A Porto Editora é a empresa líder no mercado de livros escolares, cuja temática, todos os anos, ouvimos falar ora por causa do preço ora porque existe a perceção que os manuais estão sempre a mudar. Por isso nada melhor que ouvir o responsável pelo Departamento de Comunicação da Porto Editora, Paulo Gonçalves, que nos concedeu uma longa entrevista.
A trabalhar na Porto Editora desde 1996, o
nosso entrevistado é um dos cerca de 1400 trabalhadores do Grupo que possui um
portfólio de títulos bem recheado. Começou por aí a nossa entrevista.
Quais as empresas que pertence ao grupo Porto Editora?
A Porto Editora, fundada a 2
de maio de 1944, é a casa-mãe de um grupo que é hoje constituído também pelas
empresas Areal Editores, Bertrand Editora, Circulo de Leitores, Raiz Editora,
Distribuidora de Livros Bertrand, Livrarias Bertrand, Plural Editores Angola,
Plural Editores Moçambique, Plural Editores Timor-Leste e a unidade de produção
Bloco Gráfico. Aquelas editoras integram um portfólio de chancelas que inclui
Albatroz, ArtePlural, Assírio & Alvim, Contraponto, GestãoPlus, Ideias de
Ler, Pergaminho, Quetzal Editores, Sextante Editora, Temas e Debates, 11x17 e,
agora, a Livros do Brasil.
Os
livros escolares são caros ou os pais valorizam pouco o investimento na
educação dos filhos?
Os
pais e os educadores têm consciência da importância que os livros têm para os
filhos. Os livros escolares são recursos indispensáveis para o percurso educativo
dos alunos. São verdadeiras ferramentas de trabalho diário, quer na sala de
aula quer em casa, e a sua utilização não se esgota num ano letivo, pois não
raramente é necessário rever matérias nos anos letivos seguintes até para
preparar exames de fim de ciclo. Mas há quem desvalorize os livros, quem os
veja como descartáveis, e ao fazê-lo não entenda que está a transmitir uma
mensagem errada desde logo para os mais novos.
O
preço do livro escolar pode variar entre os nove euros no 1.º ciclo e os vinte
euros no 3.º ciclo. Se formos a comparar, por exemplo, com os livros de ficção
que ocupam os top de vendas, vemos que estes são, em regra, mais caros e, no
entanto, são muito menos exigentes ao nível de desenvolvimento editorial. Sendo
assim, será que um livro escolar pode ser considerado caro? Acontece é que não
se compra um livro escolar, mas sim um conjunto de livros escolares
considerando o ano de escolaridade, e essa compra acontece numa altura
específica do ano, de mudança de estação, em que as famílias têm de comprar
roupa e calçado, por exemplo. Daí ouvir-se falar dos preços dos livros - mas se
o preço do cabaz de livros escolares for diluído por um ano letivo, verifica-se
que, por dia, tem um custo inferior a um café.
Ciclicamente,
em todos os inícios de ano letivo, jornais e associações de pais falam do
elevado custo por aluno dos manuais escolares. Por que razão a PE editora não
exerce o contraditório?
É verdade que os media, sobretudo os mais
populares, fazem manchetes sobre os preços dos livros escolares. Fazem-no de
forma superficial e, 99% das vezes, manipulando números para sustentar a
“informação”. E com a emergência da crise económica dos últimos anos, essa
tendência tornou-se mais evidente seguindo uma lógica de assegurar audiências.
A Porto Editora exerce o contraditório
sempre que tem a oportunidade, mas a Porto Editora não pode falar pelo setor.
Quem representa os editores escolares portugueses é a Comissão do Livro Escolar
da APEL, que tem tentado esclarecer a sociedade e desmontar a desinformação e a
manipulação que se tem verificado.
Os
pais queixam-se muito da subida do preço dos livros escolares acima da
inflação, mas o Ministério da Educação não. O Estado paga e não reclama ou o
tem um desconto especialíssimo? É fácil negociar com o Ministério da educação?
