Numa altura em que James Bond com o seu “Spectre” e “Steve Jobs” dominam as atenções do público amante do cinema, um filme chamou a minha atenção pela temática, a luta das mulheres pelo direito ao voto no último século: As Sufragistas.
Provavelmente passará um pouco despercebido entre o barulho das luzes que os filmes supra citados criaram, mas era de todo conveniente que jovens e adultos o vissem, que fosse discutido nas escolas secundárias e nas famílias, que nos pusesse a refletir sobre “por que raio” demora tanto tempo a implementar o que é justo e certo em tantas sociedades.
Sufragistas é um drama histórico, baseado em factos verídicos, que nos coloca na Inglaterra do início do século XX, mais propriamente no ano de 1912. Nessa altura, um grupo de mulheres corajosas resolveu criar um movimento que lutou pelo direito das mulheres a votarem tal como acontecia com os homens.
Nas fábricas, as mulheres trabalhavam mais que os homens e faziam serviços mais pesados, mas recebiam bem menos. Fartas de ver tanta desigualdade económica e social, um pequeno grupo de mulheres percebe que é essencial ganhar o direito ao voto para obter o respeito e a dignidade a que tinham direito. É a luta desse punhado de mulheres extraordinárias pelo direito ao voto que o filme acompanha.
No início elas tentam convencer os políticos através das palavras, mas rapidamente percebem que só com atos conseguirão frutos. E esses atos tornar-se-ão cada vez mais violentos e emocionalmente pesados. Há momentos muito duros, durante o filme, mas todos percebem que não há nenhum exagero da realização.
Com maior mobilização, o grupo reúne-se no sentido de contestar a lei, e é nesse ambiente que conhecemos a protagonista - Maud Watts (Carey Mulligan) – mulher e mãe trabalhadora, aprisionada num aglomerado de estereótipos da sociedade civil, refém ainda de uma vida de sacrifícios, cujo emprego na fábrica começou quando tinha apenas 7 anos, local onde também nasceu. É ela que se vai tornar na verdadeira alma do grupo e do filme, protagonizando um desempenho notável, digno de uma nomeação para óscar.
Por entre toda a arrogância e despeito dos homens face à audácia das sufragistas, somos surpreendidos com um desempenho sem palavras de Carey Mulligan. A coragem com que larga o emprego, o marido, até o filho é assombrosa. E nem por um momento ao espectador ocorre censurá-la, achar que está a ir longe demais. A câmara nunca a larga, percorre todo o seu quotidiano. É a sua inocência e eloquência que fazem a luta valer a pena. Até porque estamos diante do dia-a-dia não apenas Maud ou de Edith Ellyn (Helena Bonham Carter) ou de Violet Miller (Anne-Marie Duff), mas de milhões de mulheres há menos de cem anos, no dito mundo civilizado e avançado.
A grande vedeta e chamariz do filme tem uma atuação breve que não justifica o destaca dado no cartaz. Marly Streep aparece um/dois minutos e nada mais. Ela encarna Emmeline Pankhurst, a líder espiritual do grupo feminista sufragista.
É ainda de notar que a equipa que produziu “Sufragistas” é quase toda ela composta por mulheres: Sara Gavron assina a realização enquanto o argumento saiu da pena de Abi Morgan.
“As Sufragistas” pode não ser um filme extraordinário nem arrebatador, mas é “obrigatório” vê-lo, porque ninguém pode ficar indiferente a uma luta ainda por acabar. Em 2015, ainda há países, como a Arábia Saudita, que não reconhecem o direito ao voto às mulheres.
Em Portugal, há cinquenta anos as mulheres adultas só conseguiam viajar para o estrangeiro com autorização do marido ou do pai, não podiam casar com um homem pobre caso pretendessem ser professoras e a lei apenas admitia que dispusessem de dinheiros para comprar coisas de costura. Ultrajante, indigno, desumano.
Gabriel Vilas Boas
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