Há dias vi o filme “As
Sufragistas” que recordava o começo da luta das mulheres inglesas pelo direito
ao voto. Foi há cem anos e foram precisos dezasseis para que esse direito lhes
fosse efetivamente outorgado. Ontem, o jornal O Público fazia manchete com um estudo recente que referia que as
mulheres portuguesas ainda gastam o dobro do tempo em atividades domésticas que
os seus companheiros. Quando li a notícia fiquei surpreendido, pois esperava
que a diferença fosse maior. Em 2002 o fosso era realmente maior, mas a
aproximação tem sido feita a passo de caracol.
O século XX marca a
conquista, em muitos casos dolorosa, de direitos fundamentais das mulheres, em
sociedade que eram dominadas pelos homens.
Colocar na lei a
igualdade é fundamental, mas a paridade não se decreta, constrói-se. É uma
responsabilidade que cabe tanto ao homem como à mulher e está muito dependente
da educação, através do exemplo, que os adolescentes e jovens recebem.
A lei pode ajudar
imenso, ao ser imperativa em determinados casos concretos e, sobretudo, ao
fiscalizar as arbitrariedades cometidas ao nível da disparidade salarial entre
homens e mulheres. Hoje um salário médio de um homem é superior, em cerca de
130 euros, ao de uma mulher. Mais do que um problema de mentalidade de quem
emprega, acho que se trata duma falha de quem regula.
Homens e mulheres são
seres diferentes e, obviamente, têm inclinações naturais para fazer mais umas
tarefas que outras. Por isso espanta-me tanto que, num lar, 92% das mulheres
tratem da roupa como 82% dos homens se ocupem, em exclusivo, das reparações.
Se a questão da
paridade não oferece filosófica discussão, então tem de ter tradução prática.
Desgraçadamente, o meio família ainda é um triste palco desta (dis)paridade. Os
homens portugueses dedicam oito horas semanais às tarefas domésticas, mas a
necessidade impõe que as mulheres tenham de lhes dedicar dezassete. Esta
diferença ainda é muito grande. Além da educação dos filhos para a paridade, as
mulheres devem “exigir” que os seus companheiros cumpram aquilo que defendem
(74% dos homens acha que as tarefas lá de casa devem ser repartidas
igualitariamente). É uma luta difícil, porque é também uma luta de poder e de
transformação de mentalidades. Saber negociar é uma arte tão ou mais útil como
saber seduzir.
É verdade que os casais
mais jovens dividem mais e melhor as tarefas domésticas, mas recusou-me aceitar
que tenhamos de esperar décadas para sincronizarmos direitos e deveres. É
possível fazer mais e melhor nesta área. Recordo, por exemplo, o extraordinário
contributo que as diversas monarquias europeias podiamm dar, ao permitir que seja
a princesa a tornar-se rainha, quando é a mais velha, e não que esse lugar
fique reservado para a esposa do jovem príncipe, mesmo que este seja o mais
novo dos irmãos.
Na esfera profissional,
penso que o problema não se resolve com quotas, que além do mais até podem
ofender a dignidade das mulheres e criar situações muito injustas. Implementar
a paridade passa antes pela valorização da meritocracia. Homens e mulheres
devem ter uma situação de partida igualitária e serem objeto de uma avaliação
justa e imparcial. Depois, se houver mais mulheres a mandar ou mais homens com salários superiores, não há como invocar mais a injusta paridade que nos
atrasa civilizacionalmente.
A paridade de géneros
revela muito acerca dos valores fundamentais de determinada sociedade.
Gabriel Vilas Boas
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