois de uma breve incursão no teatro musicado, em que ao lado de Estêvão Amarante participou nas operetas A Casta Suzana e João Ratão (Teatro Avenida), regressa ao Teatro D. Maria II, em 1949 para integrar Espada de Fogo de Carlos Selvagem. 

A par do teatro, Eunice Muñoz faz parte do elenco de vários filmes: depois de Camões, seguiu-se Um Homem do Ribatejo (1946), Cantigas da Rua (1949). Em 1965, integra o elenco de O Trigo e o Joio.



No entanto, a sua carreira crescia e afirmava-se no teatro. Vai conhecendo e contracenando com atores como Ruy de Carvalho, António Silva, Henrique Viana ou Isabel de Castro. Entre tragédias de Shakespeare ou comédias, o seu talento dramático confirma-se e, em 1963, ganha, conjuntamente com Laura Alves, o prémio de Melhor Atriz. Arrebata ainda outros galardões: Prémio Crítica, pela interpretação na peça Joana d’Arc (1965) ou o Prémio de Imprensa, pela peça Quatro Estações (1969). O Prémio Garrett surgiu em 1986, pela interpretação de Mãe Coragem e Seus Filhos

O seu talento era conhecido e bem pago. Em 1965 Eunice já cobrava um salário na ordem dos trinta contos (atuais 150 euros), um recorde para a época. No entanto, a sua vida pessoal não gozava do mesmo êxito. Sucediam-se enlaces e desenlaces, sem que a fogosa Eunice encontrasse o amor da sua vida. 

No palco era o inverso. Tinha a oportunidade de fazer peças de Bernardo Santareno, Tennessee Williams, Jean Racine, William Gibson. 

Após o 25 de Abril, integrada na companhia do reaberto Teatro Nacional D. Maria II, onde viverá êxitos enormes, interpreta peças de Donald Coburn, John Murray, Bertolt Brecht, Hermann Broch, Athol Fuggard, Eurípedes, e trabalha com encenadores como João Perry, João Lourenço ou Filipe La Féria.

Sem nunca perder de vista os palcos, é muito requisitada pela televisão e pelo cinema. Aparece em vários filmes, tendo uma interpretação fabulosa, em Manhã Submersa, de Lauro António (1980) e em Tempos Difíceis, de João Botelho (1987).



Quando completa 50 anos de carreira, o Museu Nacional do Teatro assinala a data com uma exposição dedicada à sua obra e o Presidente da República, Mário Soares, condecora-a, em pleno palco do Teatro Nacional, com o grau de Grande-Oficial da Ordem do Infante D. Henrique.

Com o advento das televisões privadas em Portugal, as telenovelas feitas em Portugal tornam-se um produto muito querido pela população e Eunice, apesar de sexagenária, é muito assediada para diversos papéis. Estreia-se em telenovelas com uma notável interpretação em A Banqueira do Povo, de Walter Avancini, em 1993.

No entanto, o teatro foi sempre a sua paixão e o espaço onde o talento da alentejana da Amareleja mais brilhava. Quase a fazer 70 anos, representa A Maçon, peça que a romancista Lídia Jorge escreveu expressamente para Eunice. Em 2001, subiu ao palco para representar A Casa do Lago, de Ernest Thompson e aos 78 anos (!!!) representava Miss Daisy, no Auditório Municipal “Eunice Muñoz”, em Oeiras.

Os prémios sucediam-se: Globo de Ouro de Mérito e Excelência (2007), Grande-Oficial da Ordem Militar de Sant'Iago da Espada (2010), Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique (2011), mas as peças também. A inefável Eunice parecia nunca cansar-se.

Até que em Maio de 2012, a actriz partiu os dois pulsos e ficou com uma lesão na cervical na sequência de uma queda durante os ensaios da peça de Tennessee Williams, “O Comboio da Madrugada”. Posteriormente, foi operada a um nódulo na garganta e teve de ser submetida a uma operação à tiróide, o que a obrigou a abandonar as gravações da novela «Destinos Cruzados». 

Há três dias, Eunice Muñoz completou a bonita idade de 86 anos, mais de 70 dedicados ao Teatro. Só um talento ímpar resistiria à peneira do tempo.

Deixo-vos com outra faceta de Eunice Muñoz: declamadora. E como ela torna suaves, doces e ainda mais belos os poemas de Florbela Espanca!

Gabriel Vilas Boas

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