Desde 2003 – e porque não tenho dados
anteriores – apenas nos últimos dois a três é que os preços dos livros
aumentaram acima da inflação. E isso aconteceu porque a Convenção de Preços de
2011 foi assinada sob a influência da intervenção externa e, por conseguinte,
não podia ser alterada durante aquela intervenção. No entanto, quando a
convenção foi assinada, a inflação estava em 3,1 % e a atualização definida
pela convenção era de 2,6%, ou seja, não haveria um aumento efetivo dos preços,
pois a atualização era 0,5% abaixo da inflação. Contudo, o cenário económico
alterou-se e verificou-se uma descida sustentada da inflação e, a partir desse momento
(2012/2013), os livros aumentaram de facto.
Neste momento, está a ser negociada uma
nova convenção de preços com o Ministério da Economia, tendo o acompanhamento
do Ministério da Educação. Importa dizer que somos dos únicos países europeus
onde os preços dos livros escolares não são livres, mas sim regulados por
convenção com o Estado. E esses preços aplicam-se em todas as situações, sem
exceção.
A lei
diz que os manuais escolares devem ter uma vigência de vários anos, mas na
prática tal não acontece. Acontece sempre algo que obriga à impressão de novos
livros escolares, antes do fim do prazo. O lobby das editoras é assim tão
poderoso? De quem é a culpa destas sucessivas mudanças na edição de novos
manuais escolares?
É mentira – os livros não estão sempre a
mudar. Essa perceção é alimentada erradamente por vários setores, pese embora
todo o esforço de informação e esclarecimento que é feito ano após ano. Mas
bastava ter o cuidado de consultar a legislação para se perceber que a
realidade é bem diferente.
Os livros têm uma vigência definida por
Lei e os editores cumprem escrupulosamente a legislação. Para que se saiba: nos
inícios da década de 90 do século passado, a vigência dos manuais escolares
passou a ser de quatro anos. A partir de 2006, essa vigência foi alargada para
seis anos. Ou seja: os livros duram por seis anos, período durante o qual não
há qualquer alteração aos manuais.
Um exemplo concreto: em setembro de 2016,
os únicos livros novos que vão chegar às livrarias são dos 1.º, 5.º e 11.º anos
de escolaridade. Todos os outros permanecerão inalterados.
Este é um aspeto que está regulamentado
pela Lei N.º 47/2006, de 28 de agosto, pelo que não há quaisquer dúvidas sobre
esta matéria.
As eventuais mudanças que ocorrem dentro
dos prazos de vigência são impostas pelo Ministério da Educação, entidade
responsável pela formulação dos programas curriculares pelos quais as editoras
e os autores têm de orientar a elaboração dos livros escolares. Se o Ministério
da Educação decide alterar os programas, as editoras e os autores são obrigados
por lei a alterar os livros para que possam ser utilizados por alunos e
professores. O que aconteceu no passado recente com as Metas Curriculares é bem
o exemplo disso. As editoras não têm, nem nunca tentaram ter, qualquer
influência neste assunto. A responsabilidade das editoras está em fazer livros
e recursos didático-pedagógicos, não programas curriculares.
Já
pegou numa mochila de um aluno do 5.º ano? Pesam imenso! Eles andam com elas
várias horas por dia, percorrendo centenas de metros diários. As editoras não
deviam fazer manuais escolares mais leves?
A questão do peso dos livros é uma
preocupação dos editores, tanto assim que, ao longo dos anos, há um permanente
investimento em utilizar um papel com uma gramagem cada vez menor mas que não
prejudique a leitura, o estudo e a saúde dos alunos, que é o que pode acontecer
se o papel for translúcido, com impacto negativo na saúde ocular. Tenho a
certeza que este cuidado dos editores, esta atenção ao pormenor – que, neste
caso, é um “pormaior” – merece concordância de todos.
