Etiquetas

quarta-feira, 13 de dezembro de 2017

MORREU AO MEU LADO, NUM BANCO DO METRO. NINGUÉM REPAROU… NEM EU!

No belo poema, que é a letra de “Construção”, a certo momento Chico Buarque canta

E se acabou no chão feito pacote flácido
Agonizou no meio do passeio público
Morreu em contramão, atrapalhando o tráfego”

Acabo de ler que, no México, um homem teve um ataque cardíaco, em pleno metro, e morreu sem que ninguém tivesse dado por isso.
Não, não morreu em contramão nem tão pouco atrapalhou o trânsito, mas acabou como um pacote flácido, deixado ao abandono num banco de metro, em cuja essência humana só repararam quando já tinha deixado de ser.
Andamos a ficar tão lamentáveis que já nem uma lamentação valemos.

O mexicano viajou cadáver algumas horas até alguém ter desconfiado de tão profundo sono. Vieram então os paramédicos decretar a morte legal tal como agora nós manifestamos a nossa perplexidade e indignação.
O velho mexicano que morreu no metro de ataque cardíaco sem incomodar a pressa e a indiferença de ninguém é um signo e um sinal daquilo em que nos tornamos. 
A irrelevância em que transformamos o outro é a medida da nossa insignificância.

Os direitos humanos, nos países ditatoriais e nos regimes brutais, fazem-nos percorrer quilómetros de luta, indignação e manifestações, mas a desumanização diária com que tratamos a senhora do terceiro direito, a avó com quem não falamos há meses ou o velho que dá de comer às pombas, no jardim público, em que passamos todos os dias não nos preocupa dez segundos.

Com o tempo o mexicano deixará de ser uma metáfora para ser uma estatística, tal como nós deixaremos de ser um ser humano para nos transformamos num número.
GAVB



Sem comentários:

Enviar um comentário