Durante anos vários líderes europeus andaram a pedinchar à
senhora Merkel maior flexibilidade da Alemanha face ao tratado orçamental da UE,
suplicaram através de lindas metáforas maior envolvimento alemão nas questões
do emprego, nas políticas sociais, na consideração pelas especificidades de
cada economia e Merkel assobiava olimpicamente para o lado e mandava dizer que
regras são regras e todos tinham de as cumprir.
Entretanto as circunstâncias mudaram radicalmente e Merkel
tem o discurso que outros tiveram durante anos sem nunca obterem resposta.
A Inglaterra vai sair da União, o clima de guerra aberta
económica entre a Alemanha e os EUA vai custar muito milhões de euros a cada
uma das economias através de coimas que vão ser aplicadas à VW e à Apple,
Merkel perde assustadoramente popularidade entre os alemães e pode ser apeada
do poder a breve trecho; a crise dos migrantes sírios está por resolver e vai
agudizar-se no inverno. A isto acresce que a França do senhor Hollande é mais
problema do que solução, pois o aumento da sua dívida é um péssimo exemplo para
apresentar aos malandros do sul da Europa e a Inglaterra está fora do barco.
Resta a Alemanha para puxar sozinha um navio atolado em descrença, dívidas e
incoerência.
Por isto tudo e porque finalmente sente o cargo de chanceler
em perigo Merkel diz o que todos andam a dizer há muito: “A União Europeia está
numa situação crítica!” E para abreviar caminho a chanceler diz especificamente
quais são as prioridades: segurança, crescimento económico, mercado laboral,
expectativas dos mais jovens dentro do mercado europeu.
Merkel está apertada e quer passar a discutir o essencial. No
entanto, Merkel não quer salvar Europa nenhuma, antes quer salvar a Alemanha de
uma crise social e económica que está ao pé da porta e salvar-se a ela própria
enquanto líder do governo. Se não tiverem um plano de negociação bem definido, os
restantes líderes europeus vão deixar que Merkel ponha e disponha a seu belo prazer, perdendo-se assim uma excelente oportunidade de reformular o modelo
económico em que assenta a atual União Europeia.
Merkel nunca foi de grandes rasgos, nem para Alemanha nem para
a Europa. Nos restantes países dominam os tecnocratas ou gente sem escrúpulos
ou gente sem legitimidade ou gente sem carisma. Pode ser que todos juntos
consigam parir uma ideia brilhante e humanista sobre os novos e delicados
passos que a UE tem de dar. A probabilidade é pequena, mas pode acontecer.
Gabriel Vilas Boas
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