Acontece que, mais uma vez, atribui-se aos
editores a responsabilidade de um problema partindo de uma análise superficial.
É que, a montante, está quer o número de disciplinas quer a extensão dos programas
curriculares, aspetos dominantes que determinam o trabalho dos editores, que
têm de fazer livros para as disciplinas e refletir os respetivos conteúdos
programáticos. Da parte dos editores, tudo tem sido feito para diminuir essa
questão sem prejuízo da qualidade dos livros.
A PE
domina o mercado dos livros escolares e te vindo a adquirir outras editoras de
menor dimensão. Não temem ser acusados de abuso de posição dominante pela
autoridade da concorrência?
A Porto Editora tem uma posição de
destaque no setor do livro escolar, mas não o domina. Há várias outras
editoras, portuguesas e estrangeiras – sim, há editoras escolares estrangeiras
a atuar no nosso país – que fazem deste setor altamente competitivo, dinâmico e
inovador. Na verdade, os professores e os alunos portugueses dispõem de livros
escolares e outros recursos, nomeadamente tecnológicos, que são considerados do
melhor que se faz internacionalmente, o que significa que a competitividade e o
dinamismo do setor tem beneficiado também os públicos-alvo.
Quanto às editoras adquiridas, são
chancelas que atuam na área da literatura, não no setor da edição escolar, pelo
que não há qualquer risco de posição dominante.
Recentemente, a PE adquiriu a Bertrand. Qual
foi a estratégia do grupo com essa aquisição?
A aquisição dos ativos do Grupo Bertrand
Círculo aconteceu em meados de 2010 e deveu-se, fundamentalmente, ao objetivo
de fortalecermos a estratégia de alargamento da atividade editorial do Grupo
Porto Editora, consolidando ao mesmo tempo o crescimento do grupo numa altura
em que se assistia, em Portugal, a um processo de concentração no setor e havia
a possibilidade de grupos estrangeiros entrarem no nosso país.
Como é
que a PE se relaciona com a Escola portuguesa? Também ouve as associações de
pais quando começa a desenhar o projeto de um novo manual escolar?
São mais de setenta anos de atividade
editorial, de presença constante nas escolas, de apoio aos professores e
educadores, bem como a gerações de alunos – haverá alguém que tenha estado na
escola e não tenha estudado por um livro da Porto Editora, que não tenha
consultado um dicionário nosso? Com este histórico, só pode existir um
relacionamento aberto, próximo, de atenção e preocupação para com as
necessidades e expetativas da comunidade e de procura constante das melhores
soluções educativas.
Quanto
custa produzir um manual escolar do 3.º ciclo? E do ensino secundário?
Fazer um livro escolar, independentemente
do ciclo de ensino, exige o investimento de muitos milhares de euros. E é um investimento
de risco pois, se não for do agrado das escolas e dos professores, o livro não
será escolhido e, por conseguinte, não será comprado pelas famílias.
Para a produção de um manual escolar, a PE precisa de quanto tempo? Quantas são
envolvidas no projeto de um manual escolar?
Para desenvolver um livro escolar é
necessário entre um ano e um ano e meio de trabalho constante. São centenas de
milhares de horas dedicadas por autores, editores, consultores científicos e
pedagógicos, revisores, ilustradores, programadores, paginadores, enfim, uma
vasta equipa constituída por profissionais altamente qualificados e
especializados. É um trabalho tremendamente exigente, complexo, de enorme
responsabilidade, que obriga a um investimento permanente nas áreas da
investigação e desenvolvimento.
Que
projetos tem a PE para os PALOP?
O Grupo Porto Editora tem neste momento
editoras em três países de língua oficial portuguesa: a Plural Editores
Moçambique, a Plural Editores Angola e a Plural Editores Timor-Leste. São
editoras que atuam localmente, devidamente inseridas naquelas sociedades, que
têm como objetivo contribuir para o desenvolvimento educacional e cultural das
populações que servem. E, ao mesmo tempo, estão também a contribuir para o
fortalecimento dos laços linguísticos e culturais que unem os nossos povos.
Não misturemos conceitos nem sucumbamos a
exercícios demagógicos. Uma coisa é a Educação enquanto direito fundamental
numa sociedade democrática e evoluída; outra coisa são as atividades humanas
que concorrem para que esse direito possa ser existir. Os investigadores, os
autores, os especialistas, não merecem ser devidamente remunerados pelo
trabalho que desenvolvem? As sociedades científicas, os institutos, as editoras
que os acolhem e os apoiam, não merecem ter o retorno do investimento que
fazem? De outra forma, como é que nós, a sociedade, podemos exigir um trabalho
de qualidade, uma aposta constante na inovação e no desenvolvimento?
Acha
que o projeto “Escola virtual” é democrático e de fácil acesso a toda a
comunidade escolar dependente da PE? E quem não pode pagá-lo, não fica em
desvantagem?
A “Escola Virtual” é um serviço de
e-learning integralmente desenvolvido pela Porto Editora, suportado pelos seus
próprios meios, dependente do investimento próprio quer ao nível dos recursos
humanos, estruturais e financeiros. Não tem qualquer tipo de apoio ou
participação estatal. É, por isso, um serviço de cariz comercial que depende da
capacidade de atração de clientes. E é um serviço que apresenta preços
particularmente acessíveis e baixos considerando as suas potencialidades e o
investimento a que nos obriga. Mas devo sublinhar que, ainda assim, a Porto
Editora tem bem presente a importância de contribuir para o combate às
desigualdades no acesso às novas ferramentas de aprendizagem e, por isso, tem
um protocolo com o Programa Escolhas através do qual disponibiliza o acesso
gratuito à “Escola Virtual” aos milhares de jovens desfavorecidos que são
apoiados por aquele programa.
A Porto Editora é uma referência, também,
pelo cumprimento escrupuloso das suas responsabilidades para com os
trabalhadores e pelo respeito dos seus direitos. Tem uma política de formação
definida, tem atenção ao bem-estar e à saúde dos trabalhadores, proporciona
excelentes condições de trabalho. E, também por isso, é procurada por muitas
pessoas.
A
crise económica que o país atravessa(ou) afetou os negócios da PE? Ou o negócio
dos livros escolares para uma empresa líder, como é o caso da PE, é um porto
seguro?
Naturalmente que afetou. Há desde 2009 uma
descida constante na compra de livros e, no que concerne ao livro escolar, falar
em “porto seguro” é errado: o enorme decréscimo de alunos nas escolas, reflexo
da queda acentuadíssima dos índices de natalidade ao longo das últimas décadas,
uma regulamentação de preços apertada e a reutilização dos livros são fatores que
contrariam essa perceção.
O novo
Ministro da Educação anunciou várias mexidas nos programas curriculares das
várias disciplinas entre outras mexidas no setor. Como encaram isso?
Neste momento, é prematuro comentar seja o
que for.
Há
quem diga que as editoras de manuais escolares nem tempo para angústias quanto
às vendas, porque o Ministério da Educação está-lhes sempre arranjar trabalho e
clientes. Que comentário isto lhe merece?
Como as minhas respostas anteriores
evidenciam, esse tipo de afirmações não têm qualquer tipo de fundamentação. A
não ser que se tenha má-fé e, propositadamente, se queira distorcer a realidade
por quaisquer razões inconfessáveis. A ignorância não é desculpa.
Qual é
o grande desafio de um Responsável de Comunicação da Porto Editora?
Ser capaz de dar a conhecer a excelência
do trabalho feito pela Porto Editora, contribuindo para o fortalecimento da
perceção da marca e do seu posicionamento.
O que acham dos produtos apresentados pelas editoras concorrentes no mercado dos manuais escolares?
As editoras concorrentes fazem um
excelente trabalho, o que só valoriza de sobremaneira o trabalho da Porto
Editora.
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